23/10/10
PAULO PICCHETTI
ESPECIAL PARA A FOLHA
A discussão dos impactos dos mercados futuros das commodities agrícolas ganhou nova relevância recentemente, devido ao aumento contínuo dos preços dos principais produtos, e de um cronograma estabelecido para o início de definições sobre o processo regulatório.
Um relatório recente do Usda revisou para baixo a expectativa de produção de algumas das principais culturas, com efeitos imediatos nos preços dos contratos futuros e à vista.
Quase simultaneamente, foi divulgada uma pesquisa realizada pelo jornal \”Financial Times\” com consumidores de alguns países, mostrando que uma pequena minoria dos entrevistados culpa os aumentos das demandas da China, da Índia e de outros emergentes como responsáveis primários pelos maiores preços das commodities agrícolas.
A maior parcela de culpa divide as opiniões: no caso dos EUA e da Inglaterra, o problema é relacionado principalmente com a oferta, prejudicada pelo clima e políticas governamentais (como restrições de exportações).
No entanto, o sentimento majoritário dos entrevistados na França, na Alemanha e na Espanha atribui uma importância predominante à atuação de especuladores.
Esse sentimento já se traduz em pressões políticas dos governos desses países.
De forma concreta, a Comissão de Trocas de Futuros de Commodities dos EUA já vem trabalhando no sentido de cumprir a data-limite de 30 de novembro para o desenho básico de um mecanismo de imposição de limites ao comércio de futuros.
Em abril de 2011 esses limites já deveriam ser respeitados nos mercados de commodities agrícolas, limitando a atuação de investidores de caráter especulativo.
Entretanto, as informações sobre a participação desse tipo de investidores não são facilmente obteníveis, pelo menos no prazo proposto.
O desafio atual é criar esses limites em termos de parâmetros que podem ser ajustados aos dados quando esses estiverem efetivamente disponíveis. Outra instituição de importância fundamental, a Associação Internacional para Swaps e Derivativos (Isda), incentivou desde sua criação, há 25 anos, a prática de transações privadas de contratos de derivativos.
Após o grande sucesso dessa prática durante o período que antecedeu a crise, atualmente a Isda vem respondendo às mesmas pressões políticas e propondo alterações institucionais nos mercados de derivativos que facilitem a fiscalização e a regulação dos negócios.
Enquanto os analistas debatem se a recente elevação dos preços caracteriza uma nova \”crise de alimentos\” mundial, a definição de novas regras para os mercados futuros pode ajudar a esclarecer e eventualmente reduzir os impactos de fatores não diretamente relacionados aos fundamentos de produção e consumo desses mercados.
PAULO PICCHETTI, 48, doutor em economia pela Universidade de Illinois, é professor da EESP/FGV (Fundação Getulio Vargas) e coordenador do IPC-S/Ibre/FGV).