25/05/2014
Em meio às negociações com a guerrilha de esquerda, presidente Juan Manuel Santos tenta hoje a reeleição hoje. Ele enfrenta Óscar Iván Zuluaga, defensor da “guerra total” contra as Farc. Votação ocorre em meio a escândalos
LUCAS FADUL
Trinta e três milhões de colombianos estão habilitados a escolher nas urnas, hoje, o futuro presidente do país, em meio às negociações de paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) — a guerrilha marxista completa 50 anos na terça-feira. As pesquisas indicaram empate técnico entre o atual titular, Juan Manuel Santos, e Óscar Iván Zuluaga, favorito do senador e ex-presidente Álvaro Uribe. Os dois devem passar ao segundo turno, apesar das denúncias que agitaram as semanas finais da campanha. Para garantir a validade do pleito, 64 observadores da Organização dos Estados Americanos (OEA) acompanharão o pleito.
No último debate, na quinta-feira, os candidatos se desafiaram a “dizer a verdade ao país” sobre os escândalos. Há pouco mais de duas semanas, o estrategista de comunicação de Santos, Juan José Rendón, foi acusado por um traficante de ter recebido US$ 12 milhões para mediar a rendição de quatro chefes de quadrilhas. A denúncia levou à demissão de Rendón, que disse “nunca ter recebido um centavo”. Igualmente alvo de acusações, Zuluaga, que vinha ascendendo nas pesquisas, se envolveu numa situação embaraçosa com adivulgação de um vídeo no qual aparece conversando com um hacker suspeito de interceptar para sabotar o processo de paz com as Farc.
“Escândalos recentes, bastante explorados pela imprensa, podem inclinar a balança rumo à reeleição de Santos, que tem muito mais influência sobre a mídia do que Zuluaga”, afirmou ao Correio Jaime de Almeida, professor do Departamento de História da Universidade de Brasília (UnB). “Para a opinião pública, está claro que o candidato à reeleição faz das negociações com as Farc seu maior trunfo, ao acusar eleitores inclinados a votar em Zualuaga de serem inimigos da paz.” De acordo com o historiador, a população terá que optar entre o diálogo com a guerrilha ou a “gerra total”, defendida pelo adversário.
Negociações
Para María Alejandra López, moradora de Bogotá, é certo que os colombianos desejam o fim das Farc. “A política de Santos passa pela negociação. Ele acha que a Colômbia vai conseguir a paz com acordos. Zuluaga considera as negociações uma mentira. Diz que não se negocia com “terroristas”, e que a solução é acabar com as Farc usando armas e balas”, disse. Na avaliação de María Alejandra, uma política dura contra a guerrilha tem de ser defendida por qualquer um dos dois. “A paz tem peso muito importante nos planos de governo de ambos.”
Juan Gabriel Gomez Albarello, professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Nacional da Colômbia, entende que as negociações de paz são promissoras. “O recente acordo com as Farc serve aos propósitos de Santos. Ele pode mostrar que, diferentemente de outros processos de diálogo com a guerrilha, este pode ter avanço substancial”, afirmou. “Dessa forma, é possível que um acordo de paz definitivo possa ser alcançado”, completou.
Albarello acha que a integração regional não representou um tema importante na campanha. “A Colômbia tem tido uma relação privilegiada com os EUA. Acredito que nada vá mudar. Uma maior integração regional, como a proposta na União de Nações Sul-Americanas (Unasul), não encontrará respaldo no lado colombiano”, lamentou.
O geógrafo Flavio Bonfá, formado pela Universidade de São Paulo (USP), ressalta que a Colômbia tem posição-chave e, sob a ótica de Washington, deve contrabalançar o bolivarianismo na região. “Santos, que já foi ministro da Defesa, enfrentou a guerrilha de modo mais profissional e aliou-se aos EUA como forma de se manter equipado contra as Farc e outros eventuais inimigos, como a Venezuela”, disse. “O contexto político na Colômbia é importante para o Brasil, pois temos uma fronteira de 1,7 mil km, incluindo a famigerada “cabeça do cachorro”, região problemática devido à mineração ilegal, aos índios, às drogas e à falta de presença efetiva de qualquer um dos dois países.”
Três perguntas para Roberto Menezes Goulart, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB)
O que os colombianos mais esperam do novo presidente?
O povo colombiano tem demandas domésticas, pautas fortes, que englobam emprego e educação, por exemplo. Em termos de política externa, o país deseja segurança interna e regional. O atual quadro das eleições mostra um empate entre o presidente, Santos, e o adversário, Zuluaga. A segurança segue como a bandeira de campanha de ambos. Desde 2012, Santos tenta negociar com a guerrilha e, desta vez, parece-me ser uma situação promissora. Na minha opinião, o que a sociedade colombiana mais quer é a paz. Hoje, Medellín e Bogotá são mais seguras que muitas cidades brasileiras. O país deseja, de fato, virar a página das Farc. É preciso observar que caiu de 1,7% para 0,3% a produção da folha de coca no conjunto da economia.
A avalanche de escândalos contra os dois candidatos poderá definir o próximo governante?
Santos e Zuluaga avançarão para o segundo turno. A diferença entre os dois é muito pequena. O ex-assessor de Santos, Juan José Rendón, pivô do último escândalo envolvendo o presidente, fez diversas campanhas em toda a América Latina, além de ter fortes vínculos com os Estados Unidos. As denúncias contra Santos são resultado de dados adquiridos por meio de invasões a informações oficiais, portanto, atividade ilícita. Existe muita corrupção na Colômbia, basta lembrar que o país arma milícias paramilitares.
Em busca de crescimento econômico, o próximo presidente deverá aproximar mais a Colômbia de parceiros sul-americanos?
O país, que tem 45 milhões de habitantes, faz parte da Comunidade Andina e da Aliança do Pacífico. É exportador de café e tem um pouco de petróleo, para consumo próprio. No entanto, essas associações de nações constituem, apenas, áreas de preferência tarifária. Eu acho que a entrada da Venezuela no Mercosul abrirá as portas para que a Colômbia siga o mesmo caminho. O novo presidente, creio, deve se voltar para o bloco sul-americano. Até porque a Venezuela é o seu maior comprador. Vale lembrar que a economia colombiana cresce, em média, 4,5%, uma das mais altas taxas registradas na região. (LF)