Agrotóxico é suspeito de causar câncer

Pesquisadores investigam se água que abastece a população de Manhuaçu está contaminada, causando mortes

Por: Hoje em Dia

Celso Martins – Repórter – 31/08/2010 – 08:37


O agrotóxico usado na lavoura de café em Manhuaçu, a 278 quilômetros de Belo Horizonte, na Zona da Mata, pode estar contaminando a água que abastece o município de cerca de 75 mil habitantes. A suspeita é da engenheira sanitarista da UFMG Alexandra Fátima Saraiva Soares, autora de uma pesquisa de doutorado sobre os efeitos do agrotóxico na saúde dos moradores daquela cidade. A decisão de investigar o assunto foi tomada depois que a engenheira descobriu que o câncer é a segunda causa de morte na cidade. A principal causa, porém, ainda é desconhecida, o que aumenta a suspeita de Alexandra Saraiva de acreditar que os óbitos também tenham relação com o produto químico.


Mesmo sem ter em mãos os resultados da análise da água, a engenheira química tem várias evidências de que a substância esteja causando doenças. Com uma produção de 24 mil toneladas de café em 2008, Manhuaçu registrou, de 2001 a 2005, 214 mortes por câncer. Além disso, o município dispõe de uma área colhida de 18.150 hectares.


“O relevo local também é bastante montanhoso, com altitude variando de 561 a 1.760 metros. No período de chuva, há grande possibilidade de que esses agrotóxicos, aplicados às plantas e ao solo, tenham o excedente carreado para as águas, contaminando-as. Trata-se de uma região onde o sistema de abastecimento de água é composto por diversos mananciais independentes. Além da sede, Manhuaçu possui mais 11 comunidades rurais com mananciais de abastecimento público próprios”, afirmou Alexandra Saraiva.


Uma das constatações da pesquisa, iniciada em 2007, é a de que existem lavouras de café que margeiam os cursos d’água, inclusive os mananciais de captação para abastecimento público. Segundo Alexandra Saraiva, esses produtores desrespeitam as áreas de preservação permanente (APPs), estabelecidas no Código Florestal Brasileiro, e aumentam o risco de contaminação dessas águas, já que, muitas vezes, os leitos estão desprovidos de matas ciliares.


Durante a pesquisa, a engenheira vai coletar amostras de água antes e depois da estação de tratamento. Além disso, está sendo finalizada na UFMG uma miniatura de uma estação de tratamento convencional, a mesma usada em Manhuaçu. O principal desafio de Alexandra Saraiva é provar que o agrotóxico diluído não é removido pelas estações.


A Prefeitura de Manhuaçu informa que já foram realizadas duas análises da água, com resultados negativos de componentes do agrotóxico. Com o apoio do químico Wagner Knupp, da Fundação Centro Tecnológico de Minas Gerais (Cetec), serão usados equipamentos capazes de localizar partículas de produtos químicos utilizados para matar as pragas da lavoura. Um dos inseticidas usados é o endossulfan, substância proibida nos Estados Unidos e em parte da Europa.


Um dos fungicidas mais vendidos em Manhuaçu é o mancozebe, que pode provocar câncer, e o epoxiconazol. Segundo a engenheira, esse último pode contaminar nascentes de águas superficiais.


Na agricultura de café da região de Manhuaçu, diversos agrotóxicos são aplicados. Segundo Alexandra Saraiva, foram utilizados 186 produtos distintos no primeiro semestre deste ano, com 102 ingredientes ativos. “Dos agrotóxicos comercializados, destinaram-se às lavouras de café 55,88 % do total comercializado no primeiro semestre, indicando a importância dessa cultura na região de estudo”, constata.


O professor Breno Marcos de Souza, 34 anos, morou entre 2003 e 2007 no Centro de Manhuaçu. “Tive várias dores de barriga e diarreias fortes. Quando eu li um artigo falando que a água de Manhuaçu poderia estar contaminada com agrotóxico, passei a tomar água mineral e nunca mais tive nada”, declarou o professor, que atualmente mora em Governador Valadares, no Leste do Estado.


O trabalho é financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig). A coordenadora do projeto é a engenheira química da UFMG Mônica Maria Diniz Leão, além da arquiteta Ana Clara Moura Mourão, que está ajudando a mapear, por meio de imagens de satélites, as lavouras e as nascentes do Rio Manhuaçu.

