Por DANA MATTIOLI CONNECT
Alguns analistas especulam que a compra do Tim Hortons é um esforço da 3G
Capital, que comprou o Burger King em 2010, para reduzir sua dependência da rede
de fast-food. AP
Será que a brasileira 3G Capital Management, dona da gigante americana de
fast-food Burger King Worldwide Inc., pode transformar uma rede canadense de
cafeterias e “donuts” num grande sucesso em lugares como Moscou e Pequim?
O Burger King está negociando a compra do Tim Hortons Inc. numa operação
estruturada como uma das chamadas inversões fiscais, em que a empresa
transferiria sua sede para o Canadá, uma estratégia que oferece vantagens
fiscais significativas. Embora o benefício fiscal tenha sido um fator importante
na iniciativa do Burger King, o negócio também é motivado por uma aposta ousada
na expansão internacional da rede de cafeterias, que hoje opera apenas em poucos
países fora do Canadá e dos Estados Unidos.
Os dois lados informaram, por meio de um comunicado no domingo, que estão
trabalhando num acordo que criaria uma nova empresa, confirmando uma reportagem
do The Wall Street Journal sobre as negociações. A aquisição criaria a terceira
maior rede de restaurantes de serviço rápido do mundo, com mais de 18.000
unidades em 100 países e um sistema de vendas amplo, incluindo franquias que
faturam US$ 22 bilhões por ano, afirmam as duas companhias.
Os investidores comemoraram a possível união das duas empresas ontem: as
ações do Burger King fecharam em alta de quase 20%, para US$ 32,40, elevando o
valor de mercado da empresa para cerca de US$ 11,4 bilhões. As ações do Tim
Hortons também tiveram forte alta, de 19%, para 82,03 dólares canadenses, o que
dá a ela um valor de mercado de US$ 10 bilhões.
Alguns analistas especulam que a aquisição representa um esforço da firma de
private equity 3G, que comprou o Burger King em 2010, de reduzir sua dependência
na rede de comida rápida, que vem enfrentando um enfraquecimento das vendas nos
EUA.
O acordo proposto “não tem nada a ver com as operações e sinergias. Isso é
apenas engenharia financeira”, diz Howard Penney, analista de restaurantes da
Hedgeye Risk Management.
No acordo, a 3G manteria uma participação majoritária na empresa
combinada. As negociações ocorrem num momento em que as transações de inversão
fiscal aumentam, mas enfrentam forte oposição em Washington porque elas são
vistas como uma ameaça aos cofres do governo americano.
Penney diz que não vê nenhuma vantagem estratégica no negócio, seja para o
Burger King ou para o Tim Hortons. Quando a rede americana de hambúrgueres Wendy
Co., que controlou o Tim Hortons de 1995 a 2006, tentou integrar as duas redes,
com restaurantes construídos lado a lado, a estratégia não conseguiu atrair
clientes. Em 2006, o Wendy’s desistiu do projeto e abriu o capital do Tim
Hortons.
A razão pela qual os investidores agora podem voltar a apoiar a ideia de uma
grande rede de lanchonetes americana controlar o Tim Hortons pode estar na
própria abordagem do Burger King para ganhar dinheiro. Sob o comando da 3G, a
rede tornou-se um franqueador que coleta comissões e royalty de seus franqueados
— não um operador de restaurantes.
A fusão com o Tim Hortons seria uma forma de relativo baixo risco de o Burger
King gerar caixa. Recentemente, o Burger King concluiu a venda de quase todos os
seus restaurantes próprios para franquias e deve adotar um modelo similar com o
Tim Hortons, cujo sistema é quase todo baseado em franquias.
O Burger King busca seguir o modelo da Yum Brands Inc., YUM +0.50%
proprietária do Pizza Hut, Taco Bell e KFC, tornando-se uma holding com marcas
de restaurantes que não têm relação entre si e que são administradas
separadamente, dizem pessoas a par do assunto.
O esforço para tornar o Tim Hortons um nome familiar fora da América do Norte
pode se dar em meio à intensificação da concorrência no segmento de café. A
Starbucks Corp. SBUX +0.89% vem acelerando sua expansão, especialmente na
Índia, enquanto o Dunkin’ Brands Group Inc. DNKN +0.59% tem se concentrado
em outras partes da Ásia.
O Tim Hortons possui cerca de 50 lojas no Golfo Pérsico e no Reino Unido. E
tem mais de 4.000 estabelecimentos na América do Norte.
“Com certeza estamos vendo muita concorrência no [mercado de] café, mas acho
que há demanda suficiente lá fora para múltiplos participantes”, diz R.J.
Hottovy, analista da Morningstar.
As negociações entre o Hortons, que tem sede na cidade de Oakville, Ontário,
e o Burger King começaram há alguns meses e um acordo pode ser anunciado ainda
esta semana, com a meta de concluí-lo até o fim do ano, diz uma pessoa a par do
assunto. Durante as negociações, o lado do Tim Hortons foi apelidado de “Red”
(vermelho), e do Burger King, “Blue” (azul), para refletir as cores do logotipo
de cada uma das redes.
Profissionais do setor de fusões e aquisições receiam que as inversões
fiscais que não forem concluídas este ano ficariam mais vulneráveis a medidas do
governo americano para limitar esse tipo de operação. Ainda assim, não há
garantias de que o negócio seja concluído ainda em 2014.
Ainda não está claro o valor que o Burger King pode pagar pelo Tim Hortons. A
intenção da 3G de manter uma fatia majoritária sugere uma alta quantia em
dinheiro, mas as regras do modelo de inversão exigem que os investidores do Tim
Hortons acabem com pelo menos 20% da empresa combinada, diz uma pessoa a par do
assunto, o que tornaria o negócio um pouco mais palatável aos reguladores.
O Burger King, que é sediado em Miami, foi fundado em 1954 e tem mais de
13.000 lojas em quase 100 países. Desde que foi comprada pela 3G, a rede tem
ampliado significativamente sua presença na Europa, Oriente Médio, Ásia e
América Latina.
(Colaboraram Liz Hoffman, Ben Dummett e Paul Vieira.)