Comércio aproxima os países

Estados Unidos são o principal destino dos produtos brasileiros, e a balança é favorável a empresários nacionais. Mas impasse sobre patentes e subsídios desgasta a relação

7 de novembro de 2005 | Sem comentários Comércio Exportação
Por: Correio Braziliense por Luís Osvaldo Grossmann

Maior parceiro comercial do Brasil, os Estados Unidos são, naturalmente, fundamentais para o comércio exterior do país. É para lá que segue um em cada cinco produtos brasileiros exportados, assim como é a principal origem das importações. Por isso, a visita de George W. Bush e seu encontro com Luiz Inácio Lula da Silva deixa o empresariado nacional em alerta. Os americanos são, ainda, os maiores detentores de estoque de investimentos estrangeiros na economia brasileira. Mas na direção oposta, o peso do Brasil é muito pequeno no comércio da maior economia do mundo — o país exporta apenas 1% do que os EUA compram a cada ano.

Na verdade, os americanos são importantes para o Brasil desde o século 19. Afinal, em 1848 o país já destinava ao mercado norte-americano a maior parte de suas exportações, em especial de café. As relações entre os dois países somente melhoraram a partir de 1870, e o vínculo com os Estados Unidos, durante a primeira metade do século 20, refletiu uma situação de complementação econômica, em que o Brasil dependia em cerca de 60 a 70% das exportações de café e estas, na mesma proporção, do mercado americano.

Bem mais recentemente, o Brasil passou por um período em que era um dos únicos países do mundo com déficit comercial com os EUA. Fruto dos estímulos produzidos pela abertura comercial e da acentuada apreciação da taxa de câmbio real e de reativação da demanda doméstica nos primeiros anos após a implementação do Plano Real. Desde 2000, no entanto, o país voltou a ter superávits comerciais com os americanos. No ano passado, essa diferença foi de US$ 8,6 bilhões em favor do Brasil.

De fato, os números das relações bilaterais têm sido cada vez melhores para o Brasil. Além dos EUA serem o nosso maior parceiro comercial, as exportações brasileiras para lá têm tido um incremento de mais de 20% ao ano. E enquanto nos últimos 10 anos as nossas exportações para o mundo tiveram um crescimento de 107%, as vendas externas do Brasil para os EUA aumentaram em 134%. Além disso, a pauta de exportações brasileiras para os EUA é, predominantemente, dominada por produtos industrializados — cerca de 70% das exportações são de manufaturados, contra apenas 10% de produtos básicos.

Querelas
Mesmo representando pouco da corrente de comércio norte-americana, o Brasil é — juntamente com o México, que já tem acordo comercial com os EUA — a maior economia da América Latina. Não é à toa, portanto, que existam várias disputas entre brasileiros e americanos, em especial com relação ao desejo dos EUA de criarem a Área de Livre Comércio das Américas (Alca).

Os EUA insistem que a Alca não deveria apenas incluir redução tarifária, mas também provisões de largo alcance para a liberalização de investimentos em serviços como o bancário e de seguros. E querem, igualmente, tratamento mais eqüitativo para todas as empresas, estrangeiras ou não, nas compras governamentais. Exigem também proteção rigorosa do copyright, das patentes, de segredos e marcas comerciais.

O Brasil, por sua vez, argumenta que os Estados Unidos devem reduzir ou eliminar muitos dos subsídios agrícolas, e deveria também modificar a aplicação de leis antidumping, muito mais utilizadas por razões puramente protecionistas. Mas enquanto os EUA preferem discutir agricultura na Organização Mundial do Comércio (OMC), é para o órgão multilateral que o Brasil quer jogar as discussões sobre abertura comercial.

Por vezes essas diferenças entre os dois países provocam reações extremadas. Na última segunda-feira, a fundação americana Defensores dos Direitos de Propriedade publicou um anúncio de página inteira no jornal Washington Times, na capital americana, acusando o Brasil de abuso dos direitos americanos de propriedade intelectual. “O Brasil é o país que mais desrespeita os direitos de propriedade intelectual no Hemisfério Ocidental, fazendo com que as empresas americanas percam cerca de US$ 900 milhões somente em 2003”, reclama a fundação. É o mesmo jornal que publicou, em 2002, artigo em que afirmava que o presidente Lula, Fidel Castro, de Cuba, e Hugo Chávez, da Venezuela, formavam um novo “eixo do mal”.

