Cana avança em áreas de alimentos

Por: Valor Econômico

AGRONEGÓCIOS
30/04/2008
 
Cana avança em áreas de alimentos
 
 
Mauro Zanatta
Apontada pelos críticos dos biocombustíveis como uma das vilãs da disparada dos preços dos alimentos, a cana-de-açúcar tem avançado sobre áreas cultivadas com soja, milho, café e laranja na região centro-sul do país, revela estudo oficial divulgado na terça-feira pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Os dados apontam que ao menos 27% da expansão da área de cana no ano-safra 2007/08, segundo declaração dos próprios produtores, ocorreu em regiões antes ocupadas por esses culturas. O restante da expansão foi em áreas de pastagens.


O governo vinha negando de maneira sistemática a ampliação da área de cana em regiões ocupadas por grãos. E tem usado esse argumento para rebater os recentes ataques à produção dos biocombustíveis e seus efeitos sobre a inflação dos alimentos.


A dimensão dessa substituição, entretanto, é ainda bastante restrita, mostra a Conab. Apenas 176,2 mil hectares de soja, milho, café e laranja foram desalojados pela cana no centro-sul, segundo os dados do levantamento “Perfil do setor do açúcar e do álcool no Brasil”, que pesquisou 343 usinas em 19 Estados.


A maior parte da expansão da matéria-prima do etanol (64,7%) ocorreu, porém, em áreas de pastagem. Neste ano-safra, foram substituídos 423,1 mil hectares de pastos. A pesquisa da Conab também mostra o avanço da cana em 15,5 mil hectares de novas áreas (2,4%) e em 38,9 mil hectares de outras áreas não-especificadas pelos produtores (6%).


Os números não permitem inferir que a expansão tenha ocorrido em regiões de floresta. Pode ter sido em áreas até então em regime de pousio. “A cana-de-açúcar não tem, na tradição brasileira, o papel de lavoura pioneira em áreas virgens da fronteira agrícola”, afirma, no estudo, o coordenador da pesquisa Ângelo Bressan. “O movimento recente de expansão, com crescimento anual da área cultivada acima de 10%, segue o padrão tradicional e se expande, na quase totalidade, em áreas já ocupadas por outras atividades agropecuárias”. O estudo conclui que o crescimento da área de cana nos anos recentes “não parece ser suficiente para modificar o panorama agrícola e pecuário do país”. Mas adverte que devem ser examinadas “com mais cautela” questões sobre mudanças na paisagem local e seus efeitos provocados pela construção de novas usinas.


A Conab também divulgou na terça-feira a nova estimativa recorde de produção de cana-de-açúcar e de álcool no país. Mesmo com a crescente onda retórica contra os biocombustíveis, os produtores devem colher a maior safra da história com uma variação entre o piso de 608 milhões de toneladas e o teto de 631,5 milhões de toneladas. O desempenho pode ser de 9% a 13% superior às 558,5 milhões de toneladas colhidas no ciclo anterior. A Conab aponta os fatores para o forte avanço: investimentos em tecnologia nas usinas, variedades mais produtivas e clima favorável. A expansão da produção deve-se também ao aumento da área plantada, que deve saltar de 7 milhões para 7,8 milhões.


Este primeiro levantamento da Conab mostra que a maior parte da cana será destinada à produção de álcool. As usinas devem processar entre 310 milhões e 322 milhões de toneladas (55%) para o biocombustível. A industrialização deve resultar em 26,4 bilhões a 27,4 bilhões de litros de álcool, algo como 15% a 19,4% acima do resultado do ciclo passado. A Conab estima a exportação de 4,2 bilhões de litros – 2,5 bilhões de litros para os Estados Unidos. Se confirmadas as atuais condições, a produção de açúcar (44% do total) deve ficar entre 248 milhões a 258 milhões de toneladas. Outras 50 milhões a 51,7 milhões de toneladas devem ser usadas na fabricação de outros produtos, como aguardentes, ração animal, sementes e mudas.


O avanço da área para cana no Brasil tem suscitado vários debates no mercado internacional. Críticos afirmam que a expansão da cultura é feita em regiões do bioma amazônico. Houve pouco avanço da cultura nessas regiões.


De acordo com Plínio Nastari, presidente da consultoria Datagro, a cana não pode ser culpada pelo desmatamento da amazônia. Nastari afirma que essas críticas, sobretudo da União Européia, chegam em tom de restrição de acesso a mercado. “A cana avança sobre as pastagens”, observa. Mas, segundo o consultor, a atividade pecuária no Brasil tem registrado ganhos de eficiência, com maior número de cabeças de gado por hectare. “Antes a ocupação era de 0,4 a 0,5 cabeça por hectare no país. Saltou para 0,8 hectare”, diz ele.


Nastari lembra, também, que o governo federal deveria rever o conceito do uso econômico da terra para fins de reforma agrária no país. “Hoje a legislação brasileira considera as áreas de pastagens isentas de risco de serem tomadas para a reforma agrária”, diz. (Colaborou MS)

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