Valor Econômico
10/03/15
A preocupação com o aumento do risco político e com as possíveis implicações da Operação Lava-Jato, que investiga esquema de propinas em contratos da Petrobras, para o setor financeiro azedou o humor do mercado local ontem. O dólar e os juros futuros dispararam, enquanto a Bovespa teve mais um dia de desvalorização.
O dólar subiu 2,35% e encerrou a R$ 3,1277, maior nível desde 28 de junho de 2004. Considerando-se um conjunto de divisas internacionais, o real liderou as perdas em relação à moeda americana.
Ontem, relatório divulgado pela agência de classificação de risco Moody’s destacou que a investigação de corrupção na Petrobras pode reduzir o lucro dos bancos, mas que as implicações para o perfil de crédito soberano são limitadas.
O conteúdo pressionou as ações do setor financeiro, dada a exposição da carteira de crédito de alguns bancos às empresas investigadas, e fez o Ibovespa encerrar em baixa de 1,60%, aos 49.181 pontos.
A percepção da Moody’s se soma ao risco de governabilidade da presidente Dilma Rousseff. O Planalto tem esbarrado em dificuldades para obter apoio até da base aliada para aprovar as medidas fiscais, essenciais para evitar a perda do grau de investimento do Brasil.
A relação do Executivo com o Congresso se agravou após o envio da lista com os nomes de políticos envolvidos na Operação Lava- Jato, na semana passada, ao Supremo Tribunal Federal (STF). Além do problema com a base aliada, a presidente tem enfrentado o aumento da insatisfação popular e queda de aprovação. Isso ficou evidenciado no domingo com a “panelaço” promovido em várias capitais em protesto ao pronunciamento da presidente em rede nacional.
Para o economista-chefe da Opus Gestão de Recursos e professor da PUC-Rio, José Marcio Camargo, o avanço da crise política e o quadro econômico deteriorado estão gerando uma fuga do risco, que se traduz em saída das posições em real e busca pelo dólar. “A crise política monumental gera enorme incerteza e a crise econômica oferecem os ingredientes para o aumento das chances da perda do grau de investimento”, afirma.
A piora dos preços dos ativos reflete o aumento do risco de o governo não conseguir aprovar as medidas fiscais no Congresso, o que inviabilizaria o ajuste fiscal e, assim, tornaria maior a chance de o Brasil ser rebaixado pelas agências de rating, pondera Camargo. Tudo isso está no campo do risco. “Mas é assim que começa: as pessoas começam a sentir que a situação está saindo do controle e vão mudando suas posições”, diz. “Assim, esses cenários pessimistas vão ficando cada vez mais prováveis.”
A piora de percepção se refletiu nos movimentos do câmbio e no mercado de juros, uma vez que outras moedas emergentes tiveram um dia de correção moderada ontem.
Segundo a consultoria Capital Economics, Brasil, África do Sul e Turquia permanecem particularmente vulneráveis ao período de “sell-off” (venda generalizada de ativos), com a aproximação do início da alta de juros nos EUA.
Os problemas políticos enfrentados no Brasil e Turquia e a alta vulnerabilidade das contas externas da África do Sul têm levado as moedas desses países a liderar as perdas ante o dólar.
O aumento do risco político e dúvidas sobre a capacidade do governo em promover o ajuste fiscal sustentam a desvalorização do real e reforçam a perspectiva de que o Banco Central pode ter de estender o ciclo de aperto monetário para conter as pressões inflacionárias.
Ontem, o mercado futuro de juros embutia uma alta de 0,75 ponto percentual da Selic na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) em abril, além de uma elevação de 0,5 ponto percentual no encontro de junho. “Na visão do mercado, a política monetária pode ser hoje o único instrumento disponível para o governo fazer frente à onda de instabilidade que provoca a disparada do dólar”, afirma o economista-chefe e gestor de Investimentos da INVX Global Partners, Eduardo Velho, referindo- se aos sinais de instabilidade política do governo.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2016 avançou para 13,83%, ante 13,51% do ajuste de sexta-feira, enquanto o DI para janeiro de 2021 subiu para 13,22% , ante 12,83% do fechamento anterior, refletindo o ambiente de maior aversão a risco.
Boa parte desse aumento representa mais um prêmio de risco cobrado pelo mercado do que a necessidade do BC aumentar o ritmo de alta da Selic, atualmente em 12,75%, na visão de Rogério Braga, sócio e gestor da Quantitas. “Temos visto a continuidade do nervosismo no mercado diante dos riscos institucionais, que vão se refletir nas manifestações populares, pressionando as taxas de juros futuros no curto prazo”, afirma. Segundo ele, há o temor de que com o aumento da pressão popular, o governo volte atrás na implementação do ajuste fiscal e tome atitudes populistas.
Além do aumento de alguns riscos, como o político e o fiscal, há questões já “inexoráveis” pressionando o mercado, como um quadro recessivo e a inflação muito alta, acrescenta Camargo, da PUC-Rio, para quem o BC vai ter que subir a Selic na próxima reunião em, no mínimo, 0,5 ponto percentual.