Cacife financeiro sustenta ofensiva comercial chinesa

Por: Valor Econômico

12/05/15


A China se lançou em uma impressionante ofensiva comercial simultânea na Ásia, África e América Latina, sem esquecer seu parceiro de Brics, a Rússia, na qual despejará US$ 25 bilhões. As relações de negócios com os países latino-americanos poderá se intensificar com a visita do primeiro-ministro chinês Li Keqiang ao Peru, Chile, Colômbia e Brasil na próxima semana. A China tem tudo o que se pode esperar de um vendedor de sucesso: tem excesso de mercadorias e dinheiro de sobra para financiar o comprador. Para o Brasil, pode ofertar seis dezenas de projetos de investimentos em infraestrutura, que podem consumir US$ 53 bilhões (Valor, 11 de maio). A fatia maior é destinada à área de energia, onde as empresas chinesas já ganharam várias licitações na transmissão e têm parcerias com a Petrobras.


A diplomacia chinesa se assemelha em vários aspectos à dos Estados Unidos quando buscava consolidar seu império mundial. A China consome enorme quantidade de matérias primas e alimentos, enquanto vende ao resto do mundo bens manufaturados e tenta subir na escala da tecnologia em toda sua cadeia produtiva. Tem meios financeiros para seduzir com suas ofertas países carentes de capital. A esse relacionamento, que lembra o de tipo colonial, ela agrega, como na África e em outras paragens, quando pode, o fornecimento da própria mão de obra e insumos necessários aos empreendimentos. A diferença essencial com os americanos, no caso, é que não utiliza a força das armas para abrir caminho para mercadorias e negócios. Há conflitos na Ásia, onde subjuga o Tibete e se envolve em disputas com o Japão por ilhas perdidas em sua insignificância.


A China é um parceiro pragmático, que não faz exigências políticas ou econômica para fechar negócios. Por outro lado, dificilmente aceitaria em suas parcerias mundo afora as mesmas condições restritivas que impõe a quem deseja produzir ou vender em seu país. O Brasil, por exemplo, maior exportador mundial de carne, até hoje não consegue comerciá-la diretamente com suas marcas, exceto por meio de Hong Kong. Há anos se discute a questão, sem resultado, com os líderes chineses.


A ofensiva chinesa tem vários motivos e um dos principais é a guinada em seu modelo econômico. Para depender menos de uma taxa de investimentos anômala de cerca de 50% do PIB e de exportações, Li Keqiang e o presidente Xi Jinping estão realizando reformas em direção ao maior poder de compra e ao consumo doméstico. A economia vem se desacelerando e há excesso de oferta em quase todos os setores da economia, de aço a imóveis. É isso que os chineses estão vendendo a bom preço mundo afora e cativando clientes.


A prioridade ao mercado interno que abriga a maior população do mundo, de 1,39 bilhão de pessoas, exige garantir suprimentos essenciais que a China não possui, em especial matérias primas e alimentos. Para isso, tem buscado garantir o fornecimento de bens essenciais a seu futuro. Emprestou mais de US$ 50 bilhões à Venezuela de olho no petróleo, com o qual serão pagos os créditos. Colocou US$ 20 bilhões na Argentina e mais dinheiro está a caminho em vários projetos, inclusive ferroviários (grandes consumidores de aço e das máquinas em superprodução na China). No Peru, investimentos chineses compõem um terço de todos os projetos de mineração em andamento, com projetos de US$ 19 bilhões (FT.com, 11 de maio).


Após exercer com habilidade e determinação seu grande poder de compras a China faz o mesmo agora na ponta vendedora. Com o Brasil, participa dos Brics e seu recém-criado banco. Mas os chineses não acreditam em nada parecido com aliança estratégica, dentro ou fora do bloco. A China quer ser superpotência global e segue seus próprios objetivos, alguns antagônicos com os do Brasil.


Em um momento em que, ao contrário da China, o Brasil precisa aumentar investimentos, as ofertas chinesas vêm em boa hora, desde que os projetos façam sentido para ambos. O Brasil tem sabido impor limites aos desejos da China.


O Brasil precisa de capital para investimentos em um ambiente no qual o BNDES está mudando sua política de financiamentos. Precisa também exportar bem mais. No primeiro caso, a China é um parceiro interessante, no segundo um rival poderoso. Um bom norte na conversa com os chineses seria atrair investimentos que aliasse as duas coisas – inclusive vender mais para a China.

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