Por Isabelle Tourne
NOVA YORK, 23 Mar (AFP) – A cadeia norte-americana de cafeterias Starbucks tentou, nesta semana, recuperar a confiança de seus acionistas e defendeu uma estratégia agressiva de crescimento. A rede de lojas parece atravessar uma crise existencial, principalmente depois da publicação de um comunicado interno por parte de seu presidente. Howard Schultz, emblemático dono da marca, reiterou nesta semana, durante assembléia anual do grupo, que a Starbucks espera abrir, em quatro anos, pelo menos 10.000 cafeterias no mundo. Numa previsão em longo prazo, esse número chega a 40.000, ou seja, eles pretendem abrir mais lojas do que as que o McDonalds tem atualmente. No Brasil, a cadeia já conta com três cafeterias, todas em São Paulo. As duas primeiras foram inauguradas em dezembro do ano passado, ambas no Shopping Morumbi. A terceira foi aberta no último dia 20. O homem que anunciou tal previsão de ampliação da rede foi o mesmo que gerou especulações sobre uma possível desaceleração do crescimento do grupo. Em meados de fevereiro, Schultz redigiu uma nota na qual chamava a atenção para a possibilidade da Starbucks ter perdido sua alma, justamente pelo crescimento rápido da cadeia. O comunicado inquietou Wall Street e contribuiu para que as ações caíssem 8% em dez dias.
Na nota de circulação interna, Howard Schultz alertava para o risco de “diluição” da experiência Starbucks e para o perigo de “banalização da marca”. Schultz parecia buscar, neste comunicado, um resgate de seu próprio êxito: em menos de vinte anos, a pequena cadeia de seis cafés em Seattle virou líder mundial do setor, com 13.000 negócios distribuídos em 38 países.
A inquietação de Schultz está nos rumos que a empresa tem tomado em nome da necessidade de crescer. Para ganhar em produtividade, por exemplo, passou a usar uma legião de máquinas automáticas de café. Com elas, o consumidor é privado da “mensagem visual” que representa preparar o café expresso manualmente, lamentou o presidente em seu texto.
Além disso, as lojas se uniformizaram e “já não têm a alma do passado”. O café vendido não é mais moído na loja, daí “a perda do aroma, que era, talvez, o sinal não-verbal mais potente que tínhamos em nossos negócios”, afirmou.
O resultado dessas adaptações aos novos tempos é que a Starbucks é comparada com freqüência com o símbolo da globalização, a cadeia de lanchonetes McDonalds. Por isso vem, sendo muito criticada, como no site www.
ihatestarbucks.com (que pode ser traduzido por “www.odeiostarbucks.com“).
A Starbucks assumiu recentemente a imagem de um gigante exportador dos pequenos produtores, ao ser acusada pelo governo etíope de dificultar acordo sobre a propriedade de algumas marcas de café com os agricultores.
Outra dificuldade por que passa a Starbucks é o fato das cadeias de fast food como McDonalds ou DunkinDonuts terem demonstrado competência em ocupar seu lugar no mercado ao vender café de “alta qualidade”.
Focar-se em seus valores e na atmosfera artesanal do início para conservar seus clientes ou apostar em um crescimento rápido para atrair os investidores? A Starbucks parece estar enfrentando um dilema cruel.
“Suas decisões também se tornaram difíceis porque a loja penetrou no mercado em massa”, opinou Bryant Simon, professor de história da Universidade de Temple (Filadélfia), que está escrevendo o livro “Consuming Starbucks” (Consumindo Starbucks).
“Alguns clientes só querem que uma boa xícara de café que seja servida rapidamente, enquanto outros estão atraídos pela comodidade do lugar. Todos esses interesses não são forçosamente conciliáveis”, prosseguiu.
Na assembléia-geral do grupo, Howard Schultz julgou oportuno se desculpar diante dos acionistas porque, pela primeira vez na história da Starbucks, a ação não se valorizou de um ano para outro.
Em crise ou não, fato é que em 14 anos a ação da Starbucks foi valorizada em aproximadamente 6000%.