O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reclamou da qualidade dos portos brasileiros, chegando mesmo a dizer que não consegue inaugurar obras por causa de problemas burocráticas, além de ter acusado os fiscais de atuarem nas alfândegas “como em pequenos impérios”. Já o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, criticou a falta de planejamento administrativo, cenários e objetivos por parte do governo, admitindo que há uma sensação de desânimo no País.
Ambas as análises só mereceriam elogios por sua percuciência e objetividade, se não fosse por um detalhe: um é o ministro responsável pelas políticas industrial e de comércio exterior, enquanto o outro é simplesmente o chefe de governo e de Estado. Ao fazerem suas reclamações com a máquina burocrática, admitem a própria impotência diante dos desafios do País.
Ao fazê-lo, demonstram também um defeito capital em homens públicos, ou seja, a ausência de um fogo interior capaz de entusiasmar aqueles que os cercam, de que foi o melhor exemplo o presidente Juscelino Kubitschek. E o que é mais lamentável: demonstram falta de autoridade para comandar, pois já ninguém parece dar ouvidos às ordens que vêm de Brasília. É como se o País andasse à matroca.
Se vivêssemos num regime parlamentarista, o presidente da República, pressionado pela Nação, já teria convocado eleições gerais e substituído o gabinete. Com isso, provavelmente, um ar de renovação já teria afastado para bem longe o desânimo que o ministro constata em todos os quadrantes do País. Mas, como estamos sob um regime presidencialista, o que apenas poderemos esperar é que o atual governo empurre com a barriga os problemas até o primeiro dia de 2007, quando, então, passará o bastão ao novo governo. Até lá, haja paciência.
Enquanto isso, ao mesmo tempo em que a indústria dá sinais de desaceleração e os indicadores do IBGE mostram que os consumidores, inclusive os de renda mais elevada, relutam em gastar e se endividar, o governo federal mostra-se incapaz até mesmo de aplicar os recursos que havia separado para investir em obras prioritárias em sete portos brasileiros: Santos, Rio de Janeiro, Vitória, São Francisco do Sul, Itajaí, Sepetiba e Rio Grande.
De fato, da verba de R$ 229,3 milhões prevista no começo do ano, apenas R$ 85 milhões foram direcionados ao pagamento de serviços ou à compra de equipamentos. Pior: apenas R$ 12 milhões, ou seja, 5% dos valores inicialmente programados, foram efetivamente gastos. Haja paralisia.
Apesar da ausência de investimentos significativos na infra-estrutura portuária, as boas perspectivas mundiais permitem supor que o comércio exterior brasileiro cresça novamente em 2006, embora o mais provável é que as importações evoluam mais rapidamente do que as exportações, o que produzirá uma diminuição do superávit. Se isso ocorrer, haverá uma valorização do dólar, o que deverá beneficiar também os exportadores.
Seja como for, a verdade é que o País deverá crescer menos do que poderia, se tivesse sido mais previdente no investimento em sua infra-estrutura. Acossado por “gargalos” logísticos e com suas empresas e governo enlaçados no cipoal da burocracia, não foi à toa que o País registrou uma queda de 1,2% no Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre deste ano, enquanto China, Índia, Rússia, Argentina, Chile e Venezuela, nações tão emergentes quanto o Brasil, aproveitaram-se dos ventos favoráveis da economia mundial para exibir taxas de crescimento superior a 6%. Haja inveja.
Deixar escapar essa oportunidade rara é resultado da falta de programa de governo, que se reflete na insistência com que o Banco Central sustenta uma taxa de juros elevadíssima, indiferente à grita até mesmo de altos escalões da República. É conseqüência também da indefinição de rumos constatada pelo ministro Furlan, da troca de acusações entre os próprios ministros, da oposição aberta à política econômica empreendida pelo principal partido de sustentação do governo, das denúncias de corrupção, da falta de punição para os corruptos, do inchaço da máquina pública, da manipulação de fundos públicos para financiar partidos e corruptos etc.
Tudo isso levou insegurança às empresas e ao adiamento de investimentos, o que, com certeza, vai se refletir no desempenho da economia em 2006. Portanto, infelizmente, já se sabe que não vem por aí um feliz ano novo. Feliz ano velho.
*Milton Lourenço é diretor-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo |