27/05/15
Redução das importações deve ser o principal fator na recuperação de saldo positivo da balança comercial. Por Paulo Vasconcellos, para o Valor, do Rio
O enfraquecimento do mercado interno com a queda da atividade econômica reativou a importância de o Brasil recuperar espaço no comércio exterior. Exportar é o que importa para que a sétima economia do mundo saia do 25o lugar que ocupa hoje no ranking comercial entre as nações. Depois de ter registrado saldo negativo de US$ 3,9 bilhões em 2014, a balança comercial deve fechar no azul em 2015 e 2016.
Pesquisa Focus do Banco Central mostra que o mercado espera um superávit comercial de US$ 4,3 bilhões neste ano e de US$ 9,95 bilhões em 2016. A má notícia é que o resultado positivo não vai refletir uma melhora do desempenho nacional, mas a redução das importações, que será maior que a queda nas exportações. É o que o se chama de superávit negativo.
Governo e empresas lutam para reverter o cenário para embalar uma recuperação mais sustentável com o lançamento do Plano Nacional de Exportações (PNE), que começa a ganhar forma no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), e os esforços da cadeia produtiva para aproveitar a desvalorização cambial, que torna o produto brasileiro mais competitivo. “As exportações, juntamente com o investimento, deverão ser os principais vetores do crescimento brasileiro pós-ajuste da economia”, diz o ministro do Mdic, Armando Monteiro.
“Há queda de demanda nos mercados externos, mas o resultado da balança será positivo, principalmente por causa da recessão brasileira. O desempenho do comércio exterior brasileiro é pouco nobre”, afirma Fábio Silveira, diretor de pesquisa econômica da consultoria GO Associados. Especialistas e empresários também defendem um programa de desoneração da cadeia produtiva, porque só a desvalorização do câmbio não é capaz de impulsionar a venda do produto brasileiro no exterior. “O que o setor não precisa é de mais diagnóstico. Já está todo feito. Falta é uma política integrada de exportações”, diz José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
Em 2014, o saldo comercial brasileiro diminuiu US$ 6,2 bilhões na comparação com 2013. O déficit chegou a US$ 3,9 bilhões. Quinze dos 30 maiores países exportadores tiveram crescimento no valor exportado, entre eles os líderes – a China, que cresceu 11,8% e atingiu US$ 2,2 trilhões, e os Estados Unidos, que aumentaram 8,4% e venderam US$ 1,57 trilhão. Cinco repetiram o desempenho que vinham tendo. Dez registraram queda, puxados pelo Brasil.
A vulnerabilidade do comércio exterior brasileiro se explica pela dependência da pauta de produtos básicos. Os manufaturados perderam competitividade na última década e meia. A participação dos industrializados caiu de 59%, em 2000, para 38%, em 2013, de acordo com estudo da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex).
Já a participação das commodities saiu de 23% para 47% no mesmo período. O país colheu resultados positivos com a valorização da matéria-prima e o crescimento na demanda por insumos, mas perdeu a chance de aproveitar os anos de superávits da balança para azeitar os mecanismos de exportação. A reforma de portos e ferrovias é lenta, a cabotagem é praticamente inexistente, as estradas, por onde trafegam a maioria dos produtos, são mal conservadas. A política tributária e os juros desestimulam os investimentos. Sem fechar acordos comerciais bilaterais ou regionais, o Brasil fica fora das negociações internacionais que dão acesso a novos mercados. O real sobrevalorizado só estimulava as importações.
O ajuste do câmbio já se reflete em alguns segmentos. As exportações de madeira devem crescer 20% em 2015 na comparação com 2014 e alcançar 1,3 milhão de m3. “O setor florestal é muito competitivo no Brasil, que produz 35 mil m3 de pinus por hectare/ ano em comparação a 10 mil m3 por hectare/ano dos Estados Unidos, mas toda a competitividade se perde depois nos gargalos logísticos”, diz Marco Tuoto, presidente da Tree Trading. “Os acessos aos portos são difíceis, a administração portuária ineficiente, a dragagem insuficiente para que o país receba grandes navios e os editais para os terminais privados previstos na nova Lei dos Portos foram impugnados pelo TCU por erros técnicos e legais”, diz Wilen Manteli, presidente da Associação Brasileira de Terminais Portuários (ABTP).
Beneficiada pela desvalorização do real, a indústria de calçado deve crescer de US$ 1,2 bilhão para US$ 1,3 bilhão neste ano. O segmento têxtil também projeta aumento nas vendas para o exterior. O carro brasileiro ficou 30% mais barato com o câmbio desvalorizado e vai ajudar no crescimento das exportações. Mas a melhora deve se restringir a esses produtos e nem todos têm contribuição significativa à balança comercial. A contrapartida negativa virá das commodities com preço em queda no mercado internacional.
“Agora era hora de exportar bens industrializados para compensar as perdas de commodities, mas nossa indústria está enfraquecida. O Brasil se deixou encurralar em poucos setores”, afirma Fábio Silveira, da consultoria GO Associados. “A cotação atual do dólar facilita, temos que aproveitar, mas precisamos aumentar a capacitação das empresas. Onze mil empresas estão no nosso foco de capacitação para tirar o país do descompasso nas relações comerciais”, diz David Barioni, presidente da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), que apoia o setor.
Das 16 milhões de empresas brasileiras, 44 mil importam. Menos da metade (20 mil) exportam. O dado revela um paradoxo. Durante mais de 500 anos, a economia do país foi voltada para a exportação – madeira, ouro, cana-de-açúcar, cacau, café, borracha e soja. Nos anos 80, o superávit na balança comercial era usado para pagar os juros da dívida externa. A abertura do mercado brasileiro, na década de 90, e a aposta no mercado interno, principalmente para que o país passasse pela crise financeira mundial, marcam um novo ciclo, de acordo com os especialistas. O Brasil ainda pode ser o celeiro do mundo, mas precisa reinventar a sua vocação exportadora.