Luiz Moricochi
Eng. agrônomo – consultor
Recentemente participamos de um encontro para discutir o futuro do mercado de café promovido pela Minasul de Varginha, MG. Foi uma reunião muito proveitosa, com intensos debates, graças ao elevado nível e grande interesse manifestado pelos cafeicultores presentes à reunião. Entre vários gráficos, chamou particular atenção o que apresentamos abaixo:
Nesse gráfico, a linha em verde corresponde aos preços de café em 2002, mês à mês; a vermelha aos preços em 2005 e azul aos observados em 2006
De imediato chama atenção no referido gráfico, que os preços em 2005 e 2006 estão bem acima dos preços de 2002, considerado o pior ano em período recente. De fato, na média, considerando os preços compostos da Organização Internacional do Café- OIC, a libra peso desse produto caiu para 48 cents em 2002, à partir de então teve início o processo de recuperação, atingindo 90 cents em 2005 e 95 cents em 2006, ou seja, um aumento de quase 140% no período. Mas o que hoje todos querem saber , sobretudo os produtores, é o que pode acontecer n o mercado daqui para frente, ou seja, a linha azul do gráfico ( preços de 2006), terá trajetória ascendente? Tudo indica que sim, pelo menos quando cotado em moeda americana, sendo que em janeiro de 2007 as cotações subiram para 106 Entretanto, em moeda dos próprios países produtores, o ritmo do crescimento dos preços pode ser diferente, pois vai depender também da evolução da taxa de câmbio em cada país produtor. No Brasil, por exemplo, os preços do café em dólar subiram mais 70% em relação a 2004, enquanto que em reais apenas 20%. Daí se pode deduzir a dificuldade em se prever preços futuros a nível de produtor, pois os mesmos vão depender também da política cambial praticada pelo governo
Afora fatores exógenos, (câmbio e taxa de juros, por exemplo) sobre os quais o setor não tem qualquer influência, analisemos a conjuntura atual sob o ponto de vista d os fundamentos de mercado, que devem ser o foco principal para quem não tem preocupações especulativas. Alguns agentes ( grandes especuladores internacionais) até podem dar maior importância às tendências apontadas pela análise dos grafistas ou técnica. Nada temos contra essa técnica, que também é um instrumento utilizado para tomada de decisão, principalmente à curto prazo. Mas à respeito de instrumentos de decisão, é oportuno mencionar matéria publicada recentemente no jornal Valor Econômico referente a um estudo conduzido por pesquisadores da USP, comparando resultados econômicos obtidos entre decisões tomadas com base nos fundamentos de mercado e com base na análise de grafistas. O que surpreendeu muita gente, é que os resultados foram favoráveis para os que optaram pelo primeiro critério, isto é, pelos fundamentos. Se isso é verificado nos mercados de ações que são mais voláteis, com muita mais razão ainda deve ocorrer nos mercados de commodities.
Voltando aos fundamentos, ninguém discorda de que teremos em 2007 uma produção mundial de café inferior à demanda, esta estimada em 119 milhões de sacas ou mais, contra uma produção estimada entre 110 e 112 milhões de sacas. A maior safra esperada no Vietnã ( e possivelmente na Colômbia e em outros países), não compensará a redução que ocorrerá no Brasil devido ao fenômeno da bienualidade. Em função disso, em princípio, tudo aponta para uma situação de melhores preços em relação aos atuais níveis vigentes. Entretanto prever possíveis acréscimos de preços, a partir de uma situação de preços já razoáveis, é exercício muito mais complicado do que prever quedas de preços. Por exemplo, qualquer pessoa de bom senso saberia dizer que os preços de U$ 400/saca a que chegaram o café em 1985/86 não poderiam se manter, pois foram resultados de situação meramente conjuntural, ou seja, junção de fatores climáticos (seca) e especulativos. Bastaria, na época, acompanhar os preços de varejo nos principais países consumidores para se concluir que aqueles níveis eram insustentáveis. Da mesma forma, os baixíssimos preços que ocorrerem principalmente em 2002 já poderiam ser previstos, como nós mesmo alertamos num evento realizado em 1998 em Salvador, BA. Por que era tão simples fazer aquela previsão? Resposta: aos preços vigentes nos anos de 1997 e 98, a taxa interna de retorno da atividade, até para produtores mais ineficientes, chegava alcançar entre 25 a 30%. Quem estuda análise de investimento sabe que são taxas de lucratividade extremamente elevadas ( o triste nesse processo é que, invariavelmente, quando os cafeicultores tomam decisão de plantio num momento de preços anormalmente elevados colhem os frutos num momento anormalmente baixos), e assim não sustentável já que o valor dos bens, num mercado livre e de muita competição, tende à convergir para um ponto de equilíbrio, ou seja, para um ponto médio. Conseqüentemente, se um bem qualquer atinge valores anormais de mercado, significa que no período seguinte terá que ser ajustado para baixo ou para cima para que o principio do preço médio de equilíbrio seja respeitado Ou seja, quanto mais sobem os preços num período, mais queda pode-se esperar no período seguinte e vice versa. Delfim Netto, o técnico, comprovou empiricamente em sua tese acadêmica que “ o volume de café num ano t, vai depender dos preços no ano t-4”. É essa tese que explica a superprodução de café ocorrida no mundo em 2002; ela foi resultado dos altos preços de 1997 e 98. Apesar dessas considerações sobre preços de café, esperamos que elas não sejam interpretadas como se estivéssemos à favor de uma intervenção no mercado desse produto. Isso entretanto é um outro assunto, palpitante mas muito complicado do ponto de vista da teoria e que não faz sentido discutir nesse espaço.
Embora a situação aponte para uma diferença em favor do consumo, é bom lembrar que déficit de produção não significa obrigatoriamente déficit na oferta. No mercado de café, há que se considerar também a situação dos estoques. Produção mais estoques é determinam a oferta de um período. Em 2005, por exemplo, também tivemos produção menor que a demanda, mas os estoques existentes no mundo deram conta do abastecimento. E hoje, há quantas andam esses estoques ?
Aparentemente ninguém conhece esse volume e a razão é simples: poucos são os segmentos que informam corretamente os seus estoques, alguns, até com segundas intenções. O conhecimento do volume real existente seria de fundamental importância para a cadeia do café, mas analistas de renome que tentaram decifrar o enigma não obtiveram sucesso, embora acreditem que o volume esteja em níveis baixos. Além do volume total, seria importante conhecer também em mãos de quem estão se encontram esses estoques. Isso porque, numa conjuntura de escassez ou excesso do produto, o mesmo volume de estoques impacta diferentemente o mercado dependendo de estar com produtores ou com consumidores.
Como apontamos no início, a questão do câmbio é também de fundamental importância para um setor exportador como a do café e o ambiente macroeconômico em relação à essa variável é de certo pessimismo para quem exporta, assunto que pretendemos analisar oportunamente.
Luiz Moricochi
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