Na avaliação de Guilherme Braga, diretor geral do Conselho dos Exportadores de Café (Cecafé), as condições para as vendas externas de café se mostram preocupantes. Entre outros fatores, o diretor afirma que é preciso que a oferta de crédito volte aos níveis normais. O setor continua a enfrentar problemas na contratação de crédito por meio de Adiantamento sobre Contrato de Câmbio (ACC), e as linhas estão caras e escassas, “acima do normal”, explica.
Estima-se que as taxas antes da crise estavam entre 7% a 8% ao ano, no máximo. Hoje se fala em crédito com taxas de 13% e 14% ao ano. Os prazos não tiveram alteração significativa e estão, em média, em 180 dias. Ele considera que a desvalorização do real ante o dólar deve melhorar a renda do produtor nacional. “O ganho cambial é superior à queda do preço do café no mercado”, diz. Mas a alta volatilidade do câmbio, no entanto, atrapalha o comércio. O exportador compra o café a um certo preço, cotado em dólar, no início do dia. À tarde, o mesmo produto tem outro valor, por causa do câmbio.
Braga comenta, ainda, que o próprio governo dá sua contribuição para atrapalhar o comércio exterior. Ele refere-se à Medida Provisória (MP) 449, editada em dezembro passado e que adotou o Regime Tributário de Transição (RTT) para as novas normas contábeis. Em linhas gerais, a medida restringe a aplicação do crédito fiscal que se acumula na exportação.
Conforme explicam especialistas, nas vendas externas não são cobrados alguns tributos, sobretudo o PIS e a Cofins. Essas contribuições podiam ser compensadas com o Imposto de Renda (IR) e a Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL) a pagar. Em seu artigo 29, a MP 449 passou a proibir a compensação para empresas que optarem pelo recolhimento do IR na sistemática do lucro real, por estimativa, o que é feito pela grande maioria das empresas. De acordo com Braga, a medida “reduz ainda mais o capital de giro dos exportadores”.
O farto financiamento aos produtores de café também contribui para enxugar a oferta do produto. O governo prorrogou dívidas de custeio, colheita e estocagem, conforme acertado na mais recente reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), no fim de janeiro. Será lançado, ainda, um programa de leilões de opção de venda de café ao governo, cujas regras deverão ser definidas este mês.
Além disso, a expectativa é de que a safra deste ano seja menor do que a do ano passado. A primeira pesquisa da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) mostrou que a safra deve ficar entre 36,9 e 38,8 milhões de sacas de 60 quilos. O resultado representa uma redução de 19,8% a 15,6% em relação à colheita passada, de 46 milhões.
Pelas contas do Cecafé, o volume de grãos verdes embarcado este ano está projetado em 25,2 milhões de sacas de 60 kg, em comparação com 26,1 milhões de sacas de 2008. O resultado representa queda de 3% a 4%. Considerando o embarque de café industrializado, o volume total de 2009 deve ficar em cerca de 28,2 milhões de sacas, o que corresponde a uma queda de cerca de 4% ante o recorde de 29,4 milhões de sacas de 2008.
De acordo com Braga, a receita cambial com exportação de grãos verdes em 2009 deve ficar entre US$ 3,7 bilhões e US$ 4,2 bilhões, em comparação com US$ 4,2 bilhões em 2008. A receita total do setor foi de US$ 4,7 bilhões no ano passado.
O preço médio geral do café exportado ficou em US$ 166/sc em 2008. Em janeiro do ano passado, o preço médio alcançou US$ 155/sc, recuando para US$ 150 em dezembro, como efeito da queda dos preços internacionais, provocada principalmente pela crise internacional.
Em janeiro deste ano, a expectativa é de que a cotação média de exportação fique em US$ 141 a saca, com retração de 6% ante dezembro. Braga ressalta, porém, que a tendência dos preços é de recuperação, considerando a entressafra no Brasil. “A curva dos preços negativos deve atenuar nos próximos meses”, diz.
Segundo ele, o preço do café na Bolsa de Nova York (ICE Futures US) pode retomar o nível de 1,30 cents a libra-peso, valor verificado antes da crise. É preciso, no entanto, que os fundamentos do mercado voltem a prevalecer, pois existe “um bom ajuste entre oferta e demanda”. Mesmo com a queda do volume exportado em relação ao recorde de 2008, a expectativa do Cecafé é de que o Brasil manterá a liderança no mercado internacional, com participação em torno de 30% de market share.
As consequências da crise internacional também devem fazer eco no setor de café industrializado, em particular de solúvel, cuja maior parte da produção, cerca de 90%, é destinado ao mercado externo. A perspectiva do setor é de redução de cerca de 10% no volume embarcado em relação ao ano passado, quando o setor exportou 3,3 milhões de sacas. As perdas, entanto, pode alcançar até 20%, dependendo dos efeitos que a crise ainda possa provocar no mercado.
A receita cambial deve acompanhar o desempenho em volume, podendo fechar o ano com faturamento de cerca de US$ 520 milhões, em comparação com US$ 570 milhões em 2008 (menos 9%). A avaliação é do diretor executivo da Associação Brasileira da Indústria de Café Solúvel (Abics), Roberto Cézar Ferreira Paulo.
De acordo com Ferreira Paulo, o cenário é desfavorável porque a recessão tende a atingir fortemente os países mais fracos, com economias menos sólidas, mercados emergentes. Alguns desses países prejudicados pela crise, infelizmente, são grandes importadores do solúvel nacional, como a Rússia, a Ucrânia, o Leste Europeu, de modo geral, além de outros, como Argentina e Chile. Mesmo países consumidores tradicionais, como Estados Unidos e Reino Unido, também devem registrar algum recuo na demanda.
O diretor acrescenta que persiste sem solução a questão da sobretaxa de 9% para o solúvel brasileiro que entra na Europa, numa ação discriminatória que exige interferência da diplomacia. Por Tomas Okuda, da Agência Estado.