19/06/2012
Demanda na China e crise na Europa vão influenciar os preços dos grãos, que podem até cair, mas não perderão a lucratividade
por Luciana Franco | Globo Rural
Apesar da crise na Europa e da desaceleração na economia da China, fatores que têm pressionado os preços das commodities agrícolas nos últimos meses, o horizonte no longo prazo para soja, milho, açúcar e café deve ser positivo. “O ciclo de alta nos preços das commodities deve sobreviver à crise na Europa”, afirma Ilan Goldfajn, economista-chefe do Itaú Unibanco. De acordo com ele, a recuperação americana, ainda que lenta, somada à forte demanda por alimentos e energia nos países emergentes, deve manter as cotações em patamares elevados. O economista não acredita em uma parada da China, apesar da expectativa de um crescimento mais fraco nos próximos anos. “A China tem muita poupança, é credora de todo o mundo e não lhe faltam reservas. Seu desafio é ajustar os investimentos”, diz.
O gigante asiático cresceu, em média, 11,3% de 2003 a 2008, mas deve atingir 8% em 2012 e 7,3% ao ano entre 2013 e 2020, segundo as projeções de Goldfajn. Com isso, a expectativa é que o mundo também cresça menos. A economia global deve se expandir, em média, 3,5% ao ano entre 2013 e 2020, em comparação com o crescimento de 4,4% registrado entre 2003 e 2008.
A China, portanto, continuará dando as cartas no cenário mundial. Isso porque, segundo especialistas do mercado, a população está ascendendo de classe social. Para se ter ideia, em 2005, mais de 82% das famílias chinesas eram de baixa renda, indicador que passará a 20% em 2020. “Além disso, hoje mais de 50% da população mundial vive nas cidades, e isso se reflete na inflação sobre os preços de comida”, diz Anderson Galvão, diretor da empresa de consultoria Céleres.
“A soja possui os fundamentos mais altistas do mercado de grãos”, afirmou KonaHaque, analista da empresa de consultoria Macquarie Capital, da Europa. Segundo ela, os estoques globais ficaram ainda menores após a quebra da produção sul-americana na safra 2011/2012, por causa da seca. A tendência neste ano é que os preços continuem a oscilar entre US$ 13 e US$ 14 por bushel. Mas, para Galvão, a alta dos custos no Brasil coloca em risco a competitividade da produção nacional.
De acordo com o estudo realizado pela empresa de consultoria MacquarieCapitala, as projeções para 2012 e 2013 são de que os preços continuem lucrativos, podendo, entretanto, cair de patamar, uma vez que a Europa ainda estará em recessão e a tendência é que as safras mundiais cresçam e ajudem a recompor os níveis dos estoques mundiais. “O Brasil está vivendo um bom momento no mercado interno, mas ainda depende de capital externo e está atento ao desenrolar da crise na Europa”, avalia Edemir Pinto, diretor presidente da BM&FBovespa.
“A demanda do Sudeste Asiático permanecerá em alta, mas as safras serão maiores, os custos crescerão e os estoques também aumentarão”, diz Kona. Ela apresentou um panorama mundial sobre o desempenho dos mercados de grãos, combustíveis, café, algodão e cacau nos próximos anos durante o Seminário sobre perspectivas do agronegócio, realizado pela BM&F em maio, em São Paulo.
Para André Pessôa, diretor da empresa de consultoria Agroconsult, o cenário para os próximos três a cinco anos é, em linhas gerais, favorável ao agronegócio brasileiro. “Em 2012, a safra brasileira de milho pode superar os 70 milhões de toneladas, que, somada à produção recorde dos Estados Unidos, deve pressionar os preços do grão, que tendem a cair de US$ 7 para US$ 5 por bushel até o final do ano, preços ainda rentáveis”, diz Pessôa. Com isso, a próxima safra de verão (2012/2013) deve ter a área de milho reduzida em favor da soja, cujo plantio será elevado em cerca de 2 milhões de hectares. “Estimamos um cultivo de 27 milhões de hectares de soja em 2012/2013”, diz. O algodão também deve ter área reduzida em 20% no Brasil e vai ceder espaço para a soja. “O consumo mundial de algodão vai cair, por conta da recessão mundial, e o do poliéster – que é mais barato -tende a aumentar”, diz Kona (leia mais na pág. 82). Para Pessôa, haverá um ajuste do mercado de soja e de milho, aumento de custos e a tendência é de rentabilidade menor, tanto em 2013 como em 2014. No caso do café, apesar de a expectativa de uma grande produção brasileira na safra 2012/2013 ter contribuído para a queda de mais de 20% das cotações dos contratos futuros na Bolsa de Nova York em 2012, especialistas ainda acreditam que a colheita deverá ser menor que a anunciada, podendo somar algo em torno de 50,5 milhões de sacas, contrariando estimativas que trabalham com volumes entre 55 milhões e 60 milhões de sacas.
Já para o cenário do açúcar, o Rabobank Brasil trabalha com uma estimativa média de preços nesta temporada entre US$ 0,20 e US$ 0,21 por libra-peso, mas ressalva que será preciso acompanhar o clima no Brasil e em outros países produtores. Isso porque o mercado vem acompanhando com atenção a possibilidade de ocorrência do fenômeno climático El Niño, que costuma deixar o tempo mais chuvoso no Brasil e o clima mais seco na Índia e Austrália. Chuvas na colheita podem prejudicar os trabalhos e afetar a concentração de sacarose, por conta da elevada umidade.