Atualmente as sociedades cooperativas são reguladas pela Lei n.º 5764 de 1971, segundo a qual as pessoas se obrigam, reciprocamente, a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica de proveito comum, sem objetivo de lucro.
Diversos setores da economia, como a área de saúde, o setor bancário, profissionais liberais, etc., aderiram ao modelo cooperativista como forma de fortalecimento para um objetivo comum, conforme preceitua a lei.
Os produtores rurais também se organizaram sob essa forma, sendo que há inúmeras cooperativas rurais espalhadas pelo país ajudando a mover a imensa máquina do agronegócio.
Os benefícios oferecidos pela associação cooperativa de produtores rurais são importantes. Os produtores dispõem de acesso a diversos produtos e serviços como aquisição de insumos, possibilidade entrega e comercialização de produção, assistência técnica, cursos de capacitação, como também têm a possibilidade de tomar crédito, tudo com consideráveis vantagens em relação à atuação isolada.
Um dos problemas, contudo, diz respeito aos empréstimos concedidos por cooperativas a seus associados. Quando o produtor busca crédito para custeio ou investimento junto ao sistema bancário, há diversos mecanismos de proteção contra o abuso praticado pelo mercado.
Na relação entre o produtor e a cooperativa, muitos desses mecanismos não têm sido considerados como forma de proteção do cooperado.
A cooperativa, sob o argumento de que o cooperado é dono da sociedade, empresta recursos com cobrança de encargos abusivos jamais encontrados em operações de crédito rural repassadas por instituições financeiras.
Os juros do crédito rural são limitados à taxa de 12% ao ano e em caso de mora podem ser elevados de 1% ao ano, além da possibilidade de cobrança de multa de 2%.
Há cooperativas que têm exigido de seus “donos”, os próprios cooperados, taxas de juros de mais de 4% ao mês para o caso de atraso nos pagamentos, além de outros encargos como multa de 10%.
Fazem uso de tal prática sob o argumento de que não se trata de taxas de juros e sim de uma espécie de “contribuição para ressarcimento de custos com encargos financeiros e operações” realizadas com cooperados.
Tais cooperativas alegam que foram obrigadas a captar recursos junto ao mercado financeiro para a finalidade de cobrir os prejuízos causados pelo cooperado com sua inadimplência e estariam apenas repassando tais custos.
Essas sociedades formalizam instrumentos por escritura pública em que concedem o acesso a determinado limite de crédito mediante a constituição de uma garantia hipotecária, além da possibilidade de inclusão de outras garantias.
Com a ocorrência, por exemplo, de uma frustração de safra ou baixo valor de venda atrelada a altos custos de produção em que não seja possível o cumprimento de suas obrigações na data inicialmente estipulada, o cooperado poderá ser obrigado a pagar o débito com encargos de mais de 4% ao mês, correndo o risco de perder seu patrimônio, sua fonte de sustento, para uma sociedade na qual figura como um dos donos.
De qualquer forma, não basta a Cooperativa alegar, ainda que conste do instrumento firmado com o cooperado, que seu custo de captação foi de 4% ao mês. É necessário que seja feita a demonstração de que aquele cooperado levou a cooperativa a captar recursos para o fim de suprir seu prejuízo, bem como quais taxas de juros foram cobradas.
As cooperativas de produtores rurais normalmente têm acesso a taxas de juros subsidiadas, inferiores a 1% ao mês, que podem repassar a seus cooperados a fim de evitar o inadimplemento ou mesmo para que haja parcelamento de débitos. Contudo, ao invés de buscar os mecanismos menos custosos para seus “donos”, preferem exigir taxas ilegais sem que haja a correspondente justificativa.
Por outro lado, há boas decisões proferidas pelo judiciário entendendo que as cooperativas ao agirem como verdadeiros bancos na relação com seu cooperado devem submeter-se às normas protetivas aplicadas a tais operações, além da legislação especial que trata das operações de crédito rural, em que há a limitação de juros e demais encargos moratórios.
Os produtores podem defender-se mediante a propositura de uma ação revisional de todo seu débito, ainda que tenha sido integralmente quitado. Caso haja cobrança judicial mediante uma execução, toda a matéria de defesa também poderá ser alegada e discutida a fim de que os excessos sejam excluídos.
(Artigo publicado na edição n. 33 da Revista DBO Agrotecnologia)
Fábio Lamonica Pereira – Advogado em Direito do Agronegócio
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