Para Câmara, visitante é indesejável

Samy Adghirni
Da equipe do Correio
George W. Bush provavelmente não sabe disso, mas ele é oficialmente indesejável no Distrito Federal. Uma moção votada e aprovada pela Câmara Legislativa há dois anos faz do presidente dos Estados Unidos persona non-grata no DF.

O documento foi apresentado pelo deputado Chico Leite, à época no PCdoB e hoje no PT, em 2 de abril de 2003. O Iraque acabara de ser invadido pelas tropas norte-americanas. Os bombardeios a Bagdá eram diariamente escancarados nas TVs do mundo inteiro, aumentando a rejeição global contra Bush, que decidira ocupar o país árabe sem o aval da Organização das Nações Unidas (ONU). Protestos contra a ofensiva liderada pelos americanos britânicos se multiplicaram por vários países.

Chico Leite argumentou no plenário da Câmara que o governo dos Estados Unidos estava construindo uma “ditadura militar planetária” com o ataque para derrubar o regime de Saddam Hussein, e a moção foi aprovada por maioria esmagadora. O deputado admite que o documento é meramente simbólico, apenas a manifestação de uma opinião do Legislativo local, mas acredita que “a Casa que representa o povo de Brasília não acolherá Bush de braços abertos”. O deputado Augusto Carvalho (PPS) disse que, se precisasse, “votaria de novo a favor da moção”. Eurides Brito (PMDB) foi uma das poucas a votar “não”.

O Governo do Distrito Federal (GDF), por meio do porta-voz Paulo Fona, informou que a moção não é incompatível com a visita, pois trata-se de um encontro entre presidentes e não envolve autoridades locais. “É um compromisso federal, entre chefes de nação, não há nenhuma programação na cidade em si”, justificou.

Encontros históricos
Visitas de presidentes norte-americanos ao Brasil sempre foram cercadas de grande expectativa e esquemas de segurança imponentes. Confira as mais recentes.

Dwight Eisenhower
Fevereiro de 1960

Eisenhower chegou ao Brasil no dia 23 de fevereiro de 1960. Um dia antes de ir à capital, que ainda era no Rio de Janeiro, o chefe de Estado passou por Brasília — que seria inaugurada dois meses depois —, acompanhado pelo então presidente Juscelino Kubitschek. Durante a visita de Eisenhower ao Rio, estudantes penduraram uma faixa estampada com o rosto do presidente cubano Fidel Castro na sede da UNE , no caminho do cortejo de Eisenhower entre o Arsenal da Marinha e a embaixada dos Estados Unidos.

Jimmy Carter
Março de 1978

O presidente americano fez uma visita ao Brasil marcada pela cordialidade. Foi recebido pelo presidente Ernesto Geisel na Base Aérea de Brasília em 29 de março de 1978 e evitou tratar de assuntos bilaterais. Os líderes limitaram-se a discutir política exterior, como conflitos na África e no Oriente Médio. Carter também se reuniu a portas fechadas com o futuro presidente João Baptista Figueiredo, e sua visita durou dois dias.

Ronald Reagan
Dezembro de 1982

Reagan chegou a Brasília com a responsabilidade de revitalizar as relações dos EUA com a América Latina, desgastadas por causa do apoio americano ao Reino Unido durante a Guerra das Malvinas. Durante a visita, que durou quatro dias, também foi anunciado um empréstimo de US$ 1,2 bilhão dos EUA ao Brasil, mas o dinheiro já tinha sido entregue ao Brasil meses antes. A visita ficou marcada por uma gafe. Durante um banquete, o presidente americano propôs um brinde ao “povo da Bolívia”.

George Bush
Dezembro de 1990
Durante a visita de Bush “pai” ao Brasil, o então presidente Fernando Collor de Melo cobrou uma resposta do governo americano aos esforços brasileiros para controlar a inflação. O presidente dos EUA sugeriu a criação de uma área de livre comércio em todo o continente — embrião da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). A visita de Bush presidente mobilizou cerca de 40 jovens, que protestaram contra o imperialismo norte-americano.

Bill Clinton
Outubro de 1997
A visita de Clinton ficou marcada pelo seu grande esquema de segurança. Atiradores de elite foram posicionados pela Esplanada dos Ministérios. Os diplomatas americanos chegaram a sugerir que o horário de verão brasileiro fosse adiantado em uma semana para que Clinton pudesse cumprir sua agenda na América Latina. Ele veio ao Brasil conversar com o presidente Fernando Henrique Cardoso sobre Alca, Mercosul e acordos comerciais.

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