Exportação ainda resiste ao câmbio

14 de fevereiro de 2006 | Sem comentários Comércio Exportação
Por: Estadão








Levantamento da Funcex mostra que vários segmentos cresceram mais do que a média das vendas externas
Fernando Dantas
RIO
As exportações industriais brasileiras cresceram vigorosamente em quantidade em 2005, apesar da valorização do câmbio de 14%. Um levantamento da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex) mostra que diversos segmentos industriais importantes, como automóveis, máquinas e tratores, material elétrico e equipamentos eletrônicos tiveram avanço nas quantidades exportadas superior à média das exportações como um todo, que foi de 9,3%. O levantamento analisou 27 setores exportadores, que abrangem 98% das vendas externas do País.

Os números indicam que o Brasil ainda não está vivendo a chamada “doença holandesa”, situação na qual a excessiva valorização do câmbio, associada à exportação maciça de produtos básicos, deprime e destrói os setores industriais. Nas últimas semanas, diversos economistas manifestaram preocupação de que a economia brasileira fosse contaminada pela doença holandesa (ver quadro).

Os dados da Funcex, porém, não confirmam os temores. O crescimento das quantidades exportadas, em 2005, foi de 26,5% para veículos automotores, de 14,1% para máquinas e tratores, de 9,7% para material elétrico e de 104,3% para equipamentos eletrônicos. Em comparação, em setores de insumos básicos – cujo forte crescimento teoricamente caracterizaria a “doença holandesa” – a expansão de quantidades em 2005 foi de 18,9% para petróleo e carvão, de 14,6% para açúcar, de 4% para a indústria extrativa-mineral e de 6,5% para a agropecuária. No caso do café, houve um recuo de 2,2%. Para Fernando Ribeiro, da Funcex, “é prematuro falar de doença holandesa”.

Ribeiro menciona também outro levantamento recente da Funcex, que mostra que a proporção do agronegócio nas exportações brasileiras tem se mantido estável desde o início dos anos 90. Pelos critérios da Organização Mundial do Comércio (OMC), o agronegócio brasileiro era responsável por 28% das exportações do País em 1990 e por 29,3% em 2005.

Levando-se em conta o critério mais abrangente do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, que inclui no agronegócio setores como celulose, madeira e mobiliário, calçados, couros e peles, aquela proporção, que era de 41,4% em 1990, ficou exatamente no mesmo nível em 2005. Para o economista, a manutenção do tamanho da fatia do agronegócio também é um sinal de que não há “doença holandesa” na economia brasileira.

Muitos economistas, porém, consideram que o risco da doença holandesa está crescendo. Francisco Pessoa, da LCA, consultoria de Luciano Coutinho, acha que o fato de a proporção de exportações do agronegócio ter se mantido constante ao longo dos últimos anos é pouco significativo. Ele observa que o movimento de forte valorização do câmbio, que acompanhou o grande impulso das exportações de insumos básicos e matérias-primas no Brasil – como minério de ferro e soja – , é muito recente. Desta forma, se houver doença holandesa, ela pode estar nas etapas iniciais e não ter ainda levado a um aumento perceptível da proporção de exportações ligadas ao agribusiness.

Pessoa está fazendo um levantamento de quantidades exportadas que abrange mais de 6 mil produtos exportados. Ele observa que a proporção de produtos que tiveram queda nas quantidades exportadas passou de 39%, no primeiro trimestre de 2004, para 49,7%, no último trimestre de 2005. Em termos de faturamento, este conjunto de itens passou de 19,8% do total exportado para 36,9%, naquele mesmo período.

O aumento do peso dos produtos com queda de quantidades na pauta exportadora pode significar, para o economista, que o câmbio está tirando competitividade destes setores. Assim, enquanto as exportações como um todo crescem, esta expansão pode estar se concentrando em itens que resistem à valorização cambial, como os supercompetitivos insumos básicos e matérias-primas brasileiros, em prejuízo daqueles que vão se tornando progressivamente menos competitivos e que estariam concentrados no setor industrial.

A pesquisa da LCA ainda não está pronta, e, portanto, aquelas conclusões são apenas hipóteses por enquanto. Mas Pessoa diz que “existem sinais que nos aproximam da doença holandesa”.

Mesmo nos dados da Funcex, que comparam as quantidades exportadas em 2004 e 2005, há setores industriais que já parecem estar fraquejando diante da valorização do câmbio. O segmento calçados, couros e peles, por exemplo, teve um recuo de 3,9% nas quantidades exportadas; o de madeira e mobiliário sofreu uma queda de 5,2%.

O empresário Elcio Jacometti, da Jacometti Calçados, e presidente da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), não tem dúvidas de que o câmbio valorizado está prejudicando o seu setor de forma drástica. “Faz um ano que estamos falando que este câmbio nos tira totalmente a competitividade”, diz.

Em 2005, a quantidade de pares de calçados exportados caiu de 212 milhões para 189 milhões, com fechamento de 60 empresas e estimativas de que até 20 mil postos de trabalho possam ter sido perdidos. Em janeiro de 2006, acrescenta Jacometti, o faturamento das exportações do setor caiu 7% em relação ao desempenho do mesmo mês em 2004.

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