31/03/2014
Katia Simões | Para o Valor, de São Paulo
De 2004 ao primeiro semestre de 2013 o consumo de café fora do lar cresceu mais de 350%, de acordo com a Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic). Um volume expressivo, decorrente do aumento da oferta de produtos preparados em monodoses, cafés em sachês, as cápsulas e os coados na frente do consumidor. A migração do consumo da bebida permitiu, também, que o brasileiro apreciasse um café de melhor qualidade, elevando para 15% ao ano o crescimento da procura por cafés especiais, contra 3% dos grãos tradicionais.
Os cafés especiais correspondem, hoje, a 5% do volume e a 9% do valor das vendas do setor. A expectativa, segundo a Abic, é que nos próximos 10 anos representem de 10% a 12% da produção. O consumo interno de café é de aproximadamente 20 milhões de sacas, destas, 1 milhão são de cafés especiais. “Este é um mercado que tende a crescer muito, está apenas engatinhando”, afirma a mestre de torra e barista Isabela Raposeiras. “Mas, está longe de ser um negócio para varejistas dispostos a ganhar dinheiro em um curto espaço de tempo.”
Segundo Isabela, muita gente abre uma cafeteria achando que vai ganhar muito dinheiro, mas o retorno do investimento em café é demorado. “No Brasil, o consumidor quer ser servido à mesa, o que demanda mão de obra, treinamento e custo”, afirma. “Assim, na ânsia de aumentar os ganhos, muitos diversificam o mix, o que dá ainda mais trabalho e foge do foco. Café exige disciplina, método, dedicação.”
Há 11 anos, Isabela comanda uma escola de baristas e há quatro decidiu abrir a própria cafeteria, a Coffe Lab, na Vila Madalena, em São Paulo. O objetivo era oferecer ao consumidor a experiência sensorial do café – do grão à xícara, passando pelos processos de torra, moagem e preparo. Para garantir a qualidade dos grãos ela paga até cinco vezes mais caro que a média do mercado a uma dúzia de pequenos produtores de Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Espírito Santo. “Produzir café de qualidade custa caro”, justifica. “Optei por ganhar de forma sustentável, perene. Tem xícara por R$ 13 e há consumo porque as pessoas se apaixonam pelo produto.” O faturamento estimado para este ano é de R$ 2,5 milhões, 60% só com a cafeteria.
Este também foi o modelo escolhido por Diego Gonzales, engenheiro florestal de formação, que em 2011 decidiu investir em uma grande paixão: o café. Fez curso de barista e abriu a Sofá Café, no bairro de Pinheiros, em São Paulo. “Escolhi trabalhar com cafés especiais, de qualidade superior aos cafés gourmet, como um diferencial, pois sabia, desde o início, que iria competir com grandes empresas como Starbucks e Suplicy “, afirma.
Em meados de 2012, Gonzales iniciou o processo de torra dos grãos na cafeteria, que lhe permitiu misturar grãos e chegar a padrões sensoriais próprios. Em seis meses passou a fornecer café torrado para 12 clientes, em três Estados, abrindo um novo nicho de mercado. Hoje, a Sofá Café tem três unidades na capital paulista e se prepara para abrir a primeira em Boston, nos EUA. O faturamento deverá saltar de R$ 700 mil de 2013 para R$ 1,5 milhão este ano. “O grande desafio é educar o brasileiro para o consumo da bebida”, declara Gonzales. “Até hoje ouço reclamações que a xícara está pela metade. Expresso é 30 ml, acima desse volume começa a amargar.”
De xícara em xícara as cafeterias já somam cerca de 3.500 endereços em todo o Brasil, e se transformaram num agente de mudança do consumo da bebida no Brasil, de acordo com o relatório “Café”, divulgado em 2013 pela Mintel, empresa britânica fornecedora global de inteligência de mídia, consumidor e produto.
É no ambiente das lojas de café que os consumidores muitas vezes têm seu primeiro contato com os grãos especiais. A pesquisa mostra que 32% dos consumidores, que afirmam preferir café premium às marcas comuns, dizem consumi-lo em uma cafeteria. Ainda segundo o relatório, o uso de maior valor agregado da bebida é maior entre os consumidores mais novos – 12% dos jovens entre 16 e 24 anos dizem que consomem cafés especiais gelados. Os drinks à base de café custam mais e ganham cada vez mais espaço nos cardápios das cafeterias. Na Coffee Lab, por exemplo, são quatro; na Sofá Café, seis, a preços que chegam a R$ 13.
O estudo da Mintel destaca, ainda, que as vendas de café no varejo devem crescer 20,3% nos próximos três anos, alcançando R$ 10,1 bilhões em 2017, bem acima dos R$ 6,9 bilhões registrados em 2012. É de olho nesse crescimento que Marcos Modiano desenha a expansão da Armazém do Café, rede de cafeterias com sete pontos no Rio de Janeiro, que vende uma média de 800 xícaras de café gourmet por dia. A primeira cafeteria abriu as portas em 1997, quando pouca gente tinha o hábito de tomar um café de qualidade.
Para expandir o negócio, ele passou a instalar, há seis meses, máquinas de expresso com a própria marca em restaurantes, escritórios e consultórios. São 6 mil doses de café a mais em seu movimento e, em 2014, espera crescer pelo menos 50% nesse nicho.