A seca que predomina na maior parte do cinturão cafeeiro do Brasil tem preocupado os produtores. Na área de abrangência da Cooxupé (Cooperativa Regional de Cafeicultores em Guaxupé), que atua no Sul de Minas Gerais, por exemplo, não ocorreu nenhuma precipitação durante o mês de agosto. “Atualmente, em função da umidade relativa muito baixa e das altas temperaturas, estamos com uma evapotranspiração média diária por volta de 3% a 4%. Ou seja, a cada dia sem chuva, a situação, que já é crítica, agrava-se ainda mais”, explicou Joaquim Goulart de Andrade, gerente da divisão técnica da Cooxupé.
Ele explicou que a preocupação maior na região são lavouras situadas em menor altitude, abaixo de 900 metros, lavouras com até cinco anos e lavouras que receberam o processo de poda, como esqueletamento e decote, que têm alta capacidade de produção para 2008. “Essas lavouras tiveram uma florada intensa no começo de agosto, alcançando um índice de 30% a 50% do potencial total, como conseqüência das chuvas que ocorreram em junho e julho. Como, hoje, elas se encontram em fase de expansão do chumbinho, a situação é crítica, especialmente pela falta d’água e, certamente, já teremos influência negativa na safra futura”, argumentou Goulart, que completou informando que ainda é muito cedo para se mensurar essas perdas.
Ainda segundo o gerente da divisão técnica da Cooxupé, como os cafezais da região estão com 50%, em média, de armazenamento, a partir de agora, algumas lavouras, como as de menor altitude, entram em processo de murcha. “Assim, como autodefesa, as plantas, de agora em diante, começam a perder folha, a ter seca de ponteiro e queda de chumbinhos”, comentou.
Já a Cooparaíso (Cooperativa Regional dos Cafeicultores de São Sebastião do Paraíso), com base na metodologia do IAC (Instituto Agronômico de Campinas), apontou que o déficit hídrico no município, também situado no Sul de Minas Gerais, é de 44,8 milímetros. Porém, o Departamento de Gestão do Agronegócio da Cooperativa informou que, em função das altas temperaturas e de mais de dois meses sem chuva, vem sendo ocasionadas algumas condições preocupantes às lavouras.
“Nas lavouras novas que já floresceram, a falta de precipitações já está prejudicando a safra, pois houve o florescimento de aproximadamente 40% do potencial produtivo para 2008/2009. Já nas lavouras novas implantadas em solos arenosos e pedregosos, há ponto de murcha mais acentuado, prejudicando seu desenvolvimento normal para esta época do ano”, informaram os técnicos do Departamento.
Ainda conforme eles, nas lavouras com manejo inadequado, mesmo as adultas, instaladas em solos com estrutura física deficiente, com baixo teor de matéria orgânica, há um ponto de murcha acentuado e com queda prematura de folhas, que pode interferir no pegamento de futuras floradas. “Essa deficiência climática contribui ainda mais para o surgimento de pragas, como ácaro e bicho-mineiro, podendo intensificar a queda prematura de folhas”, explicou o Departamento de Gestão de Agronegócio da Cooparaíso, que completou informando que se pode perceber, também, “a deficiência induzida de nutrientes e a perda de vigor das folhas, favorecidas pela seca”.
Na faixa sudoeste do Estado de Minas Gerais, a situação é ainda mais preocupante, uma vez que as condições climáticas atuais são desfavoráveis à cultura do café. Segundo o técnico agropecuário da Coopassa (Cooperativa Agropecuária de Cássia), Ronaldo Severo da Silva, a última ocorrência de chuva nessa região foi em julho e o nível de precipitação, de aproximadamente 40mm, induziu uma florada de 40% a 50% do potencial produtivo à safra 2008/09. “Como após julho não choveu mais no município de Cássia, as plantas abortaram grande parte dessa florada. O restante que vingou, virou chumbinho, mas agora vem caindo com o murchamento e a perda de folhas ocorridos”, explicou.
Para o técnico agropecuário da Coopassa, levando-se em consideração a ausência de chuvas há mais de 50 dias e o murchamento das plantas, mesmo que volte a chover em breve, haverá uma perda considerável na produção de café no município. “Ainda é cedo para se mensurar, mas há a possibilidade de ocorrer perdas de até 50%”, calculou Silva, que concluiu informando que a temperatura oscila de 10ºC a 25ºC no município, com a umidade relativa do ar ficando entre 25% e 30%, “isto porque Cássia é banhada, em grande parte, pelo Rio Grande”.
O presidente do Caccer (Conselho das Associações dos Cafeicultores do Cerrado), Francisco Sérgio de Assis, anotou que, no Cerrado Mineiro, a última chuva observada foi em 25 de julho. “De lá pra cá, não choveu mais. O problema é que essa chuva abriu uma florada, principalmente nas lavouras que estavam estressadas. Porém, até o momento não temos como avaliar se essa florada vai vingar ou não. Se não chover logo, as plantas que não são irrigadas ampliarão o nível de desfolhamento, que já ocorre de forma significativa”, explicou ele, lembrando, contudo, que ainda não é possível medir o tamanho dessa perda. “Sabemos que ela existe, mas ainda não sabemos (mensurar) o seu tamanho”.
