Publicação: 05/07/07
IPC da Fipe sobe para 0,55% em junho, ante 0,36% no mês anterior; preço de alimentos tem maior variação desde 2002
Leite acumula alta de 25% em 2007; instituto, que também vê pressão do setor de serviços, eleva a 4,2% previsão da taxa para o ano
MAURO ZAFALON DA REDAÇÃO
A inflação vive um choque agrícola. Leite, feijão, frango, ovos e frutas se destacam entre as principais altas. Essa pressão puxou a inflação para cima no mês passado, e a taxa subiu para 0,55%, ante 0,36% em maio.
O reajuste de preços no setor de alimentação fez a Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) rever para cima a taxa de inflação deste ano. Prevista no início do ano em 3,5%, a taxa foi revista para 3,7% no meio do semestre e, agora, a Fipe estima 4,2%, diz Márcio Nakane, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor.
Em junho, os alimentos subiram 1,90%, a maior taxa mensal do setor desde o final de 2002. No acumulado do semestre, os alimentos ficaram 4,9% mais caros, contra a inflação média de 2,37%. A Fipe reviu a taxa de inflação mesmo com o sensível alívio que a energia elétrica vai trazer para o índice neste semestre. A tarifa de energia fica 12,66% mais barata para os paulistanos. Por ser um item de peso nos gastos diários dos consumidores, essa queda vai gerar deflação de 0,53%, ou seja, percentual próximo da inflação de junho.
No bolso
Os pesquisadores da Fipe constaram que o leite vem sendo o maior peso no bolso dos paulistanos. No mês passado, o produto teve aumento médio de 12,1%, acumulando 25% no primeiro semestre. O leite longa vida é o que mais subiu, com alta de 15,7% em junho, acumulando 33% no ano.
A alta dos preços do leite ocorre porque a oferta do produto está em queda no campo. Essa redução provoca uma disputa maior entre as indústrias, que, além de abastecerem o mercado interno, estão enviando mais leite para fora do país via exportação de derivados. Apesar da forte alta nos preços do leite neste ano, o produto tem acompanhado a variação média da inflação. Ao completar 13 anos, o Plano Real acumula inflação de 179%. No mesmo período, o leite subiu 185%.
A alta nos preços do leite provocou reajuste também nos derivados do produto, que subiram 3,83% no mês passado. Juntos, leite e derivados geraram inflação de 0,24% em junho, ou 44% do índice total.
Reversão
Nakane diz que o choque agrícola deve apresentar inversão neste semestre. Mas, se a pressão do leite e do feijão diminui, os consumidores podem se preparar para reajustes de frango, ovos, carne bovina e café, que estão com recuperação de preços na produção.
O pãozinho, outro item de peso no gastos diários dos brasileiros, pode entrar nessa lista de reajustes. Mesmo com a previsão de aumento neste ano, a safra nacional de trigo seria apenas metade da registrada nos anos de 2003 a 2005.
Se os produtos agrícolas sobem e descem conforme a oferta, o mesmo não ocorre com o setor de serviços, outro item de pressão na inflação. Quando reajustados, esses preços permanecem -e não voltam a cair. O aumento de demanda interna auxilia essa tendência altista, segundo Nakane.
Dois itens exercem influência de baixa na inflação: álcool combustível e dólar fraco. No caso do álcool, a queda acumulada em junho foi de 10%.
Já o dólar fraco derruba os preços dos equipamentos utilizados pelos consumidores nos domicílios. Os preços dos televisores caíram 15% nos últimos 12 meses, e os dos aparelhos de som, 13%.
Cafezinho, chope e loteria sobem mais, diz FGV DA SUCURSAL DO RIO
Os pequenos “vícios” do dia-a-dia, como o cafezinho após o almoço seguido de um cigarro ou o chope no final do dia com amigos num bar, ficaram mais caros nos últimos anos e subiram acima da inflação média, revela levantamento da FGV (Fundação Getulio Vargas). De janeiro de 2001 a maio de 2007, o IPC (Índice de Preços ao Consumidor) teve alta de 53,2%. Os cigarros subiram mais -76,73%. O café servido no balcão seguiu a mesma tendência, com aumento de 84,53%.
No caso do chope e da cerveja vendidos em bares, restaurantes e afins, o aumento também foi maior do que a inflação: 78,69% no período.
Na lista do que batizou como “vícios”, a FGV selecionou ainda os jogos lotéricos (só os oficiais, pois atividades ilegais como rinha de galo e jogo do bicho não são pesquisados), que subiram 73,21%. Segundo André Braz, economista da FGV, o café subiu na esteira dos reajustes do grão e do açúcar no mercado internacional. Ele afirmou, porém, que o produto no supermercado tende a acompanhar mais de perto os preços da commodity.
“O dono do bar e do restaurante espera um período maior para ver qual é a tendência dos preços no atacado antes de reajustar sua tabela. Há uma rigidez maior nesses serviços”, disse.
A cerveja e o chope, por sua vez, têm um comportamento sazonal: sobem no verão quando o consumo é maior, segundo o economista. Já o cigarro subiu por causa do aumento da carga de tributos, principal componente do preço do produto.
A FGV fez ainda uma seleção de “virtudes”, o que batizou de “bons hábitos de consumo”. Incluiu na lista academias de ginástica, salão de beleza e livros. Em todos os casos, os reajustes acumulados foram menores do que o IPC -48,45%, 34,25% e 45,01%, respectivamente. Classificados ainda como hábitos virtuosos de consumo, os jornais e os cinemas tiveram seus preços reajustados acima da inflação -58,13% e 66,78%.
Em 2007 (janeiro a maio), as altas do cafezinho (2,48%) e do chope (3,08%) superaram o IPC acumulado de 2,08%. No rol dos bons hábitos, ficaram acima da inflação os cinemas -2,69%.
A FGV usou o senso comum para fazer a seleção. Irritou, porém, a Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café). Em nota, a entidade disse “contestar veementemente” o modo como a fundação se refere ao café, que “não é um hábito nocivo à saúde”. “Tratar o café como vício, colocando-o ao lado de bebidas, fumo e jogo é uma irresponsabilidade.”
A Abic diz que o café é a bebida mais “democrática e barata” do país.
(PEDRO SOARES)