Pesquisa busca aprimorar qualidade do café nacional

25 de fevereiro de 2006 | Sem comentários Artigos Técnicos Tecnologias


Estudo mostra que é possível tornar
produto brasileiro mais competitivo no mercado internacional


 


RAQUEL DO CARMO SANTOS



Maria Ivone Martins Jacintho e a orientadora, professora Neura Bragagnolo: avaliando  os efeitos do modo de preparoDa plantação até chegar à xícara da maioria da população brasileira, o cafezinho passa por um longo e complicado processo – cultivo, processamento, armazenamento e torrefação. Por isso, todo cuidado é pouco para não se perder, no meio do caminho, a qualidade da bebida. O Brasil, como maior produtor do mundo, também carrega o problema de ter o preço de seu produto desvalorizado, se comparado ao de outros países. O governo federal vem financiando, inclusive, diversas pesquisas com o intuito de se obter um produto mais competitivo. A verdade é que o preço da saca do café brasileiro no mercado internacional tem diminuído frente ao preço da saca do produto distribuído por países da América Central, México, Colômbia e Quênia, que alcançam boas cotações no mercado por serem tidos como bebidas suaves.


Um trabalho conduzido por pesquisadores da Unicamp e do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) está se somando a vários outros estudos para melhorar a qualidade do café brasileiro. Parte da pesquisa “Avaliação da qualidade de cultivares de Coffea canephora e Coffea arabica selecionados para o Estado de São Paulo”, financiada pela Fapesp, foi apresentada como dissertação de mestrado junto à Faculdade de Engenharia de Alimentos, por Maria Ivone Martins Jacintho, orientada pela professora Neura Bragagnolo. Pelo Centro de Café do IAC, os responsáveis pelo trabalho são Terezinha de Jesus Garcia Salva (coordenadora do projeto) e Oliveiro Guerreiro Filho.


Em meio às várias etapas possíveis, nas quais o café é submetido, Maria Ivone optou por investigar aquela que antecede a torrefação dos grãos. “Meu interesse foi avaliar o efeito do modo de preparo na composição química dos grãos para relacionar com a qualidade da bebida”. A pesquisadora estudou cinco cultivares da espécie arábica e três da robusta, todos desenvolvidos no Instituto Agronômico de Campinas. Ela explica que a espécie arábica (Coffea arabica) é mais produzida no Brasil e em todo o mundo por ser considerada de melhor qualidade e a robusta (Coffea canephora) é tida como mais resistente a pragas, mas sua bebida sofre um certo preconceito por parte dos degustadores de café que a consideram de qualidade inferior. Os cultivares pesquisados recebem os nomes de: Catuaí Vermelho IAC 81, Mundo Novo, Ouro Verde, Obatã, Tupi da espécie arábica e Conilon, Apoatã e Robusta da espécie robusta.


A inovação do trabalho da pesquisadora foi justamente analisar vários cultivares da espécie arábica e robusta após submetê-los aos três tipos de preparo do grão que existem – via seca, úmida e cereja descascado. “Este tipo de estudo é importante na medida em que os grãos possuem compostos químicos que vão formar o sabor e aroma da bebida”, esclarece Neura.


Na via seca, os grãos são dispostos no “terreiro” de concreto e expostos ao sol. São revolvidos periodicamente para impedir fermentações indesejáveis. Este é o tipo mais adotado no Brasil. Já o modo via úmida, que origina cafés denominados despolpados, a casca e a polpa são retirados e a mucilagem é submetida a um processo de degradação por microrganismos. Esta tecnologia é utilizada pelos colombianos e em diversas pesquisas é associada ao nível de qualidade do café produzido por eles, devido ao aumento da acidez desejável e do aroma.


O modo de cereja descascado foi desenvolvido recentemente no Brasil. Trata-se de uma boa alternativa intermediária entre os dois modos – seca e úmida. Neste caso, a casca e a polpa do fruto são retirados, e o grão com a mucilagem é colocado para secar em terreiro. Todos os cafés utilizados no trabalho de Maria Ivone obedeceram um rigoroso controle das etapas de preparo. “Fizemos tudo em igualdade para garantir a eficácia dos resultados”, garante.


Em uma primeira etapa, ela analisou o pH, acidez total titulável (relacionado ao nível de acidez da bebida) e atividade polifenoloxidase (enzima presente no café e que se suspeita que quanto maior a sua atividade, maior a qualidade do produto) em amostras de café cru. Depois, a pesquisadora avaliou em café torrado, além do pH e acidez titulável, o teor de sólidos solúveis, propriedade importante para rendimento do café principalmente na indústria de café solúvel. E, finalmente relacionou a qualidade sensorial – neste item, provadores treinados avaliaram acidez, amargor, corpo, doçura e qualidade global da bebida – com os parâmetros químicos dos grãos crus e torrados.


Conclusões – Uma das conclusões da pesquisa foi que a maioria dos cultivares preparados nos modos despolpados e cereja descascados apresentou bebida de melhor qualidade. “Isto comprova o bom resultado do modo utilizado pelos colombianos e confirma a utilização da alternativa desenvolvida no Brasil”. Outro fator identificado como decisivo na qualidade foi o tipo de cultivar. O Ouro Verde destacou-se entre as cultivares de café arábica estudadas.


No que se refere aos parâmetros químicos, a acidez dos cafés despolpados foram maiores. “Neste caso, o resultado depende especialmente do mercado consumidor. A acidez pode agradar alguns e desagradar outros”. O trabalho das pesquisadoras não observou nenhuma relação entre a enzima com a qualidade da bebida. Isto poderia se atribuir, explica Neura, ao modo de colheita. “No Brasil, os grãos cereja (de melhor qualidade) se misturam muitas vezes com os verdes e com grãos defeituosos. Isto pode alterar a qualidade do produto final”. Durante a pesquisa foram utilizados os grãos do tipo cereja.


A dissertação de mestrado de Maria Ivone é apenas uma parte do projeto do Centro de Café e os pesquisadores do Instituto Agronômico irão relacionar outros parâmetros químicos com a qualidade da bebida. “Este tipo de trabalho é extremamente longo e complexo, mas importante para devolver ao café brasileiro a competitividade que lhe é natural e se chegar a um produto de melhor qualidade no mercado internacional”.


FONTE: http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/dezembro2002/unihoje_ju202pag8a.html

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