Gazeta Mercantil
De especialistas a leigos, muitos me perguntam se o incremento na produção da cana-de-açúcar vai diminuir a área plantada com outras culturas, especialmente a do café. A preocupação é válida em um país cujo passado colonial sempre induz a relacionar cana-de-açúcar à monocultura predatória, poluente, escravista. Bem diferente da sustentável atividade canavieira. Em áreas de matriz produtiva diversificada, como é o caso do oeste da Bahia, a cana-de-açúcar será a consolidação da variedade produtiva que caracteriza a região. Não representa ameaça aos níveis de produção.
A cana-de-açúcar seria mais um produto a dividir as áreas extensas e mecanizáveis do cerrado baiano, onde já estão consolidadas culturas como café, soja, algodão, milho, frutas, entre outras, com pouco mais de 1,6 milhão de hectares. O café é totalmente irrigado, 95% sob pivô central. A irrigação dos cafezais, audaciosamente iniciada em meados da década de 90, tornou a cafeicultura uma realidade no oeste baiano, superando em escala a produção em áreas tradicionais do estado, como a região de planalto, na Chapada Diamantina.
Estima-se que a entrada da cana-de-açúcar no cerrado da Bahia irá ocupar uma área de 300 mil hectares, prioritariamente, em regime de sequeiro, com irrigação complementar esporádica através de pivôs móveis. Portanto, não seria pela decisão em investimentos em irrigação que a cana e o café competiriam. Tampouco seria por área, uma vez que há grande disponibilidade de terras, inclusive irrigáveis, com água, luminosidade e mão-de-obra.
É a variedade na agricultura que coloca o Oeste da Bahia em posição singular, menos suscetível às oscilações de preço, sazonalidade, ataques de pragas ou de doenças. Foi assim, quando a ferrugem da soja atingiu 100% das lavouras baianas e o algodão garantiu o sustento na região. E, de modo semelhante, nos três últimos anos da cafeicultura, quando os preços não animavam sequer a colheita. O produtor que diversificou seus investimentos não ficou refém dessa situação.
Sobre essa questão, vem-me à mente a lição da indústria automotiva. Foi ela que provocou todos esses questionamentos, quando deu ao consumidor a “flexibilidade” de optar entre dois combustíveis e aumentou assustadoramente a demanda pelo álcool no País. Entre a cana e o café, acredito que o produtor que pensa estrategicamente o seu negócio, ficará com os dois, e mais soja, algodão, milho e quantos mais seja viável plantar.