Café Especial é todo aquele que atinge, no mínimo, 80 pontos na escala de pontuação da metodologia SCA
O café e a qualidade
Tudo que você sempre quis saber sobre café e mais um pouco
Desde o seu surgimento, nos altiplanos da Ethiopia, as sementes do café cumpriram um complexo itinerário para a instalação das lavouras. Da África Oriental para o Sudeste Asiático, daí para o Caribe e depois se disseminando pela América do Sul. Apenas para lembrar: originalmente a palavra “café” em árabe significa “vinho”. E como tal, hoje, seu mercado caminha para um refinamento como ocorreu com o do vinho há três décadas.
Já no Século XVIII as primeiras casas de café começaram a fazer fama, estimulando mentes brilhantes de grandes pensadores e artistas europeus.
Há um interessante documento, listado na Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos, elaborado por Robert Hewitt Jr, em 1872, que é considerado o primeiro levantamento global de produção e consumo de café em cartografia. Nesse mapa constam as linhas telegráficas bem como a indicação dos locais onde já estavam e poderiam produzir café. Naquela época o Sudeste Asiático, leia-se Indonésia, mantinha a liderança na produção.
É interessante observar que o café é o primeiro verdadeiro produto de consumo global, desde aqueles tempos.
O momento da pausa para o descanso ficou como A Hora do Cafezinho ou Coffee Break. É pano de fundo para um convite social, do tipo Vamos tomar um café…
Cafés Especiais: o início
No final da década de 1970 e início da de 1980, o mercado norte-americano de café passava por um período muito crítico devido ao declínio de consumo, fechamento de indústrias e era o momento em que se fazia necessário algo novo para sacudir estruturas. Foi quando iniciou-se a cruzada dos Cafés Especiais, originalmente cunhada como Specialty Coffee pela iluminada Sra. Erna Knudsen, tradicional importadora de cafés finos da região de San Francisco, Califórnia.
Com um bom nome e muitas idéias na cabeça, um grupo de industriais fundou a SCAA – Specialty Coffee Association of América, Associação Americana de Cafés Especiais, com a missão de “Estimular a Produção e Consumo de Cafés Especiais”. É, portanto, uma associação comercial que procura atender a cadeia do café e hoje é a maior entidade do gênero no mundo.
Representam o Brasil nesse Conselho a BSCA ou ABCE – Associação Brasileira de Cafés Especiais e o CACCER – Conselho das Associações dos Cafeicultores do Cerrado, sendo que esta última entidade possui assento permanente no IRC.
Quantificando a Qualidade
Outro grande feito foi a criação de uma metodologia de avaliação sensorial objetiva, conhecida como SCAA Cupping Method.
Após aperfeiçoamentos, foi elaborada uma planilha capaz de avaliar dez diferentes atributos, sendo que cada um é pontuado numa escala entre zero e dez. O café especial, portanto, é aquele que atinge, nessa de 80 a 100 pontos utilizando-se essa fórmula.
O conceito do que é especial é muito amplo e seu significado está relacionado com o segmento a que se aplica.
A palavra specialty na língua inglesa pode significar “algo especial” ou “especialidade”. No caso específico do significado “especialidade”, sua conotação é de “superior, inusitado, de alta qualidade”.
Assim, quando a Sra. Erna Knudsen cunhou a expressão que denomina a nova onda do mercado de café, foi com o intuito de mostrar essa ligação, principalmente porque sua empresa de importação é focada em cafés de alta qualidade e que têm uma origem definida. Foi a partir desse momento que se aflorou o conceito de Estate Coffee ou “café de fazenda conhecida”. Isto porque sua empresa importa cafés em pequenos lotes, muitos deles frutos de um relacionamento construído ao longo dos anos, quando passam a conhecer os produtores, suas propriedades e lavouras. Finalmente, escolhem pessoalmente cada lote de café antes de sua compra.
