AGRONEGÓCIOS
15/04/2008
Bettina Barros
Sacos para grãos, tecidos para embalagens, fios para confecções e agora sacolinhas para biquínis e lingerie. O primeiro contrato de exportação de juta para a Europa foi celebrado na semana passada entre executivos da Companhia Têxtil Castanhal, do Pará, e uma rede italiana de moda íntima interessada em “salvar a Amazônia”.
Plantada na beira do rio Amazonas, a fibra já chegou a Milão, na primeira de 500 lojas da marca Yamamay espalhadas pela Itália. Até esta sexta-feira, todas as unidades disponibilizarão a novidade. Cada peça vendida será embalada na sacola de juta, que substituiu o plástico, e reverterá ? 1 para o Fundo Amazonas de Sustentabilidade, projeto do governo do Amazonas.
“É um grande incentivo para para os produtores”, disse ao Valor Oscar Borges, presidente da Castanhal, que viajou a Milão na semana passada acompanhado pelo governador amazonense, Eduardo Braga (PMDB), para presenciar o lançamento de 200 mil sacolas.
É a primeira exportação de juta do Brasil, acostumado a importar a matéria-prima para a confecção de tapetes. O principal concorrente é Bangladesh, onde a cultura é vista como carro-chefe da economia.
Empresa familiar, criada há 42 anos, a Castanhal responde por 72% do mercado nacional de juta. Os outros dois fabricantes do país – Cata, no Pará, e Jutal, em Manaus – ficam com restante do mercado.
Segundo Borges, a maioria da juta processada (75%) é destinada à confecção de sacos para armazenagem de café, cacau, algodão, batata e pimenta. “Conseguimos atender à demanda total do mercado interno de sacaria”, diz ele. “E isso é importante para impedir que Bangladesh entre no país”.
Ele fala com razão: com uma população gigantesca envolvida na atividade e salários irrisórios, Bangladesh produz hoje cerca de 800 mil toneladas de juta por ano. Metade disso é exportado. No Brasil ocorre o oposto. Falta mão-de-obra para a cultura, confinada ao Amazonas e ao Pará, e a produção anual gira em torno de 20 mil toneladas. “Representamos só 1% da produção mundial”, afirma Borges. “A Índia é o maior produtor”, lembra ele, “com 1,2 milhão de toneladas por ano, mas eles usam tudo para o consumo interno”.
A falta de produtores brasileiros pode ser entendida pelo isolamento natural do Amazonas, o maior produtor do país e menos habitado pela força da floresta. A juta cresce nas águas das calhas do rio, em cidades ribeirinhas como Manacapuru e Itacoatiara. Suas sementes são plantadas no lodo deixado pelo período da vazante – a baixa do rio – e são cortadas na cheia, quase seis meses depois.
Para um olhar desavisado, podem parecer apenas varetas fincadas na água. Mas é dentro do caule fino que está a fibra, que depois de seca ao sol vai para a fábrica ser transformada em sacos e afins.
O sobe-e-desde de vários metros das águas do Amazonas inviabilizam outras culturas no Estado, explica Borges. Por isso, a juta é tão importante para os amazonenses. Só neste Estado, a fibra serve de fonte de renda para 15 mil famílias de ribeirinhos, ajudando a fixar o homem no campo e impedindo o êxodo para centros urbanos.
Para encorajar os produtores, o governo local oferece desde 2004 um subsídio ao produtor de R$ 0,20 por quilo sobre os R$ 1,15 pagos pela Castanhal (o piso da matéria-prima é de R$ 1,00). A estratégia do governador Eduardo Braga, em seu segundo mandato, parece estar surtindo efeito. A produção e área plantada com juta no Amazonas dobraram no ano seguinte.
Apesar dos esforços, Borges acredita que o Brasil não tem como competir com a Ásia no setor. “A juta é uma atividade artesanal, precisa de gente cuidando dela para que a sua qualidade seja melhor. Com 100 mil pessoas no Amazonas e 70 milhões em Bangladesh, há como competir”, afirma.
O jeito é confiar no apelo ambiental. “A juta é plantada na calha do rio, não desmata”, diz o presidente da Castanhal. A empresa faturou R$ 53 milhões em 2007. “Se a Yamamay tivesse comprado as sacolas da Índia o preço seria bem inferior em virtude da mão-de-obra barata. Mas ela fez questão da juta brasileira graças ao que representa para a preservação da Amazônia”.