Grandes regiões produtoras de café em Minas Gerais, Manhuaçu, na Zona da Mata, Três Pontas e Nova Resende, no Sul do estado, pararam na semana passada para ouvir o apelo dos cafeicultores, ainda sem perspectivas de ver uma intervenção no mercado do grão capaz de forçar a reação dos preços. A colheita já alcança 20% da estimativa de safra em algumas áreas, mergulhada em nova crise de rentabilidade, desta vez combinada a custos ascendentes, especialmente nas lavouras de montanha, onde a mecanização não chega. A conta do prejuízo gira em torno de R$ 100 por saca, segundo estimativa da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg). A Organização Internacional do Café (OIC) já considera o descompasso comprometedor para a sustentabilidade da cafeicultura.
Insatisfeitos com a definição do Ministério da Fazenda do preço mínimo de R$ 307 por saca de 60 quilos, enquanto o custo médio indicado pela Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) foi de R$ 336,16, os produtores têm vendido o grão de R$ 270 a R$ 300 por saca. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) avaliou as despesas na lavoura em R$ 333,86 na média, em maio, cotação que eles esperavam servir de base para o cálculo. No primeiro semestre, o preço corrente foi de R$ 307,83, de acordo com levantamento do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), vinculado à Universidade de São Paulo (USP), representando queda de 24,25% frente ao mesmo período de 2012. Trata-se do menor valor cobrado desde 2009 (R$ 262,86), quando a economia se ressentia dos efeitos da crise financeira mundial.
A máxima de que o cafeicultor teria de compensar a diferença com aumento da produtividade caiu por terra. “O produtor fez o seu dever de casa, melhorou a qualidade da produção e a gestão da lavoura, mas essa é uma conta que não fecha”, afirma o diretor da Faemg Breno Mesquita, presidente da Comissão Nacional do Café da CNA e da Comissão do Café de Minas. Ele ressalta o fato de a cafeicultura brasileira ter dobrado a sua eficiência nos últimos 10 anos, colhendo 24 sacas por hectare, senão o maior, um dos melhores índices no mundo.
A despeito da alta produtividade, na região da Zona da Mata mineira o custo direto apurado pelos produtores, incluindo, portanto, colheita, insumos e tratos culturais, alcançou R$ 350 por saca, informa Fernando Romeiro de Cerqueira, presidente da Cooperativa dos Cafeicultores de Lajinha (Coocafé). Os insumos encareceram mais de 20% nos últimos 12 meses, com base em dados coletados pela Faemg, “Os agentes de mercado estão jogando os preços para baixo e os custos são crescentes. Passou da hora de o governo criar mecanismos para chegarmos a um equilíbrio. Estamos colhendo há quase 60 dias”, reclama. A cooperativa congrega cerca de 6 mil produtores de 30 municípios, com expectativa de safra de 2 milhões de sacas neste ano.
FALTAM RECURSOS Desestimulados, há produtores que não têm contado com parceiros e meeiros, também convencidos de que a colheita torna-se um mau negócio, conta Fernando Cerqueira. Falta dinheiro para a panha, observa Luiz Fernando Ribeiro, presidente da Cooperativa Regional Agropecuária de Santa Rita do Sapucaí (CooperRita), no Sul de Minas. “Boa parte do café está no chão e comprometido. Os produtores que renegociaram dívidas não terão como pagá-las aos bancos”, afirma. A cidade conta com cerca de 7 mil hectares plantados de café e há 600 filiados à cooperativa.
Breno Mesquita participou de várias reuniões nos ministérios da Agricultura e da Fazenda e afirma que os produtores não pedem nada além de uma política para a atividade. Em meados de junho, o ministro da Agricultura, Antônio Andrade, chegou a prever que o Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (Funcafé), sobretudo para o financiamento da estocagem, contribuiria para retirar 10 milhões de sacas de café do mercado, puxando os preços para cima. O orçamento de R$ 3,160 bilhões foi aprovado em 18 de junho pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), mas os produtores reclamam que o dinheiro não foi colocado à disposição. Outra solução reivindicada mescla o uso do Prêmio Equalizador Pago ao Produtor (Pepro) e um programa de ações públicas de venda. Até o fechamento desta edição, o Ministério da Agricultura informou que cabe aos bancos liberar os recursos do Funcafé e que a pasta da Fazenda está avaliando o Pepro.
Queda da rentabilidade reflete na diminuição da adubação das lavouras Falta dinheiro, trato acompanha
Com a certeza de que vão enfrentar novo revés nas plantações nas próximas safras, como resultado da queda dos investimentos nos tratos culturais, algumas regiões produtoras de Minas, a exemplo de Varginha, no Sul do estado, e Paracatu, no Noroeste, veem a crise se agravar, devido à ocorrência de chuvas durante a colheita. A preocupação é com a qualidade do café, prejudicada pela umidade, seja por derrubar os grãos no chão, seja afetando a qualidade dos frutos ainda nas plantas, observa o consultor Marcos Pimenta, da Pimenta Assessoria Agrícola, com sede em Luís Eduardo Magalhães, na Bahia.
“Há, de fato, um empobrecimento da classe produtora. O café está sendo vendido pelos produtores atualmente para saldar contas, num momento de preços baixos, em que a moeda de troca está defasada”, afirma Marcos Pimenta. Reflexos desse empobrecimento, os tratos culturais estão diminuindo e também os novos investimentos nas lavouras. Os cafeicultores que faziam duas a três adubações, optam por apenas uma rodada. As cidades que dependem da atividade para a sustentação da economia local sofrem, ainda, com as consequências da queda de rentabilidade da cafeicultura, observada nos principais estados produtores: Minas, Espírito Santo, São Paulo e Bahia.
As perspectivas da cafeicultura deixam as autoridades do governo estadual apreensivas e não é por pouco, admite Niwton Castro Moraes, assessor especial de Café da Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa). Maior produtor do grão no país, Minas Gerais tem 634 municípios envolvidos no segmento, o que mais pesa no agronegócio, empregando 4 milhões de pessoas direta e indiretamente.
“Especialmente as regiões montanhosas são intensivas no uso de mão de obra (segundo a Faemg, as despesas nessas áreas com o trabalhador representam 52% do custo de produção). A possibilidade de desemprego preocupa o estado, assim como o abandono das lavouras a médio e longo prazo”, diz Castro Moraes. A CNA informa que 50% da cafeicultura no Brasil se desenvolvem em regiões de montanha. No fim de maio, a instituição divulgou dados indicando que, com base na colheita de 25,4 milhões de sacas nessas áreas em 2012, o prejuízo decorrente dos preços baixos neste ano pode ter alcançando a casa de R$ 6,38 bilhões.
São, ao todo, no país, 380 mil cafeicultores; 1,9 mil municípios produtores e 8 milhões de pessoas empregadas nas lavouras e na cadeia de prestadores de serviços. A Conab prevê safra brasileira de 49 milhões de toneladas em 2013. O consultor Marcos Pimenta explica que apesar da importância econômica e social da cafeicultura, em contrapartida há poucas iniciativas na direção de uma política de preços para o setor e de incentivos financeiros. Cenário que se complica, ante a especulação com os preços. A indústria e os distribuidores trabalham sempre sob a perspectiva da safra seguinte (no caso, a de 2014), que deve ser grande. Com a previsão de um mercado bem abastecido, os preços são jogados para baixo.
Fonte: EM em 08/07/2013