03/11/2009 10:29
A produção alimentos pode diminuir nos próximos anos no Brasil dando lugar às culturas voltadas para a produção de agroenergia
Esta é uma das conclusões de um estudo feito por especialistas em zoneamento climático da Embrapa e da Universidade de Campinas (Unicamp) sobre os efeitos do aquecimento global nas culturas agrícolas.
Segundo Eduardo Delgado Assad, pesquisador da Embrapa Informática Agropecuária e um dos coordenadores da pesquisa, isto pode acontecer porque as culturas mais ligadas à alimentação são mais vulneráveis aos efeitos do aquecimento global do que culturas usadas para a produção de energia, como a cana de açúcar.
Segundo Assad, o café, junto com a soja e o milho, são as culturas mais vulneráveis aos efeitos do aquecimento global. Para o café, a principal causa da vulnerabilidade é a possibilidade de abortamento da florada devido ao déficit hídrico e ao calor intenso. Porém, ele afirma que este cenário pode ser modificado com trabalhos de biotecnologia e melhoramento genético, tornando as plantas mais tolerantes a essas ameaças.
Resultados da pesquisa
A pesquisa estudou, a partir de dois possíveis cenários, um prevendo o aumento de temperatura pessimista, variando entre 2ºC a 5,4ºC, e outro um pouco mais otimista, prevendo aumento de temperatura entre 1,4ºC e 3,8ºC, os impactos deste aumento em várias culturas agrícolas, como o algodão, arroz, café, cana-de-açúcar, feijão, girassol, mandioca, milho e soja. Os cenários foram montados para os anos de 2010, 2020, 2050 e 2070 tomando-se como base o Zoneamento de Riscos Climáticos de 2007 e o mais recente relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC).
Para Assad, o aumento de temperatura irá fatalmente ocorrer. Não se sabe, apenas, em que nível. Isso provocará uma alteração profunda na geografia da produção agrícola no Brasil, acarretando na migração de plantas para regiões que hoje não são de sua ocorrência em busca de condições climáticas melhores. No caso do café, que, historicamente, sempre encontrou condições ótimas de desenvolvimento na Região Sudeste do País, ele terá que se adaptar às novas características climáticas dessas regiões ou deverá migrar para latitudes maiores, podendo inclusive, ser produzido na região mais ao sul do Brasil.
Essa análise, segundo o pesquisador, refere-se apenas ao café arábica. Com o café conilon este problema não acontece, já que esta espécie é mais robusta, ou seja, mais resistente, e adaptada para produção em regiões de clima mais quente.
Para Eduardo Assad, as soluções para a adaptação da planta ao clima mais quente já estão sendo buscadas pela pesquisa. Os estudos em melhoramento genético do café, onde é feito o cruzamento entre as espécies arábica e conilon, poderão criar cultivares mais robustas e capazes de suportar temperaturas mais altas. Existem, ainda, pesquisas de campo para o uso do sombreamento do cafezal com frutas ou espécies madeireiras, o que é muito bom, já que, neste caso, os produtores podem tirar renda tanto do café quanto da outra espécie cultivada. Essas alternativas e a adaptação do nosso sistema de produção para os cenários que se mostram no futuro é que vão possibilitar a permanência do café em regiões onde ele está adaptado atualmente. “Isso mostra que nós temos domínio tecnológico capaz de superar esse aquecimento”, finaliza Assad.
Programa de pesquisa em café
O programa de pesquisa em café brasileiro, conduzido pelas instituições consorciadas e coordenado pela Embrapa Café, tem priorizado o desenvolvimento de estudos voltados a minimizar os efeitos que o calor e a insolação causam no café. Conforme Mirian Eira, gerente adjunta técnica da Embrapa Café, nos últimos anos, materiais genéticos de grande potencial e maturação diferenciada foram lançados e estudos foram realizados para a seleção de cultivares adaptadas à seca e aos extremos térmicos.
Além disso, estudos voltados à irrigação do cafeeiro reduzem o risco de vulnerabilidade climática da planta. A tecnologia de irrigação tem evoluído tanto no desenvolvimento de novos equipamentos e sua aplicação racional, como em novas práticas culturais, com estresse hídrico controlado aliado à adubação balanceada.
Por fim, práticas de manejo, como o adensamento das plantas e a arborização da plantação, são permanentemente transferidas aos agricultores, de forma a atenuar os efeitos do aumento da temperatura nas regiões produtoras de café. Além disso, segundo Eira, outros projetos nas áreas de biotecnologia, agroclimatologia e fisiologia do cafeeiro estudam as características do clima e das plantas, buscando como resultado mitigar essas condições adversas e manter o Brasil na liderança da produção mundial de café.