Segundo Assis, o nível de incidência de ácaro e bicho-mineiro é muito alto devido ao clima, que normalmente já é seco na região. “Este ano o clima é ainda mais seco e a temperatura está muito elevada, o que aumentou a intensidade de ataque de ácaro e bicho-mineiro para além do normal”, descreveu. O presidente do Caccer mencionou, ainda, que a safra a ser colhida no ano que vem será maior que a deste ano, até por causa da bienalidade característica da cafeicultura, mas não será “tão grande como muitos andaram especulando por aí”. “Será uma safra boa, mas não será uma ‘supersafra’ como imaginado inicialmente por alguns agentes do setor. E digo isso, evidentemente, levando em conta que as chuvas se normalizem muito em breve”, completou.
A região de Três Pontas também enfrenta dificuldade em relação à seca que persiste desde o dia 26 de julho, quando choveu 15mm. “Em maio tivemos 65mm, em junho mais 12,5mm e em julho totalizamos 25mm de precipitações. Com isso, surgiram algumas pequenas floradas. Porém, em função da estiagem, percebemos uma desfolha bastante significativa nas lavouras e já podemos afirmar que ocorrerá uma redução significativa na safra a ser colhida em 2008”, informou Roberto Felicori Rodrigues, gerente do Departamento Técnico da Cocatrel (Cooperativa de Cafeicultores da Zona de Três Pontas).
Outro ponto comum com as regiões produtoras supracitadas, ainda de acordo com o gerente do Departamento Técnico da Cooperativa, é o fato das altas temperaturas estarem contribuindo para essas condições desfavoráveis à cafeicultura. “Elas (temperaturas) alcançam 30ºC durante o dia e caem bruscamente para 12ºC à noite”, comentou Rodrigues.
Na Alta Mogiana Paulista, a situação dos cafezais não difere muito da apresentada nas lavouras mineiras. Segundo informações da Cocapec (Cooperativa de Cafeicultores e Agropecuaristas da Região de Franca), a cafeicultura regional atravessa um momento de muita ansiedade à espera de precipitações, pois os cafeeiros se encontram em um dos estágios fenológicos mais sensíveis a estresses ambientais. “As gemas, que se diferenciaram anteriormente em órgãos reprodutivos, tiveram um desenvolvimento inicial, formando os botões, que, por sua vez, após atravessarem o período de dormência, estarão aptos a florescer. Esta dormência é quebrada por fatores ambientais ainda não conhecidos de forma clara, mas o que se sabe é que a água é um desses fatores, se não, o mais importante”, explicaram os técnicos da Cocapec.
Eles apontaram que os botões se encontram, atualmente, no estágio denominado como “E4”, em uma escala de classificação da fenologia reprodutiva do cafeeiro, o qual é bastante sensível a estresses ambientais e gera uma situação delicada pelo fato da região de Franca atravessar um momento de déficit hídrico acentuado. “Por outro lado, não podemos esquecer que, na maioria das lavouras, a dormência ainda não foi quebrada, portanto, os botões estão com seu desenvolvimento parado ou bastante diminuído, à espera de um estímulo para florescer”, argumentaram.
Ainda conforme os técnicos, apenas as lavouras mais novas, com três a quatro anos, e aquelas que estavam mais estressadas já floresceram com a precipitação ocorrida em julho. “As demais lavouras, ou seja, as que realmente tendem a registrar uma produção expressiva, ainda se encontram com os botões aptos a florescer e à espera do já mencionado estímulo”, completaram.
O presidente da Comissão Nacional do Café da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), Breno Mesquita, é outro a demonstrar preocupação com a atual situação que enfrentam os cafezais do Brasil. “Após a baixa produção desta safra, os produtores apostam em um aumento da produtividade para o próximo ano, o qual pode ser frustrado pelas condições climáticas. Ainda não podemos ter certeza se haverá prejuízo e que proporção terá, mas estamos alertando os produtores para essa possibilidade. Quanto mais demorar a chover, aumenta o risco de termos perdas significativas”, explicou.
Para o presidente do CNC (Conselho Nacional do Café), Gilson Ximenes, o fato mais preocupante é que, hoje, dia 19 de setembro, os principais institutos de meteorologia, nacionais e internacionais, não prevêem precipitações durante os próximos 15 dias nas principais zonas produtoras de café, como o Sul e o Cerrado de Minas Gerais, a Mogiana Paulista e a Zona da Mata. “Caso essas previsões estejam corretas, o déficit hídrico se intensificará, comprometendo de maneira significativa a próxima safra”, argumentou.
Finalizando, o presidente do Conselho Nacional do Café esclareceu que uma safra de produtividade afetada pelo clima cria o risco do Brasil não poder oferecer ao mercado internacional o volume demandado de café, uma vez que não o país possui estoques estratégicos.