03/12/2008 05:12:21 – UOL
James Kanter
Em Bruxelas
Alexander Just, um arquivista da União Européia (UE), pode não ser um conhecedor de café. Mas o espresso da nova máquina avançada italiana em seu escritório tinha um gosto estranho o suficiente para estar disposto a pagar 70 euros do próprio bolso para que fosse testada.
O resultado? Níveis astronomicamente altos de níquel e quantidades elevadas de chumbo. O suficiente para a Comissão Européia desligar todas as 20 máquinas – instaladas em janeiro a um custo de cerca de 5 mil euros cada.
Em breve as máquinas serão removidas dos andares superiores de Berlaymont, o prédio em Bruxelas onde as principais autoridades da Comissão Européia têm seus gabinetes.
Não há evidência de que alguém tenha adoecido, mas o problema provavelmente dará munição aos críticos da UE que se queixam dos gastos excessivos em Bruxelas – e incomoda os próprios comissários, que agora terão que entrar na fila nos cafés, ao lado de milhares de burocratas de menor escalão para tomar uma xícara de café.
Um porta-voz da comissão disse que era “prematuro” comentar sobre se a UE terá que pedir seu dinheiro de volta -uma soma de cerca de 100 mil euros. O alvoroço já se degenerou em uma batalha judicial envolvendo as autoridades belgas, que emitiram em novembro um alerta de saúde válido para toda a Europa, e a fabricante, a Cimbali, que diz que a culpa não é de suas máquinas.
Não está claro se o alerta belga foi provocado pelos problemas na Comissão Européia ou por queixas separadas. Mas um tribunal belga suspendeu a ordem na sexta-feira, segundo a empresa.
“Nós confirmamos que nossos produtos estão de acordo com todos os padrões internacionais exigidos”, disse Luca Dussi, o diretor de marketing e comunicações do Grupo Cimbali. Ele se recusou a comentar se as máquinas feitas pela Cimbali continham níquel ou chumbo em sua manufatura.
Mesmo assim, desde que o problema veio à tona, todos com acesso às máquinas em Berlaymont, incluindo membros do gabinete de José Manuel Barroso, o presidente da Comissão Européia, foram informados por uma enxurrada de e-mails internos que agora terão que dispensar o café.
As máquinas de café Cimbali são chamadas “superautomáticas” que moem os grãos, selecionam a quantidade de leite e descartam o pó de café usado, tudo ao toque de um botão.
A Cimbali, com sede em Milão, produz máquinas de café espresso e cappuccino desde 1912. A Cimbali possui subsidiárias na França, Espanha, Reino Unido e Estados Unidos, mas opera por meio de uma rede de distribuidores diretos por toda parte.
As máquinas visavam ser um privilégio para os mais altos funcionários da UE -os poupando e aos membros de seus gabinetes de terem que entrar na fila nos cafés nos outros andares.
Algumas autoridades se queixam de que os modelos Cimbali substituíram boas máquinas de café, e que não havia necessidade de gastar dinheiro do contribuinte em máquinas luxuosas.
A indulgência se transformou em um alerta de saúde quando Just, que trabalha para Danuta Hübner, a comissária de política regional, notificou o departamento de serviços do prédio sobre os resultados que tinha obtido. Just, que é formado em biologia, enviou amostras de água da máquina para seu país natal, a Áustria, para testes que revelaram níveis muito elevados de níquel e grandes quantidades de chumbo.
“O resultado foi chocante”, Just escreveu em uma carta em 13 de novembro ao Escritório de Infra-estrutura e Logística da Comissão Européia.
“Dois parâmetros de metais pesados estão acima do que é legalmente permitido para água potável e portanto ela não deve mais ser usada para beber.”
Justi disse que os testes apontaram o níquel mais de 17.000% acima do limite legal, e os níveis de chumbo estavam 16% acima do permitido.
Uma nota que circulou entre os funcionários na quinta-feira alertava que a exposição elevada ao níquel poderia afetar pessoas com tendências alérgicas, provocando problemas de pele ou desordens gastrointestinais. O níquel seria “eliminado de 7 a 40 dias após a absorção, dependendo da quantidade absorvida e da duração da exposição ao metal”, dizia a nota.
Uma “quantidade relativamente pequena de chumbo” foi detectada e era “improvável que os efeitos no organismo humano poderiam ser detectados por análises específicas”, dizia a nota, dando o nome e o telefone de um médico para os funcionários preocupados com sua saúde.
Dennis Abbott, um porta-voz da Comissão, disse que a SGS, a empresa contratada pela pelo braço executivo da UE para realizar uma segunda série de testes, confirmou alguns dos resultados de Just.
De lá para cá, o departamento de serviços do prédio desativou cerca de 20 máquinas Cimbali – algumas delas modelos de mesa.
“A SGS encontrou níveis de chumbo e níquel que são preocupantes em 17 das máquinas”, disse Abbott. “Nós não podemos ligar essas máquinas diante dessas preocupações.”
Abbott disse que o chumbo e o níquel foram encontrados na água no reservatório das máquinas, que é usada para fazer o café. Ele disse que o teste da SGS descartou problemas com o fornecimento de água ao prédio e nos canos que a levam às máquinas.
Todas as máquinas foram desativas e poderão ser removidas, mas ele disse que a comissão ainda está negociando com a fornecedora, a Cimbali da França, sobre se o problema pode ser resolvido.
Abbott disse que a probabilidade de problemas de saúde é baixa, porque as máquinas estavam em funcionamento apenas desde janeiro.
Na sexta-feira, a Justiça belga emitiu uma ordem suspendendo o alerta de saúde belga, segundo a empresa.
“Todas as máquinas Cimbali, incluindo o modelo coberto pelo alerta, podem ser comercializadas e não serão retiradas do mercado europeu”, disse Christian Montana, um advogado que representa a Cimbali.
Um porta-voz da Agência Federal para Segurança da Cadeia Alimentar belga, contatado na noite de terça-feira, disse que não dispunha de detalhes suficientes sobre o caso para comentar.
Tradução: George El Khouri Andolfato