10/02/2012
Fundação Ezequiel Dias, de BH, e Anvisa lançam atlas com detalhes sobre plantio, colheita e processamento do grão torrado e moído. Objetivo é melhorar controle de qualidade e análise em todo o país
Carolina Cotta | Estado de Minas
Maior produtor e exportador de café do mundo, o Brasil terá agora uma importante ferramenta para o controle da qualidade dos grãos colhidos por aqui. A Fundação Ezequiel Dias (Funed), em Belo Horizonte, e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) lançaram esta semana o Atlas de microscopia de café torrado e moído, publicação que reúne informações sobre o processo produtivo do grão, plantio, colheita, processamento, armazenamento e, principalmente, a morfologia e histologia do fruto e a identificação de fraudes usuais. O material passa a ser fonte de consulta em todos os laboratórios brasileiros que fazem análises de vigilância sanitária de controle da qualidade do café consumido no país e também nos laboratórios da indústria cafeeira.
A Funed, laboratório oficial em Minas Gerais para esse tipo de análise em produções sujeitos a controle, como alimentos, cosméticos, medicamentos e produtos saneantes, tem pesquisado amostras de café há 20 anos mas só agora pode ampliar e sistematizar as descobertas. Segundo a bióloga Virgínia Del Carmen, chefe do Serviço de Microscopia da entidade e responsável pela produção do material, a área de microscopia é carente em referências bibliográficas, faltando a pesquisadores e técnicos compêndios e materiais de referência para auxiliar de forma prática na observação do material.
“É essa a razão de divulgarmos nosso conhecimento em um atlas impresso para distribuição gratuita na rede nacional de laboratórios de saúde pública, laboratórios parceiros em análise de café, instituições de ensino e pesquisa e indústria cafeeira”, diz.
A Fundação Ezequiel Dias faz três tipos de análises de controle de qualidade do café torrado e moído, em laboratórios diferentes: o de micologia, que realiza a contagem e identificação dos fungos; o de micotoxinas, que analisa a quantidade presente de substâncias produzida por fungos nas amostras do fruto, do grão, do café torrado e moído; e o de microscopia, que contabiliza impurezas. No ano passado, 136 amostras passaram por esse último tipo de análise. Segundo Virgínia Del Carmem, 16% delas apresentaram impurezas acima da taxa permitida, que é de 2%. “Em algumas identificamos até mesmo presença de outros grãos, como milho”, afirma. Essa é, inclusive, a fraude mais comum. Nas análises do ano passado, 7% das amostras continham milho.
É aí que está a principal contribuição da publicação. A detecção de fraudes em café é feita por meio da análise microscópica do grão torrado e moído, o que permite uma visualização histológica de cada espécie vegetal presente no produto, permitindo avaliar o grau de pureza do café. Tais impurezas seriam imperceptíveis a olho nu em função da cor castanho-escura do grão, exigindo um desengorduramento prévio da amostra com solvente orgânico para que as substâncias tornem-se visíveis ao exame da lupa. As imagens microscópicas das principais fraudes estão detalhadas no atlas que em um dos capítulos dá ênfase à identificação, por métodos morfoanatômicos, dos vegetais estranhos.
GANHOS PARA O CONSUMIDOR O atlas ganha ainda mais importância em um período em que o Brasil caminha para ser também o maior consumidor de café do mundo, lugar hoje ocupado pelos Estados Unidos. Conforme a bióloga, para apontar a origem da contaminação de um produto é necessário um trabalho de vigilância sanitária eficaz. Mas não basta identificar, é preciso apontar em que momento do processo de fabricação o problema aconteceu. “Daí a importância do Atlas que, de forma ilustrativa e didática, apresenta a metodologia de análise para avaliação da qualidade desse produto tão comum na casa dos brasileiros”, afirma Virgínia. O consumidor final, sem dúvidas, é o maior beneficiado.
Chefe da Divisão de Vigilância Sanitária e Ambiental da Funed, Rita Lopes Naveira acredita que o brasileiro acostumado a tomar café diariamente vai ter acesso a um produto com qualidade assegurada, já que o atlas vai permitir à indústria e à vigilância melhores condições de análise. “O técnico responsável pela avaliação do café, ao ver algo estranho na lâmina, terá uma imagem de referência no atlas para ajudá-lo na identificação do que não reconhece”. Segundo ela, Minas Gerais tem a preocupação de analisar todo alimento com impacto na saúde. “Este é um produto de grande consumo e valor comercial. O brasileiro gosta e precisa de um café de qualidade”.
Os produtores de café também terão mais recursos para mandar ao mercado um produto melhor, apesar de apenas a minoria manter laboratórios de análise de qualidade, ficando à mercê de uma análise externa. Flávio Silveira, diretor técnico do Sindicato da Indústria de Café de Minas Gerais (Sindicafé-MG), acredita que essa identificação dos pontos críticos e detalhamento das boas práticas agrícolas vão culminar na melhoria do café que vai para o consumidor. A ideia inicial é que cada indústria tenha seu laboratório de microscopia, permitindo a identificação de problemas antes de vender a safra em questão. Caso contrário, pode ser instaurado um processo contra a empresa, que passará por várias vistorias.