ARTIGO – Cafeicultura: Protagonista ou Coadjuvante?

15 de abril de 2009 | Sem comentários Mais Café Opinião
Por: 15/04/2009 09:04:10 - Notícias Agrícolas

Engº Agrônomo Armando Matielli
MBA em Agribusiness (FGV)
Diretor do Sindicato dos Produtores Rurais e
Cafeicultor – Fazenda Jacutinga(Guapé / MG)

Nos últimos tempos, os políticos brasileiros demonstram um comportamento de abandono em se tratando de assuntos relacionados à cafeicultura, trazendo um desperdício de oportunidades para a melhoria da economia cafeeira e das regiões produtoras e, logicamente, deixando de contribuir para o aumento dos nossos superávits comerciais, o que incrementaria a economia brasileira como um todo.


No governo Collor, deu-se os primeiros atos de uma modernidade econômica, por exemplo à extinção do IBC (Instituto Brasileiro do café), órgão que, mal ou bem gerido, estabelecia princípios de organização das políticas cafeeiras ora existentes. No geral, o Brasil partiu para uma fase promissora na era pós-militar. Nossa economia cresceu e o Brasil deu um salto de prosperidade. Mas, no caso do café, essa liberdade econômica mostrou-se desastrosa para os produtores de café. Primeiramente não criamos nenhuma estratégia de marketing visando à proteção da renda dos cafeicultores. O mercado correu solto com toda sua liberdade, ou libertinagem, e acabamos por uma estrangulação na área produtiva; aquele glamour dos produtores de café passou a ser um pesadelo, levando-nos à vala dos insucessos econômicos. Se tal política atual persistir, acabaremos por extinguir a atividade produtiva cafeeira, levando ao desemprego milhões e milhões de trabalhadores, com a perda de uma fortíssima atividade econômica para o enriquecimento do Brasil. Lembrando que se não foi o principal, a cafeicultura com certeza está entre os principais alicerces do desenvolvimento sócio-econômico brasileiro.


Precisamos impor uma política de comercialização de café, pois o modelo atual está mais do que provado que é falimentar e acarreta prejuízos extremados, principalmente ao setor produtivo. Quando analisamos o mercado global, percebemos a nossa fraqueza na comercialização. Somos o primeiro produtor mundial, estamos a caminho do primeiro consumidor mundial, temos uma excelente logística, talvez a melhor entre os países produtores, possuímos um parque cafeeiro produtivo e bastante tecnológico. Nos últimos anos dobramos a produtividade e melhoramos a qualidade; hoje produzimos entre 80 e 90% de cafés bons para excelentes. Contudo, entregamos nosso café a um preço ridículo.


Vemos a Colômbia e os países da America Central vender café 35% mais caro que o nosso. Isso é incrível!!! A Colômbia, por exemplo, chega a vender a U$$ 1,80/libra-peso e o Brasil a US$ 1,15/libra-peso, base Nova Iorque, ou seja, na faixa de R$ 200,00/saca acima do nosso. Veja que esses R$ 200,00/ saca, no dia de hoje, se multiplicados diretamente pelo volume de exportação de café do Brasil, sem considerarmos o tipo e a qualidade do café exportado, de uma maneira generalizada, corresponde a R$ 6,0 bilhões por ano de receita que estamos deixando de ganhar com nossa exportação de 30 milhões de sacas, acumulado dos últimos doze meses. É lamentável pois é esta estimativa que coloca a cafeicultura brasileira “de joelhos”. A Colômbia, acompanhada pelos países da America Central, possui políticas definidas na comercialização. No Brasil acreditamos na liberdade comercial, quando na verdade temos uma “libertinagem”, com centenas de exportadores, cada qual espremendo no máximo o cafeicultor, para arrancar preços baixos visando à competitividade; uma guerra comercial entre os compradores internos. O mercado internacional, sabendo dessas inúmeras firmas brasileiras vendendo café, faz outra guerra arrancado os melhores preços. O produtor fica totalmente desprotegido entre duas guerras, recebendo valores ridículos por uma saca de café.


