Por MARLI OLMOS DE SÃO PAULO
Aparentemente, quem comanda uma fabricante de papel e celulose não teria nada para aprender com uma rede que vende café. Não é o que pensa Antonio Maciel Neto, presidente da Suzano, que costuma aplicar em cada nova empresa onde trabalha tudo o que aprendeu nas anteriores. Como faz todos os anos, Maciel passou parte de janeiro num curso da Harvard Business School. Foi ali que teve contato com uma experiência da Starbucks, famosa rede de cafés americana. Nada menos que 180 presidentes de diversos tipos de empresas do mundo debateram o caminho que a rede deveria seguir para acabar com as filas em suas lojas.
Ao final optou-se por investir em aumento de pessoal na rede, e não por diminuir as opções de cafés, outra das propostas. Mas o que importou para Maciel, e a todos que, como ele, se debruçaram sobre um tema que não tinha nada a ver com as empresas que comandavam, foi o aprendizado. “Enquanto você está lá avaliando casos, pensa no que fazer na própria empresa”, conta ele, que, de certa forma, também carregou para a Suzano, onde começou a trabalhar em junho de 2006, muito da experiência acumulada em sete anos de comando da Ford no Brasil e na América do Sul.
Da mesma forma, o executivo levou para a Ford e as companhias por onde passou anteriormente, como Cecrisa e Grupo Itamarati, métodos herdados dos tempos em que se dedicava ao esporte na juventude: o trabalho em equipe. “Quem ganha o jogo é o time, ninguém faz nada sozinho”, diz. “É preciso ter atenção na organização, identificação de talentos, definição de metas e de plano de trabalho.”
Os cursos em Harvard também servem para ajudar a decifrar o ambiente globalizado. A competitividade mundial preocupa Maciel. Para ele, diferenças estruturais dão à China larga vantagem em relação ao Brasil. A complexidade tributária é a principal. “Na China há dois impostos, o de consumo e o de renda. Por isso, lá uma empresa só precisa de duas ou três pessoas para tratar da questão, enquanto que no Brasil as grandes companhias só conseguem trabalhar se tiverem uma equipe de 100 funcionários só para entender os impostos”, compara.
Na visão de Maciel, outro fator “dramático” é o custo de capital. Ele cita a indústria de papel. “Uma máquina custa em torno de US$ 400 milhões e é preciso comprar a terra e passar oito anos, em média, plantando a floresta”, detalha. Associadas ao câmbio, essas questões estimulam a importação. O executivo conta que o Brasil já importa 30% do papel cuchê que usa.
Além disso, os produtores asiáticos estão competindo com o Brasil nos mercados da Europa e dos Estados Unidos. Muitas vezes usando a celulose comprada no Brasil. Para ele, a questão do câmbio resultado do nosso próprio sucesso”, diz tem de ser trabalhada. A Suzano obtém nas vendas ao exterior 50% da receita.
Nem todos achariam fácil sair de uma empresa que vende um produto tão charmoso como é o automóvel e adaptar-se numa companhia de papel. Até a filha, de 12 anos, se queixa: “€œPapai, prefiro a Ford porque a gente usava carros diferentes no fim de semana e eu tinha coisas para contar. Eu vou falar o que de papel para as minhas amigas? Papel é tudo igual”.
Mas, com a mesma habilidade com que aprendeu tudo sobre carros “produto desconhecido até ingressar na Ford, em julho de 1999, Maciel esbanja conhecimento das características técnicas de cada papel. Acho que o executivo tem que gostar do produto, porque quem paga nossos salários são os clientes, é preciso entender o jogo”, resume ele, que não passa uma semana sem falar com clientes, fornecedores e analistas para continuar aprendendo, sempre.
ANTONIO MACIEL NETO Idade: 49
Formação: engenharia mecânica pela UFRJ
Primeiro trabalho: engenheiro da Petrobras, em 1980
Principais cargos ocupados: presidente da Cecrisa; do Grupo Itamarati; da Ford Brasil e América do Sul; da Suzano (atual)
Horas médias de trabalho/dia: entre 12 e 14
Hobbies: esportes, leitura e pecuária
Explicar a Lei Kandir para estrangeiros é piada. Uma vez tentei explicar por que as empresas não recebem de volta os créditos de ICMS que recolhem na exportação. Eles me diziam: isso está nos recebíveis; é lei. Está, eu dizia. Então vamos receber? Depende, eu respondia. E eles: Ah, então isso está na Justiça? Não, eu dizia. Não há questionamento jurídico? “€” retorquiam. Não, o problema é político. Aí eles ficavam bravos. Como?! Não vamos receber nada? Eu tentava explicar: Algo podemos receber. Em São Paulo dá para vender os créditos entre os fornecedores, mas em outros estados é diferente. E eles: me escreve aqui o que está na lei. Eu escrevia: pela lei, quando exportamos, recebemos de volta o ICMS. A lei é claríssima. Não se exporta imposto. E eles: se está na lei, como não vamos receber? No ano passado não recebemos? Eu: um pedacinho. E este ano? Talvez um pouco mais… Os caras ficam olhando para você e dizem: isso é conversa de brasileiro.”
Maciel: A principal diferença estrutural que dá vantagem à China é a simplicidade tributária”