Café inaugura série “Temas Brasileiros”

Novo volume da revista História Viva, em sua primeira edição, descreve a influência da bebida mais popular do mundo na vida dos brasileiros.

10 de outubro de 2005 | Sem comentários Especiais Mais Café
Por: André Larcher

O café, fonte de prazer e poesia, economia e política, escravos e indústrias, é o objeto inaugural da nova série da revista História Viva, os especiais “Temas Brasileiros”, que chegam nas bancas neste mês. Bimestrais, as edições detalharão aspectos que tenham centralidade na formação da cultura brasileira – o próximo número, a ser lançado em novembro, abordará os 500 anos de influência da Igreja Católica no país. No primeiro volume, historiadores, pesquisadores e demais especialistas na área narram a influência do grão na vida dos brasileiros.

Tal como a cana-de-açúcar, não há como analisar a história do Brasil sem mencionar a cafeicultura. Na passagem do Belém do Pará, primeira região a cultivar o grão no século XVIII, ao sudeste do país, atual líder em produção, o café atingiu diversas localidades – oeste baiano, região centro-oeste, norte do Paraná, oeste de Minas Gerais – consolidando o Brasil como o maior produtor e exportador mundial de café. Nos arredores de Campinas, por exemplo, ainda se podem encontrar fazendas que atingiram seu apogeu produtivo durante a década de 1880. Por isso, o volume de História Viva traz também um guia turístico com 10 fazendas características abertas à visitação.

O café foi decisivo para a industrialização brasileira. Em São Paulo, famoso pelos “barões do café” do século XIX, a cafeicultura transformou o estado no principal pólo comercial e exportador do país, com a construção de ferrovias e a crescente utilização do Porto de Santos. A cafeicultura protagonizou, inclusive, a substituição da mão-de-obra escrava pela do imigrante e do bóia-fria. Os cafezais do Vale do Paraíba, no oeste paulista, chegaram a absorver 600 mil escravos entre 1816 e 1850. Na segunda metade do século XIX, no entanto, começaram a completar a atividade, mensalistas, gerentes, administradores e tratoristas.

A política brasileira foi profundamente marcada pela oligarquia do café na Primeira República (1889 – 1929), a chamada “República do Café com Leite”, cujo poder era alternado entre paulistas e mineiros – entre 1894 e 1930, apenas dois dos 11 presidentes não eram desses dois estados.

A influência do grão tem ainda braços na produção cultural e artística, como aponta Alexandre Agabiti Fernandez, o editor da edição especial, “os ‘barões do café’ atuaram como mecenas da incipiente produção cultural paulista, até serem vitimados pela crise de 1929”. A elite cafeeira apoiou e financiou o Pensionato Artístico do Estado de São Paulo a Semana de Arte Moderna de 1929, que mudaria para sempre a concepção de arte no Brasil. Vale mencionar também que o Teatro Municiapal de São Paulo foi inaugura em 1911 pelo prefeito Antonio Prado, um cafeicultor poderoso.

Isso tudo por conta do luso-brasileiro Francisco de Melo Palheta que, em 1727, chamado para arbitrar uma disputa de limites entre duas colônias produtoras de café, a Guiana Holandesa e a Guiana Francesa, contrabandeava mudas do grão para suas fazendas no Brasil. Completa, a primeira edição de “Temas Brasileiros” é referencial, pois, traz também o histórico do café mundo, desde seu consumo em 1000 a.C. pela tribo oromos, que vivia na região onde hoje é a Etiópia (veja linha do tempo abaixo), 30 indicações bibliográficas fundamentais sobre a cultura do café, curiosidade sobre saúde e gastronomia e muito mais.

Sobre a História viva

Publicada desde 2003 pela Duetto Editorial, a História Viva nasceu da parceria com a centenária revista francesa Historia, uma das mais tradicionais do gênero. Todos os meses, os cerca de 38 mil exemplares vendidos (IVC) fornecem informação de qualidade nos artigos assinados por historiadores do mundo todo – parte do conteúdo é produzido por especialistas brasileiros. O grupo Conhecimento da Duetto Editorial publica ainda as revistas Scientific American Brasil, Viver Mente&Cérebro e EntreLivros.

