04/07/09
Produtores de cana, de café, de laranja e os pecuaristas ainda precisam de apoio, como o dado aos veículos
DUAS OBVIEDADES são repetidas todos os dias em comentários sobre a crise financeira global: a primeira é que diferentes setores foram afetados diferentemente, e, em cada setor, as empresas foram também atingidas de maneira diversa; a segunda é que ninguém sabe quando ela vai acabar. Pode-se acrescentar que ninguém sabe como ficarão os limites das atividades financeiras no mundo, depois que a crise tiver terminado.
Apesar disso, são cada vez mais frequentes as opiniões de que o pior já passou, embora não sejam raros os mais pessimistas.
Também parece certo que os países emergentes -entre os quais o Brasil, com um moderno e sólido sistema financeiro- sofrerão menos do que os países desenvolvidos. No nosso caso, há uma ironia: as altas taxas de juros viraram um benefício, porque podem ser reduzidas, ajudando a retomada dos investimentos, enquanto os países com juros civilizados pouco podem fazer nessa rubrica… E o agronegócio, duramente atingido, vai procurando seus caminhos de saída.
Nos primeiros cinco meses deste ano, os preços agrícolas, em dólar, despencaram em relação ao mesmo período do ano passado. A soja, nosso principal produto de exportação, caiu 13%; as carnes perderam 17,9% do valor; os produtos florestais baixaram 23%; o café caiu 19,4%; os sucos de frutas perderam 12,6%; o milho, 23,9%; o etanol, 9,7%, e assim por diante.
A exceção foi o açúcar, que teve aumento de 12%, em dólar, graças à queda de produção na Índia, que de exportador passa a importador. Mas é um doce muito fugaz, porque já no ano que vem aquele país exportará de novo.
Com tudo isso, mais o estreitamento dos mercados externos e mais a redução da oferta de crédito para exportação, o agronegócio ficou mais dependente do mercado interno, que, felizmente, sofreu menos até agora.
Mesmo assim, a participação do agronegócio nas exportações brasileiras nos primeiros cinco meses aumentou de 37,5% para 43,4%. Isso mostra que o setor vem aguentando mais a crise do que os outros setores da economia. Explica-se: as exportações de soja, graças à demanda chinesa, aumentaram 20% em volume no período, e as de açúcar cresceram 41%. Milho e algodão, em menor proporção, também ajudaram nesse crescimento.
Mas a crise continua: os setores sucroalcooleiro, de frigoríficos de bovinos, de sucos e de café vêm sofrendo bastante. Os plantadores de cana, de café, de laranja e os pecuaristas estão muito descapitalizados, e com preços abaixo dos custos. Haverá nessas áreas, ainda, muitas perdas e uma provável concentração no setor industrial.
O governo lançou, no dia 22 de junho passado, o Plano de Safra, com pontos positivos. A oferta de crédito teve crescimento de 37,8%, significativo diante da crise financeira global. A classe média rural foi atendida com aumento ainda maior do que o total, com 42,5%. A preocupação com a sustentabilidade foi evidenciada com o aumento de 50% para programas como a integração lavoura-pecuária, os cuidados com o solo e a adequação às leis ambientais. O cooperativismo foi bem tratado, com R$ 4 bilhões de crédito, ante R$ 1 bilhão no ano passado.
Se esse dinheiro chegar ao campo, como se espera, poderemos ter no próximo ano uma boa safra. E, se a crise entre os emergentes diminuir, teremos novos e maiores mercados. Mas os setores mais apertados ainda precisam de apoio forte, como já foi dado à indústria automotiva e à de construção civil.
ROBERTO RODRIGUES, 66, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp – Jaboticabal, foi ministro da Agricultura (governo Lula). Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.