MÔNICA BERGAMO / 02/03/2008
Mônica Bergamo
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Eduardo Knapp/Folha Imagem
Balcão do café, decorado com cadeiras de Philippe Starck, no lounge com cinco jogos de sofás e TVs de plasma do Ateliê Oral; lá, servem-se pães e sorvetes
O repórter Paulo Sampaio foi a uma consulta na clínica de odontologia mais suntuosa de SP. Saiu de lá com um orçamento quatro vezes mais caro do que o de um dos maiores especialistas da área no Brasil
Sorriso amarelo
Trinta e cinco mil, novecentos e cinqüenta reais. Quando um dentista apresenta um orçamento desses, dizendo que seu sorriso vai ficar melhor, a primeira reação é levar a mão à boca para verificar se os dentes ainda estão ali. O susto só não é maior porque, no caso, a notícia é acompanhada de slides, moldes e garantias de que tudo vai acabar bem. “Não tem como ficar feio. Seu caso é corriqueiro para a gente”, diz o dentista Marcelo Kyrillos.
A clínica de Kyrillos tem 1.000 m2 e funciona no prédio onde era a butique Daslu Homem, na Vila Nova Conceição. O nome sugere um híbrido dos dois ambientes: Ateliê Oral. “Queremos que aqui seja mais do que um consultório, e o cliente vai perceber isso já no nome”, diz a responsável pelo relacionamento com o cliente, Carla Cavalcante.
Os 12 consultórios futuristas remetem a um episódio de “Guerra nas Estrelas”. O paciente até se esquece de que aquilo é uma clínica, sentado em um dos sofás dos cinco jogos que decoram o lounge iluminado naturalmente por uma enorme clarabóia. “Mantivemos a árvore [abaixo da clarabóia] e a levamos em consideração na criação do logo [um brasão]”, diz Carla.
No mesmo ambiente há uma filial do café Suplicy, com cadeiras de Philippe Starck, em que se servem como cortesia cafés, pãezinhos e até sorvetes. Ao lado estão as salas de massagem (onde se aplica a “técnica linfo-energética de base chinesa, para cicatrizações, edemas ou dores”); as salas VIP, com ducha (“para clientes que vêm de fora de SP”); e, próximo ao primeiro consultório, um estúdio de fotografia. “Realizamos um ensaio fotográfico ao fim do tratamento, para que a transformação seja um divisor de águas na vida do paciente”, diz Mariana Capatto, ex-assessora do cabeleireiro Wanderley Nunes e agora encarregada do marketing do “ateliê”.
Até o momento de se sentar para ser examinado, o paciente já foi atendido por duas recepcionistas, um garçom, uma auxiliar, uma RP e a especialista em marketing: como a estrela de uma comédia romântica dos anos 50, o dentista surge quando todo o elenco já está em cena. Doutora Tatiana Welker, 25, é bonita, sorridente e está maquiada com uma espessa camada de base em tom bronze. Conta que era modelo e promoter e foi trabalhar na clínica depois de conhecer os donos em uma festa na boate Disco. “Fiz o aniversário de um deles, que era meu amigo na faculdade, e conheci os “Marcelos”.”
Os “Marcelos” Kyrillos e Moreira, ambos com 41, são os sócios precursores da clínica, que abriu há cerca de 20 anos, em Diadema, migrou para o Brooklin e há dois meses está na Vila Nova Conceição. Depois de examinar os dentes do repórter, que não se apresentou como tal, eles dizem que sua “saúde oral” é muito boa: aí, abrem um livro de capa dura com fotos de clientes lindas, sorrindo “antes e depois”, em transformações impactantes.
Na lateral da cadeira, há uma tela de computador que o paciente pode acessar (de boca aberta, enquanto o dentista explora um dente com a broca) por um teclado colocado em seu colo. O fundo de tela são pacientes famosos: estão lá Flávia Alessandra, Daniella Cicarelli e Guilherme Berenguer. “É importante a visibilidade para nós”, explica Mariana.
O preço da primeira consulta é R$ 450,00. Na segunda, eles apresentam o orçamento e dizem como será o tratamento: ao todo, diz Kyrillos, vão mexer em oito dentes; o repórter será atendido por seis dentistas. O primeiro, em uma consulta de duas horas, vai ministrar uma “aula de fio dental” e escovação para conservação das facetas; o segundo fará uma plástica para alinhamento da gengiva com os dentes. Enquanto cicatriza, o terceiro vai proceder a um clareamento dental. Quarto dia, implante: dente e raiz serão removidos para a instalação de uma espécie de porca onde se encaixará o parafuso com o implante. Penúltimo dia, o “test-drive”: o paciente sai para uma volta com o provisório. Está com o “corredor bucal” (laterais) preenchido. “É a hora em que você, Paulo, vai ver se ficou satisfeito. A gente verifica estética, fonação (o paciente pode passar a falar com a língua presa); mastigação (por causa do aumento dos dentes).” Sexto dia, finalização (o definitivo).
Dá pra fazer só uma parte? “Não. Só o clareamento, por exemplo, não resolve o problema da harmonia”, diz Kyrillos. Mas dinheiro não é problema. Carla explica. “A gente é que nem as Casas Bahia, divide em quantas parcelas o paciente quiser.” O repórter sorri amarelo, mal recuperado do baque. Prefere deixar como está.
TESTE
Segunda opinião
Na mesma semana, no consultório de um dos precursores da odontologia estética no Brasil, Mário Limberte, 67, há 45 formado pela USP, o repórter recebeu um orçamento quase quatro vezes mais barato. “Se você fosse alguém muito exposto, como um ator, aí eu pensaria em colocar faceta em pelo menos seis dentes da frente; mas, no seu caso, no máximo eu aumentaria os frontais, para manter a expressão jovem.” Limberte não garante perfeição da cor com o clareamento.
“A partir dos 45 anos, os dentes estão mais acinzentados e não reagem tão bem”, diz o dentista, cujo consultório é decorado com sofás de corvim muito gasto e quadros de passarinhos desbotados. Preço com facetas: R$ 9.400. Aumento dos incisivos centrais superiores e clareamento: R$ 5.000.