Receita com as exportações agrícolas deve cair 20% em 2009 e perda pode chegar a US$ 15 bilhões, segundo analista
Colapso financeiro reduz os preços dos produtos exportados e o crédito para o plantio, o que contém a expansão da área cultivada
MAURO ZAFALON DA REDAÇÃO
O colapso financeiro global fechou a torneira do crédito e acentuou a queda nos preços das commodities agrícolas exportadas pelo Brasil. Aliada à forte elevação dos custos ao produtor neste ano, que já ameaçava a safra 2008/9, a crise deve conter a tendência de aumento da área de plantio e gerar produção menor. O resultado dessa “tempestade perfeita” no setor, segundo analistas, deve ser catastrófica para a balança comercial brasileira.
As receitas com exportações do agronegócio, um dos principais componentes do saldo comercial brasileiro, devem recuar 20% em 2009, com perda de US$ 15 bilhões, segundo Victor Abou Nehmi Filho, gerente da Sparta, administradora de fundos de investimento. Essas perdas, diz Nehmi, somadas às dos setores mineral e de aviação (Embraer), vão trazer o superávit da balança comercial para próximo de zero.
“As perdas de receitas na balança do agronegócio não virão tanto pela quantidade de produtos exportados, mas pela forte redução dos preços externos. Haverá um grande contraste entre os preços médios atingidos pelos produtos agrícolas neste ano com os que serão praticados no próximo.”
Nehmi toma como exemplo a soja, que chegou a ser negociada a US$ 16,6 por bushel (27,2 quilos), em julho, e projeta US$ 9 para maio de 2009.
Na análise de Nehmi, o superávit da balança será afetado também pelas importações. Ele acredita que pode haver recuo, mas pequeno, já que a economia brasileira não entra em recessão e cresce cerca de 2,5%.
O saldo comercial deste ano deve ficar em US$ 23,8 bilhões, segundo o boletim Focus, do Banco Central, após ter atingido US$ 40 bilhões em 2007.
A perda desses recursos deve segurar ainda mais o crescimento do país em 2009 e enfraquecer o real diante do dólar.
Mas não é apenas a balança comercial que perde. Os custos elevados, a falta de crédito, o recuo na área plantada, o uso de menos tecnologia -principalmente redução no uso de fertilizantes- e um eventual clima desfavorável podem provocar a perda de até 15 milhões de toneladas de grãos, na avaliação de José Pitoli, assessor da Coopermibra (cooperativa do noroeste do Paraná).
Se a queda for tão acentuada, os produtores deixarão de obter receitas equivalentes a R$ 7,5 bilhões. Para evitar recuo tão acentuado na produção, Pitoli estima que seriam necessários mais R$ 4,4 bilhões de crédito no setor agrícola para incentivar o plantio, que pode se prolongar por mais 45 dias.
Sofrimento antecipado
Dois produtos serão os mais afetados: algodão e milho safrinha. Mato Grosso, tradicional produtor de algodão, deverá reduzir em 27% a área nesta safra, segundo Seneri Paludo, do Imea (Instituto Mato-Grossense de Economia Agrícola).
Já o milho safrinha terá perda de área de 10% no próximo ano, avalia Leonardo Sologuren, da consultoria Céleres.
“A principal preocupação é com a safra de inverno”, afirma ele. A rentabilidade prevista é baixa e o crédito será ainda mais curto. Sobre o cenário dos próximos meses, Sologuren diz que “ninguém consegue avaliar com clareza o quanto os países deixarão de consumir e, por isso, estamos sofrendo por antecipação”.
As commodities fugiram da lógica de oferta e demanda e passaram a acompanhar a volatilidade do mercado financeiro.
O ano de 2009 será muito delicado. Não haverá crise igual às de 2005 e 2006, quando o setor não tinha preços, mas é melhor “começarmos a olhar para 2010”, afirma Sologuren.
Outro empecilho para a safra deste ano tem sido o atraso no plantio, que começa a ser recuperado. No caso da soja, a AgRural estima que pelo menos 52% da área a ser destinada ao produto já foi semeada, o mesmo percentual de 2007.