15:25 25/02
Analistas em nutrição e bioquímicos da Bolívia puseram hoje em xeque os benefícios de dar coca no café da manhã para as crianças do país, como disse o chanceler David Choquehuanca, devido ao alto conteúdo de alcalóide na folha.
Quarta-feira passada, Choquehuanca propôs no Congresso Nacional que essa planta, da qual se extrai a cocaína, seja incluída no café da manhã que os municípios fornecem às escolas para poder aproveitar seu alto conteúdo de cálcio e fósforo, com o argumento de que o nível é bem maior do que o encontrado no leite e no peixe.
A proposta de Choquehuanca foi recusada pelo presidente do Colégio de Nutricionistas da Bolívia, Silvia Brun, que declarou à EFE que, efetivamente, a folha contém hidratos de carbono, ferro e fósforo, mas que não é apta para o consumo humano.
A profissional não ocultou seu reconhecimento pessoal ao caráter “sagrado” da folha, pelo uso ancestral desde a época dos incas, e também que está provado que contém os nutrientes mencionados.
“Não podemos negar as propriedades da coca, mas não para recomendar para o consumo para crianças”, disse Brun ao especificar que a ciência comprovou que a questionada folha, como qualquer droga, produz seus efeitos de inibição do apetite e também da fadiga.
Brun resumiu que a coca será perigosa caso seja utilizada na dieta diária dos estudantes.
Já a bioquímica Nancy Siles concordou que o vegetal possui características alimentícias e especialmente medicinais, mas que seu componente principal é um alcalóide, a cocaína, que inevitavelmente produz efeitos contrários aos desejado pelo chanceler.
Siles, que é secretária-geral do Colégio de Bioquímica e Farmácia da Bolívia, explicou que o mais importante para o organismo humano, em particular nos primeiros anos, é a ingestão de leite, frutas e verduras.
A profissional recomendou ao Governo dar às crianças e adolescentes em idade escolar alimentos que contenham vitaminas, minerais e carboidratos em quantidades adequadas aos requerimentos do organismo.
A especialista contou para a EFE uma constante sugestão dada aos seus clientes para que, “em vez de pão, seria melhor uma maçã, um ovo ou um banana, porque ali se extrai o que o corpo das crianças precisa”, disse Riles.
A nutricionista também manifestou que as famílias bolivianas deveriam agregar castanha à dieta infantil, produzida na região amazônica do norte boliviano, por ser um alimento “completamente assimilável” pelo organismo.
Hoje, o Ministério da Saúde entregou um documento onde se indica que a coca, em relação a calorias, é mais rica que a batata, a mandioca e a quinua (tipo de cereal), e quanto a proteínas, supera duplamente ao milho, o trigo, a kiwicha (uma erva andina), a quinua, a batata e a mandioca”.
O relatório, com dados da Organização Pan-americana da Saúde, mostra que em cada 100 gramas da coca seca, existem 2.097 mg de cálcio, 9,8 mg de ferro, 363 mg de fósforo e valores menores das vitaminas A, C, E, B1, B2 e niacina.
Além de propor o consumo em massa da coca, o atual Governo do presidente Evo Morales começou gestões para conseguir a descriminalização mundial do cultivo da planta e do comércio da folha.
A produção da planta na Bolívia se realiza na região de Yungas, reconhecida pela lei para o cultivo do arbusto, até 12.000 hectares, e na de Chapare, onde as autoridades só admitiram 3.200 hectares no máximo.
No Chapare, berço sindical do presidente Morales, está concentrado o esforço da Polícia e do Exército, com a ajuda internacional, para eliminar a atividade “cocalera” junto ao combate ao narcotráfico desde meados da década dos 80.