Relíquias
Jacqueline Costa
O GLOBO
RIO – Folhear as páginas do livro \”Fazendas do Império\”, que será lançado nesta quarta-feira, é como fazer uma visita a cada uma das 47 propriedades que são mostradas ao longo de 308 páginas. É quase como ter o dono da casa guiando os passos do visitante e mostrando os aposentos mais importantes, já que algumas fazendas, de tão grandiosas, chegam a ter 54 cômodos distribuídos em 2.500 metros quadrados, como é o caso da sede da Pao Grande, uma das maiores construções rurais do Brasil, localizada em Avelar, próximo à Paty dos Alferes.
Através das imagens registradas por Cristiano Mascaro e dos textos de Tasso Fragoso Pires, Mary del Priore e Roberto Conduru, fica fácil imaginar como é e era viver nessas verdadeiras relíquias. Das fazendas relacionadas no livro, 31 ficam no Rio, dez em São Paulo e seis em Minas.
– O ciclo do café fluminense aconteceu por uma conjunção de fatores que não podem se repetir. Havia, no começo do século XIX, depois da Revolução Francesa, um consumo de café enorme na Europa e já na América do Norte. Aqui, no estado do Rio, o ciclo do ouro estava acabando. Então os mineradores começaram a plantar café, que já se plantava na cidade do Rio, sem muito sucesso por conta dos fatores climáticos. Por mais que a gente se empenhe para mostrar a opulência e força desta época, não conseguimos passar completamente a ideia – conta Tasso, um apaixonado pelas histórias do Vale do Paraíba e autor de outros três livros sobre fazendas.
(Veja detalhes da imponência das fazendas imperiais)
Tasso conta que na segunda metade do século XIX, os antigos agricultores deram lugar aos barões do café. A partir daí, o cotidiano dos fazendeiros e de suas famílias era vivido de uma maneira suntuosa, entre móveis vindos da Inglaterra e da França, talheres e baixelas de prata, além de copos do mais fino cristal.
Salas de jantar, halls e capeLas eram decoradas em trompe-l\’oiel, técnica artística que, com truques de perspectiva, cria uma ilusão ótica.
\”
Quem comprava uma fazenda dizia que levava tudo o que tinha dentro, fosse casa, bicho ou gente
\”
——————————————————————————–
A seleção das propriedades que foram retratadas e o roteiro ficaram a cargo de Arthur Mario Vianna, outro profundo conhecedor das fazendas localizadas nos três estados. Foi ele que, com seu jeito elegante de falar e amizade com vários donos, conseguiu abrir as portas para a entrada em cena do fotógrafo e arquiteto Cristiano Mascaro, reconhecido por suas imagens de patrimônios arquitetônicos. Ao todo, foram cinco meses de viagem para chegar à publicação de 340 imagens. No final do século XIX, as fazendas entraram em decadência e ficaram abandonadas. Nesta época, os compradores derrubavam as antigas sedes para vender o material da demolição. Na hora da negociação, a casa velha era usada como um ônus por quem adquiria uma fazenda.
– Na década de 50, começou a valorização desses patrimônios históricos. Até então, quem comprava uma fazenda dizia que levava tudo o que tinha dentro, fosse casa, bicho ou gente. Hoje é diferente: você compra uma casa colonial e junto vem uma fazenda, que pode ter cinco, cinquenta ou 500 alqueires. Não importa porque o intuito é a casa – diz Arthur.
Além das fotos de Mascaro, o livro há também a reprodução de litogravuras, aquarelas e fotos, como uma feita por Marc Ferrez, em 1885, que mostra mais 20 escravos agrupados e prontos para partir para a colheita do café. Entre eles, mulheres com bebês no colo. A publicação é recheada de curiosidades e também faz referência às viagens de dom Pedro II ao Vale do Paraíba, no interior fluminense. Na Fazenda Pao Grande, até hoje é mantido intacto um imperial vaso sanitário, que teria sido usado pelo imperador.
Editora do livro e proprietária da Fazenda Chacrinha, Marta Fadel afirma que há mais de 15 anos não há uma publicação tão detalhada sobre as fazendas imperiais. Ela explica que um dos objetivos do livro foi relatar o cotidiano de uma época.
– Mostramos curiosidades, os costumes e como era a vida dos barões de café, com seus eventos, casamentos, jantares – diz.
O livro será lançado na quarta-feira, às 20h, na Livraria da Travessa, no Shopping Leblon. No dia do lançamento, o livro será vendido a R$ 80. Após o lançamento, custará R$ 100.