Líderes do setor criticam excesso do governo, que busca controle total. Venezuela importa 70% dos alimentos que consome; desde 2003, expropriou 2,5 milhões de hectares de terra
FLÁVIA MARREIRO
DE CARACAS
Dono de terras, fábricas e supermercados, o governo Hugo Chávez decidiu nesta semana decretar \”a compra forçosa\” da empresa Agroisleña, líder no mercado de implementos agrícolas.
A atitude provocou reação em produtores rurais e pecuaristas, e até em exportadores brasileiros.
Ontem, o presidente da Fedenaga, a associação nacional de produtores de gado, subiu o tom do protesto. \”Presidente, chegou a hora de corrigir. Não tente nos encurralar\”, disse o presidente da entidade, Egildo Luján.
\”Se tentar nos tirar nossas propriedades, nos defenderemos\”, continuou.
Analistas veem a nacionalização da empresa hispano-venezuelana Agroisleña como a segunda etapa da \”radicalização da revolução agrária\” anunciada por Chávez no domingo. A primeira foi a aprovação, em maio, da nova lei de terras, que proíbe arrendamentos, por exemplo.
O governo argumentou que a Agroisleña, responsável por 60% do mercado de implementos agrícolas, \”envenenava\” o campo e mantinha uma relação \”feudal\” com seus clientes. Prometeu pagar um preço \”justo\” pela empresa.
Mesmo a Confagan, confederação de pecuaristas e agricultores, com 300 mil afiliados, que apoiou a decisão de Chávez, exortou o governo a manter o nível de gerência da empresa, com mais de 50 pontos de venda no país.
Entre economistas considerados próximos do governo, como o ex-ministro da Indústria Básica Victor Álvarez, as críticas são sobre o voluntarismo e a falta de quadros no governo para tocar tantas responsabilidades ao mesmo tempo.
\”É só ver quantos no governo acumulam cargos. A falta de quadros é um gargalo\”, disse Álvarez, autor de \”Para Onde Vai o Modelo Produtivo Venezuelano?\”.
A Venezuela importa 70% dos alimentos que consome, numa dependência que se ampliou na era Chávez, de 1999 para cá.
Com a nacionalização, o governo participa de mais uma etapa do setor de alimentos, considerado \”estratégico\”. O plano de desenvolvimento socialista 2007-2013 diz que o Estado conservará o controle total das atividades produtivas estratégicas.
O governo anunciou que deve expropriar mais 750 mil hectares nos próximos meses -em sete anos foram expropriados 2,5 milhões de hectares. Desde 2007, já controla 75% da produção de café, 42% da farinha de milho -base da alimentação local- e quase metade da produção de leite.