Consumidores tradicionais continuam absorvendo maior volume das exportações
Consumidores tradicionais continuam absorvendo maior volume das exportações
Gerson Freitas Jr. | De São Paulo
O velho sonho de todo produtor de café, de que cada chinês tome ao menos uma xícara da bebida por dia, ainda está longe de virar realidade. Ao contrário do que se pode avistar em quase todas as commodities, da soja ao petróleo, o efeito da demanda chinesa sobre esse mercado ainda beira a irrelevância. Nos últimos anos, foram os consumidores tradicionais – Europa, Estados Unidos e Japão – os grandes responsáveis pelo aumento nas exportações brasileiras da mercadoria, que bateram recorde na temporada 2010/11.
De acordo com dados do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), entre 2002 e 2010, os embarques domésticos cresceram 23% para a Alemanha, 34% para o Japão, 36% para a Itália, 95% para os EUA e 130% para a Bélgica. Juntos, esses países representaram mais de 60% das 33 milhões de sacas exportadas em 2010, participação idêntica à observada no início da série. Embora as exportações globais tenham crescido apenas 8% nesse período, o volume carregado nos portos brasileiros cresceu em quase 80%, aproveitando-se das lacunas abertas por Colômbia e países da América Central, tradicionais fornecedores de café de qualidade.
Os embarques para a China praticamente dobraram entre 2002 e 2008, é verdade, mas ainda não passaram de 40 mil sacas, o que equivale a 0,1% das exportações totais ou a menos de um dia de consumo no Brasil. De acordo com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), os chineses devem importar cerca de 675 mil sacas de café na safra 2011/12. Não há estatísticas confiáveis, mas fontes do setor estimam que o consumo naquele país não passe de 1 milhão de sacas. Muito pouco para o país que se tornou o grande motor da economia mundial.
“Sempre tive os pés no chão em relação à China. É um país muito grande, com uma forte tradição de chá, e vai levar algum tempo até se introduzirem os valores e modas ocidentais”, afirma José Sette, diretor-executivo da Organização Internacional do Café (OIC). Segundo ele, o consumo naquele país ainda se concentra basicamente entre turistas e estrangeiros residentes.
A barreira cultural ainda é forte, especialmente entre os mais velhos. Em 2005, a Cooxupé e a belga CPE Exibition abriram duas cafeterias em Xi’An, cidade com mais de 5 milhões de habitantes, com o objetivo de promover a bebida, mas o negócio não prosperou e fechou as portas menos de dois anos depois.
“Não tínhamos conhecimento suficiente sobre o mercado chinês e fizemos uma escolha equivocada. Xi’An ainda é uma cidade muito fechada, deveríamos ter ido logo para Pequim”, explica Lúcio Dias, superintendente comercial da cooperativa. “Sou otimista em relação à China, mas esse é um namoro que vai demorar um pouco para fazer noivado”.
“Todo país que tem o hábito cultural de tomar chá acaba se adaptando ao café, como demonstra a experiência da Inglaterra e do Japão”, observa Eduardo Carvalhaes, do Escritório Carvalhaes. A aposta é de que os jovens urbanos, frequentadores de bares e restaurantes, irão, aos poucos, introduzir a cultura do café também nos lares. A rede de cafeterias Starbucks, que desembarcou na China há 11 anos, pretende chegar a 2015 com mais de 1,5 mil lojas abertas no país.
De olho nessa tendência, o diretor geral do Cecafé, Guilherme Braga, acredita que o consumo chinês pode chegar às 10 milhões de sacas anuais até o fim da década, superando o Japão. Mesmo assim, nada garante que o gigante asiático se tornará em um grande importador do Brasil. “Não se pode descartar que eles se tornem um produtor importante ou venham a estimular a produção nos países periféricos, como Vietnã, Indonésia, Laos e Tailândia”, alerta.