Geraldo Mesquita Júnior*
Durante a campanha de 2004, sempre afirmei que a quase totalidade das emendas pessoais que me caberiam incluir no orçamento de 2005 seriam destinadas às atividades no campo. Relaciono, a seguir, as principais razões que me levaram a tomar essa decisão.
Todos sabem que os bons resultados da economia brasileira em 2004 se devem, em grande parte, às atividades agro-pecuárias. O país se tornou o segundo maior produtor e exportador de soja do mundo, o maior produtor de açúcar, o maior exportador de carne bovina e de frangos,além de manter sua posição de maior produtor de café. Isto foi possível porque houve financiamento suficiente da produção agrícola,e os preços dos produtos se tornaram atraentes.
O resultado dessa valorização das atividades agro-pecuárias é que a população das cidades brasileiras encolheu 27% nos últimos dez anos. As maiores capitais brasileiras, como Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre e Recife foram as que menos cresceram. O que provocou essa mudança? As pessoas foram atrás de melhores condições de vida, possibilidade de trabalho e produção, locais onde não há violência, e onde é possível criar a família e viver com segurança e conforto, sem medo de assaltos e ameaças.
Em resumo, o campo hoje sustenta o Brasil. No Acre, não deveria ser diferente. Entretanto, hoje importamos quase tudo. Já não somos capazes de produzir nem mesmo os alimentos básicos para o nosso próprio consumo. Por que isso? Basicamente porque o pequeno e o médio agricultor, ao contrário do que acontece em quase todo o Brasil, não têm tido suas reivindicações atendidas. E sem eles é impossível tornar o Acre auto-suficiente na produção de alimentos.
Os grandes proprietários não produzem grãos, a não ser para o próprio consumo,e a grande propriedade se ocupa basicamente da pecuária, seguramente a única atividade econômica de certa expressão na nossa terra. A borracha e a castanha já não representam para a nossa economia o que significavam antigamente, restando a exploração e a comercialização da madeira como outra atividade econômica de certa importância, sem que no entanto agreguem riqueza para o Estado, pois cerca de 80% da extraída é exportada quase bruta, sem maior beneficiamento. Se não mudarmos essa situação, corremos o risco de passarmos mais cem anos enriquecendo meia dúzia de beneficiários e empobrecendo grande parte da nossa população. Lembro, aqui, que há cem anos exportamos borracha praticamente bruta, fruto do trabalho escravo dos nossos seringueiros, sem termos conseguido fabricar sequer essa borrachinha de amarrar dinheiro.
E neste caso, continuaremos a ser o Estado dos que vivem do contra-cheque, do comércio, da prestação de serviços e da exportação de produtos vegetais em estado bruto. Para mudarmos esse quadro temos que investir maciçamente no campo. É no campo que poderemos gerar riquezas a serem apropriadas inclusive pelos que moram nas cidades. Exemplo: se bem disciplinada, a exploração madeireira poderá resultar no surgimento de uma forte indústria de beneficiamento com vistas à produção de móveis, compensados, aglomerados e diversos artefatos, com a geração empregos. É claro que algo nesse sentido já ocorre, mas de forma incipiente. O que precisamos é dar escala na atividade, para que milhares de jovens de Rio Branco e dos demais municípios possam ter a perspectiva de participar do processo de desenvolvimento sustentado. Mas para isso, necessitamos de um forte programa de formação de mão-de-obra, praticamente inexistente na atualidade.
Outro exemplo: nossa macaxeira é de excelente qualidade. Havendo planejamento e parceria do Estado com os produtores, além da boa farinha, poderemos dar ensejo ao surgimento de uma ou várias fábricas de fécula, subproduto de larga utilização nas indústrias de cosméticos e petrolífera, dentre outras. Nossas frutas, como o milho hoje importado de Rondônia são produtos que, incentivados, podem fazer surgir fábricas e mais fábricas de doces, polpas, fubá, etc. Mesmo com o plantel de gado que temos ainda não fomos capazes de instalar fábricas de laticínios ou de calçados e artefatos de couro. Quase nada existe nesse sentido. Poderíamos ter várias Miraginas produzindo biscoitos da nossa castanha, além inúmeros outros produtos.
O que quero demonstrar é que, à semelhança do que ocorre em quase todas as outras regiões do país, em especial no centro-oeste e no norte, é no campo que podemos fortalecer a nossa economia e gerarmos a riqueza que possa ser distribuída e apropriada de forma mais democrática. Em benefício de todos.
É no campo que temos que investir, como estão fazendo as regiões de ocupação pioneira, a exemplo de Mato Grosso, Rondônia, Amapá e Rondônia. Necessitamos de acesso para transportarmos a produção rural. Carecemos de assistência técnica e de oportunidades para os jovens. Benefícios que atualmente se restringem aos centros urbanos precisam estar ao alcance de todos, como escolas, hospitais, centros de assistência e lazer. Só quem vive no interior conhece o estado deplorável dos ramais e estradas que dificultam o acesso e impedem a circulação dos produtos. Os postos de saúde,onde existem, são em regra desconfortáveis, desaparelhados e não contam com médicos, enfermeiros e na maioria das vezes faltam medicamentos. Isto, quando não estão fechados. Sistema de transporte público não há. Afinal, por que abandonamos os que vivem na zona rural e lhes negamos assistência adequada?
Para completar esse quadro de abandono, não existem parcerias entre o poder público e os pequenos e médios produtores. Não estamos pedindo que o Estado vá para o interior substituir os que até hoje enfrentam o desafio de produzir. Pedimos apenas que o poder público atue como indutor da atividade produtiva, orientando e proporcionando crédito, assistência e infra-estrutura, para que todos possam produzir e comercializar seus produtos, como estão fazendo outros Estados que já respondem por boa parte da produção nacional, atendendo o mercado interno e fortalecendo o comércio exterior do país. Extrativismo, pecuária, agricultura e agro-negócio são atividades que podem co-existir e se complementar. Se os poderes públicos fizerem a sua parte, planejando e orientando as atividades rurais, priorizando parcerias com os pequenos, em breve seremos auto-suficientes na produção de alimentos básicos, podendo sonhar com uma agroindústria forte, e com a participação de todos os acreanos, sem exclusões, no processo de desenvolvimento, desde que não percamos de vista que toda a riqueza gerada em nosso solo deverá ser melhor distribuída.
É por isso que resolvi destinar o grosso das minhas emendas pessoais para atividades no campo. E assim farei até o final do mandato.
* Geraldo Mesquita Júnior é senador da República pelo Acre.