Valor Econômico
05/02/15
Quando Jack Lew, secretário do Tesouro dos EUA, sentar-se hoje para informar os membros da Comissão de Finanças do Senado americano sobre o orçamento e os planos para a reforma tributária do governo em 2016, ele estará preparado para ouvir perguntas sobre ao menos um outro assunto.
O dólar forte está agora prejudicando os lucros das empresas e as exportações americanas, e as iniciativas de bancos centrais de todo o mundo para desvalorizar suas moedas reacenderam um velho nervosismo no Congresso e delinearam novas linhas de batalha para os congressistas considerados “guerreiros cambiais”.
Antes, o alvo era a China, mas agora as iniciativas são no sentido de incluir duras cláusulas contra manipulação da moedas em acordos comerciais, especialmente na Parceria TransPacífico (TPP, em inglês), o acordo com o Japão e outras 10 economias no centro da agenda econômica internacional dos EUA e em fase de conclusão.
Esse impulso foi contido até agora pelo presidente Barack Obama. Mas, diante da incessante valorização do dólar e de pressões da indústria automobilística – especialmente da Ford – e de congressistas tanto democratas quanto republicanos, essa é uma questão que Obama terá de enfrentar.
“Fingir que essas preocupações não existem não será suficiente”, advertiu recentemente Orrin Hatch, o republicano que preside a Comissão de Finanças do Senado.
As cobranças do Congresso são bastante claras. Uma maioria em ambas as casas exigiu em 2013 que cláusulas “fortes e impositivas” contra a manipulação de moedas fossem incluídas no TPP, e essas pressões persistem até hoje.
A indústria automobilística americana argumenta que parceiros comerciais como a China e o Japão têm subsidiado suas exportações para os EUA ao manter suas moedas desvalorizadas, uma postura que também torna os produtos americanos menos competitivos no sentido inverso.
“No século passado, as tarifas eram a forma de barreira comercial. A barreira comercial do século XXI é a manipulação de moedas”, afirmou Ziad Ojakli, o principal lobista da Ford, em Washington.
O governo Obama tem relutado em submeter-se às pressões devido a pelo menos duas razões.
A primeira é que o TPP já é um pacote complexo, e incluir cláusulas cambiais poderia liquidá-lo. A segunda razão é de jurisdição. No governo dos EUA, acordos comerciais são tradicionalmente negociados pelo escritório do representante comercial, ao passo que o Tesouro é encarregado das questões cambiais. Isso corresponde à prática mundial, onde moedas são território do Fundo Monetário Internacional, enquanto regras comerciais ficam com a Organização Mundial do Comércio.
Muitos analistas acreditam que a inclusão de regras cambiais num acordo de comércio constituiria um precedente estranho. Mas não há clareza sobre o que a Casa Branca pode fazer para satisfazer os “falcões monetários” no Congresso sem inviabilizar o TPP.
Em conversas privadas, autoridades têm dificuldades para oferecer uma solução – salvo seguir em frente, na premissa de que a questão não será suficiente, por si só, para inviabilizar o TPP quando chegar o momento de sua ratificação pelo Congresso. Eles também destacam que os EUA foram recentemente acusados de manipulação da moeda, como resultado de sua flexibilização quantitativa.
Para Washington, a opção mais simples e mais provável deve ser adotar uma postura mais incisiva no terreno das preocupações com o câmbio em reuniões como o encontro dos ministros das Finanças do G-20, na semana que vem, para expor adequadamente a preocupação do Congresso com o tema.
Em artigo na revista “Foreign Affairs” no mês passado, Fred Bergsten, do Instituto Peterson para a Economia Internacional, de Washington, argumentou que uma política em três frentes e mais agressiva, por parte dos EUA, seria a “estratégia inteligente”, seja o que venha a acontecer com o TPP.
Em primeiro lugar, o governo deveria aplicar a lei existente – e restaurar sua credibilidade internacional na questão – designando formalmente países como a China como manipuladores do câmbio. Em segundo lugar, qualquer país que manipule sua moeda deveria ter seus produtos sujeitos a tarifas compensatórias ou punitivas. E, em terceiro lugar, os EUA deveriam estar preparados para travar uma guerra nos mercados e implementar “intervenções cambiais compensatórias”.
Uma iniciativa chinesa como a compra de UA$ 1 bilhão para debilitar a sua própria moeda deveria ser combatida com uma decisão americana no sentido de comprar o mesmo valor em yuans, para manter a cotação, disse Bergsten.
“Alguma implementação dessa política ou talvez apenas uma declaração sobre tal intenção deverá bastar para impedir futuras manipulações de moeda”, escreveu.
É improvável que essa se torne a política do governo americano no curto prazo. Mas em Washington, a política cambial está ficando cada vez mais volátil.