A linha do tempo do café

1000 a.C. a 500 d.C.

A tribo dos oromos, que vivia no reino de Kefa (na atual Etiópia), come café como tira-gosto, moído e misturado com gordura e preparado em porções do tamanho de uma bola de golfe.

575 d.C.

São escritos os primeiros textos sobre o café no Iêmen, país que se tornaria o principal produtor e exportador até o século XVIII.

Cerca de 600

O café atravessa o mar Vermelho com mercadores e é levado para a Arábia (o atual Iêmen).

1453

Com a tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos, o café é difundido no mundo árabe. café foi incorporado pelos vienenses.

Fim do século XV e início do século XVI

Grãos de café são levados para a Turquia, o Egito e a Síria por peregrinos muçulmanos. Cafés no estilo árabe são abertos em Constantinopla, Damasco e outras cidades do Oriente Próximo, onde mercadores europeus, em especial venezianos, conhecem a bebida.

1616

Os holandeses começam a plantar café comercialmente, a partir de uma muda

obtida no Iêmen. Em 1658 (na última década do século XVII), cultivam café no Ceilão e na sua colônia de Java, nas Índias Orientais.

1680

Durante a expansão do Império Otomano, os turcos tomam a cidade de Viena. Com a invasão, o hábito de tomar

1706

As colônias holandesas se tornaram grandes fornecedoras de café para a Europa.

1714

O prefeito de Amsterdã presenteia o rei Luís XIV, da França, com uma planta de café.

1723

Gabriel Mathieu de Clieu (o. cial da Marinha francesa) leva três mudas da rubiácea, conseguidas nos Royal Botanical Gardens, numa viagem para a ilha caribenha da Martinica, onde uma delas se desenvolve.

1727

Chamado para arbitrar uma disputa de limites entre duas colônias produtoras de café, a Guiana Holandesa e a Guiana Francesa, o o. cial luso-brasileiro Francisco de Melo Palheta contrabandeia várias mudas de café para suas fazendas no Brasil.

1760

Depois de cultivada no Norte e Nordeste, a planta chega ao Rio de Janeiro, cidade que marca o ponto de partida da trajetória de sucesso do produto em terras brasileiras.

1790

Chega ao Vale do Paraíba paulista, onde encontra excelentes condições para o cultivo.

1820

O comércio mundial de café alcança a marca de 90 mil toneladas, das quais metade é produzida no Brasil.

1867

Abertura da São Paulo Railway (SPR), ferrovia ligando Santos a Jundiaí, que revoluciona o comércio brasileiro do café.

1870

Vitimado pela falta de técnicas de conservação do solo, o café do Vale do Paraíba entra em declínio. Ao mesmo tempo inicia-se a corrida dos grandes fazendeiros para uma nova região: o oeste paulista.

1901

O engenheiro Luigi Bezerra patenteia a primeira máquina de café de pressão com caldeira, aquecida a gás ou eletricidade. Nasce o café expresso.

1903

O importador de café alemão Ludwig Roselius aperfeiçoa o café descafeinado.

1920

São Paulo possui um bilhão de pés em produção, e a rica cidade de Ribeirão Preto passa a ser o maior centro produtor de café do mundo.

1929

A cafeicultura brasileira é abalada pela quebra da bolsa de Nova York, que derruba bruscamente os preços internacionais da rubiácea. Diante da crise mundial, produtores queimam milhões de sacas do grão, e plantações inteiras são destruídas.

1933

O italiano Francesco Illy patenteia a primeira máquina automática de expresso.

1961

Ernesto Valente, um fabricante italiano de máquinas de café, concebe o arquétipo das modernas máquinas de expresso.

Anos 1980

Minas Gerais assume a liderança na produção nacional de café, posto que é mantido até hoje. O café atinge novas regiões, como o oeste baiano e o centro-oeste.

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