Bebida agrega valor aos excedentes da fruta
Além do consumo in natura, o abacaxi pode ser aproveitado para sucos, geleias e outros produtos. Mas, apesar da abundância do cultivo no Brasil da planta, seu aproveitamento industrial ainda é pequeno.
Uma pesquisa realizada no Departamento de Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro testou a produção de vinhos como alternativa para aproveitar o eventual excedente da produção da planta nativa.
Os resultados mostraram boa aceitabilidade e apontaram semelhanças na composição química em relação aos vinhos de uvas, em função da concentração de açúcares fermentescíveis, acidez e características sensoriais.
O estudo, publicado na revista Ciência e Tecnologia de Alimentos, analisou a composição química e a aceitabilidade de duas variedades do fruto mais produzidas no país: peróla e smooth cayenne. Segundo a nutricionista Fabiana Silva Rodrigues, uma das autoras do artigo, vários subprodutos
são retirados da casca, que ainda contém teores de polpa, podendo ser aproveitada para suco, geleia e outros derivados, como o vinho. Este último, destaca, pode ser uma alternativa para valorização das safras da planta da família das bromeliáceas.
– As características químicas do vinho de abacaxi são muito parecidas com as do vinho branco de uvas, mesmo havendo alguma diferença entre as variedades pérola e smooth cayenne, em relação aos compostos aromáticos e fenólicos – disse.
O estudo é orientado pelo professor Armando Ubirajara de Oliveira Sabaa-Srur, que coordena o Grupo de Pesquisa em Processamento de Frutas e Hortaliças da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Os mostos de abacaxi foram analisados quanto a características como acidez, ácidos orgânicos fixos, açúcar total, pectina total, compostos fenólicos, potássio, cálcio, ferro e outros elementos. Nos vinhos, analisou-se também a acidez volátil, teor alcoólico, alcoóis superiores, acetaldeído, acetato de etila, glicerol, metanol e cor.
Os vinhos são tradicionalmente preparados pela fermentação de mostos de uvas, que produzem etanol e outros produtos metabólicos. Há também experiências na produção a partir de outras frutas, como amora, manga, melão e maracujá.
– A produção de vinho de abacaxi é quase que exclusivamente caseira, podendo atingir escala maior desde que encontre mercado consumidor. Pode ser obtido em boas condições se forem usadas as mesmas técnicas adotadas para a fermentação de mostos de uvas – disse Fabiana.
Mas a ideia não é substituir a uva, uma vez que o produto final é diferente.
– O aroma no vinho de abacaxi é muito pronunciado, o que torna a bebida indicada para o consumo no verão, em temperatura relativamente baixa, de 12 ºC a 14 ºC. Mesmo mantendo semelhanças com o vinho de uva, nota-se que é de outra fruta pelo aroma – explicou.
Para se obter vinho de abacaxi foram usadas as mesmas técnicas adotadas para a fermentação de mostos de uvas, mas com algumas adaptações, principalmente em relação à clarificação e estabilização.
As técnicas consistiram em obtenção do mosto, centrifugação para clarificação, sulfitagem, correção do conteúdo de açúcar, inoculação da levedura, fermentação a baixa temperatura, clarificação e estabilização e engarrafamento.
– Os cuidados devem ser os mesmos para a produção de vinho de uva, como o acompanhamento da fermentação, sulfitagem, estabilização a temperatura baixa e evitar o contato com o ar – disse Fabiana.
A pesquisadora conta que foi aplicada a tecnologia utilizada para vinho branco de uvas, com bom resultado de gosto e aroma.
– Entretanto, podemos pensar em alternativas tecnológicas mais voltadas ao abacaxi e, quem sabe, melhorar ainda mais as características do produto – disse.
Quanto à viabilidade econômica, a nutricionista aponta que a produção de vinho de abacaxi não sairia cara, se comparada à de uva, uma vez que “pode-se aproveitar o excesso das safras, e o vinho seria um produto alternativo. Seria uma maneira de agregar valor à produção do abacaxi”.
– No nosso trabalho, a aceitabilidade de ambas as variedades foi boa, mas teríamos que fazer um estudo mais amplo, inclusive quanto à viabilidade econômica. A dificuldade principal seria o público aceitar o vinho de abacaxi, pois, em geral, sempre se espera que o vinho seja feito de uva – disse Fabiana.