Além disso, somos em 320.000 cafeicultores no Brasil, na maioria pequenos produtores, que infelizmente não possuem força suficiente de barganha e entregam o café a qualquer preço. Hoje, possuímos por volta de 170 exportadores filiados a CECAFE (fonte: site da CECAFE), além de outros exportadores de alto calibre, que não estão associados à CECAFE, como algumas grandes cooperativas e comerciantes. Toda essa sistemática, sem regras, gozando da liberdade comercial tão propalada, mas que no fundo está mostrando nosso amadorismo, onde estamos deixando de angariar bilhões de dólares devido à nossa própria incompetência.


Para elucidar ainda mais as vantagens financeiras obtidas pela Colômbia e demais países exportadores de café da América Central, basta mentalmente multiplicarmos a quantidade total de café exportado por ano pelo Brasil por essa diferença supracitada de até R$ 200,00 por saca. Veremos que estamos deixando de ganhar bilhões de reais/dólares em divisas para nosso país, além do empobrecimento gradativo da atividade cafeeira, chegando, ao longo dos anos, aos patamares atuais, ou seja, “o fundo do poço”. Se políticas e políticos continuarem a demonstrar essa indiferença ao setor produtivo e ao agronegócio café em geral, continuaremos entregando de “bandeja” bilhões e bilhões de reais/dólares aos compradores internacionais de café. Tal indiferença caracteriza-se ainda mais quando observamos o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de muitos municípios cafeeiros do Sul de Minas Gerais, da Zona da Mata Mineira e do Estado do Espírito Santo abaixo do ideal.


Estamos em fase de renegociação de dívidas da cafeicultura. Este endividamento não seria tão expressivo se a atividade fosse remuneradora. Atualmente calcula-se ser entre 4 a 5 bilhões de reais o passivo dos cafeicultores, valor esse que virou um tormento e precisa ser resolvido para a continuidade econômica dessa nobre atividade, que é a mais social do Brasil. Mas, resolvendo essas dívidas, precisamos focar uma política de continuidade com organização estratégica visando o futuro da cafeicultura, e o momento é propicio, pois o Movimento S.O.S café, conseguiu atingir os objetivos de sensibilizar o governo em resolver a situação. Precisamos organizar de forma tal que tenhamos normas disciplinadoras e reguladoras da política setorial do café, com fiscalização do cumprimento da organização, com arbitragem entre os agentes do mercado, entre outros. O Presidente do CNC, Sr. Gilson Ximenes, já deu a idéia de uma Agência Reguladora para o café, o que nos parece muito pertinente para o setor neste momento.


Além disso precisamos retomar nossa posição junto à OIC (Organização Internacional do café), atualmente dirigida por um colombiano, o Sr. Nestor Osório, e nós não estamos vendo nenhuma ação de marketing no mercado. Os assuntos de pauta de reunião mostram a falta de foco dessa instituição onde o Brasil contribui com 320.000 libras esterlinas, pelo cambio atual, cerca de cerca de R$ 1.000.000,00 (fonte CNC). Possivelmente o Brasil deve ser o maior contribuinte e precisamos retomar a nossa força política dentro da OIC, colocando um brasileiro no comando, onde possuímos excelentes executivos para tal.


Como o maior produtor e com o maior poder de barganha, precisamos ganhar dinheiro e, no futuro, melhorar a atuação do agronegócio café nos setores secundário e terciário da economia, pois sabemos que no setor primário somos simplesmente fornecedores da matéria prima, e como produtores de matéria prima temos como ensinamento do MBA (Gestão em Agribusiness pela FGV), ministrada pelo professor Mauro de Rezende Lopes, a seguinte conclusão: “Com terras férteis e mecanizáveis, clima bom, água abundante, mão-de-obra disponível e barata, alta produtividade e tecnologia de ponta, não se ganha dinheiro na agricultura produzindo bens primários, ganha-se dinheiro nos setores secundários e terciários da economia”. Mas esse assunto teremos que postergar, após organizarmos pelo menos nosso setor primário.


Com tudo isso, após a organização da Cafeicultura no setor primário da economia, precisamos nos tornar o mais rápido possível os Protagonistas do Mercado café, pois como coadjuvantes vamos acabar na vala dos falidos economicamente.

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