Foi este o conceito que os produtores de vanguarda dos diversos países começaram a trabalhar, criando, em seguida, suas entidades de representação. Assim, todos os países produtores possuem uma associação de cafés especiais.
Ser Especial é…
Em relação ao mercado brasileiro, é interessante observar como o conceito de “café especial” muda de segmento para segmento.
Para o consumidor, até recentemente, café especial era uma bebida derivada de café, normalmente com coberturas, caldas e outros quesitos mais. Ou, um café aromatizado, com toques artificiais de vanila ou nozes.
Este conceito foi introduzido pelas primeiras redes de cafeteria do Brasil, a do Café do Ponto e o Fran’s Café, ambas com base em São Paulo, ainda na década de 80, o que por si só já era uma grande inovação.
Foi nesse mesmo momento que o consumidor também começou a ter a sua primeira percepção do que é “café especial”: o espresso simboliza essa transição, devido ao seu maior valor no serviço, quase 5 vezes o do cafezinho.
Portanto, nesse primeiro momento, e ainda para boa parte dos brasileiros que não moram nas grandes capitais, o primeiro contato com o que seria um “café especial” é poder beber um espresso. Prosaicamente.
É mais caro, é melhor.
Este é um caso de posicionamento devido ao serviço e não ao produto em si.
Identicamente, para boa parte da indústria do café, ainda em alguns lugares fora do circuito das capitais, o fato de introduzir em sua linha de produtos “grãos para espresso” denota que ele está entrando no segmento de cafés especiais.
Essa percepção por parte da indústria de torrefação acontece porque há um conceito generalizado de que os grãos para o serviço de espresso precisam ser de peneiras maiores, como 17/18 ou 16/18. Isto também é um grande avanço, pois para os torrados e moídos, via de regra, são utilizados grãos de peneiras inferiores, quando não a fração denominada escolha.
Observe que o posicionamento já se fez pelo produto, alterando-se dramaticamente a caracterização da matéria-prima.
No entanto, em determinados locais, mesmo vendo-se grãos de peneiras maiores no visor do moinho, pode-se ter a desagradável surpresa de ser servido de uma xícara com uma bebida ruim porque a qualidade sensorial da matéria-prima nem sempre é corretamente avaliada.
Qualidade: correlação entre os métodos
Pela Metodologia SCAA de Avaliação Sensorial, são dez os atributos verificados: Fragrância/Aroma, Uniformidade (cada xícara representa estatisticamente 20% do lote avaliado), Ausência de Defeitos, Doçura, Sabor, Acidez, Corpo, Finalização, Harmonia e Conceito Final.
É um Café Especial todo aquele que atingir no mínimo 80 (oitenta) pontos, identificados como pontos SCAA.
Há uma correlação entre alguns antigos conceitos empregados pela COB – Classificação Oficial Brasileira e a Metodologia SCAA.
Um café especial, sob a ótica da qualidade sensorial, deve corresponder a um café com Bebida Mole, que significa que é uma bebida adocicada, sem ocorrência de asperezas ou adstringência. Simples, não?
Imediatamente abaixo da Bebida Mole, tem-se a Bebida Apenas Mole que é quando se admite de discreta a leve aspereza na bebida, porém com predominância do sabor adocicado.
Logo acima da Bebida Mole, apresenta-se a Bebida Estritamente Mole, que possui os atributos percebidos na Bebida Mole, só que de forma amplificada. Cafés excepcionais e de concurso situam-se nesta faixa.
Dessa forma, fica assim a equivalência:
– 85 pontos SCAA e acima: Bebida Estritamente Mole.
– 80 a 84 pontos SCAA: Bebida Mole.
– 75 a 79 pontos SCAA: Bebida Apenas Mole.
– 71 a 75 pontos SCAA: Bebida Dura Limpa.
Com uma classificação objetiva fica muito mais fácil e transparente a transação comercial, porque há uma clara identificação dos parâmetros envolvidos. A adoção de padrões é muito subjetiva e que pode ter grande flexibilidade, criando dificuldades na identificação de sua real qualidade.