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Agrotóxico é suspeito de causar câncer


Pesquisadores investigam se água que abastece a população de Manhuaçu está contaminada, causando mortes







O agrotóxico usado na lavoura de café em Manhuaçu, a 278 quilômetros de Belo Horizonte, na Zona da Mata, pode estar contaminando a água que abastece o município de cerca de 75 mil habitantes. A suspeita é da engenheira sanitarista da UFMG Alexandra Fátima Saraiva Soares, autora de uma pesquisa de doutorado sobre os efeitos do agrotóxico na saúde dos moradores daquela cidade. A decisão de investigar o assunto foi tomada depois que a engenheira descobriu que o câncer é a segunda causa de morte na cidade. A principal causa, porém, ainda é desconhecida, o que aumenta a suspeita de Alexandra Saraiva de acreditar que os óbitos também tenham relação com o produto químico.


Mesmo sem ter em mãos os resultados da análise da água, a engenheira química tem várias evidências de que a substância esteja causando doenças. Com uma produção de 24 mil toneladas de café em 2008, Manhuaçu registrou, de 2001 a 2005, 214 mortes por câncer. Além disso, o município dispõe de uma área colhida de 18.150 hectares.


“O relevo local também é bastante montanhoso, com altitude variando de 561 a 1.760 metros. No período de chuva, há grande possibilidade de que esses agrotóxicos, aplicados às plantas e ao solo, tenham o excedente carreado para as águas, contaminando-as. Trata-se de uma região onde o sistema de abastecimento de água é composto por diversos mananciais independentes. Além da sede, Manhuaçu possui mais 11 comunidades rurais com mananciais de abastecimento público próprios”, afirmou Alexandra Saraiva.


Uma das constatações da pesquisa, iniciada em 2007, é a de que existem lavouras de café que margeiam os cursos d’água, inclusive os mananciais de captação para abastecimento público. Segundo Alexandra Saraiva, esses produtores desrespeitam as áreas de preservação permanente (APPs), estabelecidas no Código Florestal Brasileiro, e aumentam o risco de contaminação dessas águas, já que, muitas vezes, os leitos estão desprovidos de matas ciliares.


Durante a pesquisa, a engenheira vai coletar amostras de água antes e depois da estação de tratamento. Além disso, está sendo finalizada na UFMG uma miniatura de uma estação de tratamento convencional, a mesma usada em Manhuaçu. O principal desafio de Alexandra Saraiva é provar que o agrotóxico diluído não é removido pelas estações.


A Prefeitura de Manhuaçu informa que já foram realizadas duas análises da água, com resultados negativos de componentes do agrotóxico. Com o apoio do químico Wagner Knupp, da Fundação Centro Tecnológico de Minas Gerais (Cetec), serão usados equipamentos capazes de localizar partículas de produtos químicos utilizados para matar as pragas da lavoura. Um dos inseticidas usados é o endossulfan, substância proibida nos Estados Unidos e em parte da Europa.


Um dos fungicidas mais vendidos em Manhuaçu é o mancozebe, que pode provocar câncer, e o epoxiconazol. Segundo a engenheira, esse último pode contaminar nascentes de águas superficiais.


Na agricultura de café da região de Manhuaçu, diversos agrotóxicos são aplicados. Segundo Alexandra Saraiva, foram utilizados 186 produtos distintos no primeiro semestre deste ano, com 102 ingredientes ativos. “Dos agrotóxicos comercializados, destinaram-se às lavouras de café 55,88 % do total comercializado no primeiro semestre, indicando a importância dessa cultura na região de estudo”, constata.


O professor Breno Marcos de Souza, 34 anos, morou entre 2003 e 2007 no Centro de Manhuaçu. “Tive várias dores de barriga e diarreias fortes. Quando eu li um artigo falando que a água de Manhuaçu poderia estar contaminada com agrotóxico, passei a tomar água mineral e nunca mais tive nada”, declarou o professor, que atualmente mora em Governador Valadares, no Leste do Estado.


O trabalho é financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig). A coordenadora do projeto é a engenheira química da UFMG Mônica Maria Diniz Leão, além da arquiteta Ana Clara Moura Mourão, que está ajudando a mapear, por meio de imagens de satélites, as lavouras e as nascentes do Rio Manhuaçu.

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