Cafeicultura brasileira crise, recuperação e desafios

28 de março de 2006 | Sem comentários Mais Café Opinião
Por: Jornal Estado de Minas

Glauco Carvalho
Economista e pesquisador da Embrapa Monitoramento por Satélite

José Roberto Mendonça de Barros
Sócio-diretor da MB Associados
jr.mendonca@mbassociados.com.br  

O ano de 2005 foi bastante positivo para a cafeicultura brasileira, com melhoria de rentabilidade, das exportações e do consumo doméstico. Há poucos anos, no entanto, o setor enfrentou uma grande crise, enquanto outros segmentos se destacavam positivamente. De 1997 a 2001, o preço internacional médio do café na Bolsa de Nova York (contrato C) caiu 70%. O plano de retenção que objetivava enxugar o mercado não garantiu sustentação de preços e ainda causou perda de mercado mundial para o Brasil. Houve abandono de lavouras, redução de tratos culturais e endividamentos.

No final de 2002, as cotações iniciaram uma recuperação. Em 2005 o preço médio internacional aumentou 41% em relação a 2004. Essa melhoria ocorreu, em razão de uma combinação de menor safra no Brasil e no Vietnã (clima seco), de perdas de produção e estoques em países da América Central e Estados Unidos (furacões) e de crescimento do consumo mundial, que superou a produção em cerca de 9 milhões de sacas de 60 quilos. As exportações brasileiras de café cresceram 44% em 2005, atingindo US$ 2,9 bilhões, e o consumo interno foi de 15,5 milhões de sacas, o que representou 47% da última safra.

Apesar das especulações acerca do volume a ser produzido pelo Brasil, que pode se reduzir pela seca em algumas regiões, os baixos estoques de passagem da safra 2005/2006 devem garantir suporte ao preço médio internacional este ano, salvo alguma anormalidade climática.

A variação do euro em relação ao dólar está sendo determinante na definição do preço do café. Desvalorizações da moeda européia são seguidas de um recuo nos preços do café, sendo o contrário também verdade. Entre janeiro de 2003 e março de 2005, enquanto o euro se valorizou cerca de 25% em relação ao dólar, o preço internacional do café aumentou 97%. No período seguinte, março a dezembro de 2005, o euro recuou 7,5% e o preço do café caiu 18%. Entretanto, espera-se uma valorização do euro ao longo deste ano, como resposta ao fim do período de elevações de juros nos Estados Unidos e pelo aumento dos juros pelo Banco Central Europeu, o que deve dar suporte aos preços.

O primeiro levantamento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) indicou produção de 42 milhões de sacas para a safra 2006/2007. No caso do Vietnã, a produção pode se aproximar de 15 milhões de sacas. Esses dois países, portanto, poderiam ofertar cerca de 11,8 milhões de sacas adicionais. Considerando mais cerca de 1 milhão de sacas da Colômbia e outros países em conjunto, a safra mundial poderá atingir 121 milhões de sacas em 2006/2007, para um consumo próximo de 118,7 milhões de sacas.

Os estoques finais, estimados em 50,1 milhões e 41,2 milhões de sacas em 2004/2005 e 2005/2006, respectivamente, iriam para 43,5 milhões no atual ano-safra. A safra brasileira 2007/2008 será de bianualidade baixa. Portanto, a situação estatística entre oferta e consumo de café deve se manter mais ou menos justa nos próximos anos, com a demanda crescendo mais de 2 milhões de sacas por ano. Espera-se uma certa sustentação nas cotações e uma forte influência do weather market (em que as cotações oscilam ao sabor das previsões climáticas).

Será fundamental uma boa gestão de risco, pois, além do recuo dos preços durante a safra, a volatilidade deverá ser elevada. A venda de parte dos estoques até março e abril, a comercialização antecipada de parte da próxima safra por meio de Cédulas do Produto Rural (CPRs) ou do mercado futuro e a utilização de opções de venda privadas e públicas são alternativas que precisam estar na pauta do setor. Em março de 2005 a saca atingiu R$ 400; essa mesma saca, corrigida pelo juros, eqüivaleria hoje a R$ 460, bem acima dos atuais R$ 260 a R$ 270 pagos no mercado físico enquanto escrevemos este texto. A estratégia de reter o produto para tentar vender apenas no auge dos preços raramente é bem-sucedida.

O grande desafio para o Brasil nos próximos anos passa pelo aumento de participação no mercado mundial de café, atualmente em 30%. Um caminho será pela agregação de valor, incrementando os embarques de café torrado e moído, de café solúvel e de café verde (em grão) de melhor qualidade. O consumo nos países do Oriente Médio, Europa Oriental e no Japão tem crescido bastante e é preciso aproveitar as oportunidades que são abertas.

O segmento de cafés especiais continua crescendo a taxas próximas de 10% e o Brasil ainda participa pouco desse mercado (cerca de 5%). É importante o esforço do setor produtivo para ingressar nesse segmento, pois tente a induzir a práticas produtivas mais adequadas e promover a imagem do produto brasileiro no exterior.

A melhoria da qualidade do café também serve de catalisador do consumo mundial, conforme estudo da OIC em 2004. Essa idéia é reforçada pela correlação positiva entre o consumo de café e a participação do café arábica no blend dos países tradicionalmente importadores.

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