O aumento dos juros ao consumidor e a elevação das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) retirou aproximadamente R$ 3,1 bilhões da renda familiar disponível para o consumo no primeiro trimestre do ano, sendo R$ 2,2 bilhões referentes ao incremento nas taxas de juros à pessoa física e R$ 918 milhões correspondentes à arrecadação extra de IOF (provocada também pelo aumento das concessões de crédito). A estimativa faz parte de um estudo elaborado pela assessoria econômica Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP).
O valor equivale a 0,5% do PIB estimado para o período, de R$ 683,7 bilhões, e a 0,8% do consumo das famílias no período. Pelo levantamento, no primeiro trimestre, a parcela do PIB destinada ao consumo das famílias foi de R$ 416,7 bilhões, 12,6% acima do verificado em igual intervalo do ano passado, em valores nominais. O cálculo foi realizado com base nas projeções de Produto Interno Bruto (PIB) e de consumo das famílias para o trimestre e do pagamento de IOF e de juros em março – os dados de janeiro e fevereiro já foram divulgados pelo governo.
“Este cálculo dá uma dimensão de como a mudança na tributação e na cobrança de juros comprometeram parte da renda que poderia ser destinada ao consumo e a investimentos”, afirma Altamiro Carvalho, assessor econômico da Fecomercio-SP. Conforme o estudo, os gastos totais com juros e IOF pagos por pessoas físicas no primeiro trimestre do ano devem totalizar R$ 46,07 bilhões – 25,9% acima do total registrado no mesmo intervalo do ano passado, mesmo com a redução da taxa Selic de 13% para 11,25% ao ano no período.
“Teoricamente, a elevação de juros e de IOF deveria trazer algum efeito ao varejo, porque o custo do crédito aumenta, mas hoje o consumidor avalia se a prestação cabe no bolso”, avalia Carlos Thadeu de Freitas Gomes Filho, economista-chefe da SLW Asset Management. Para ele, mesmo a elevação da Selic prevista para a próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) não deve afetar a predisposição dos consumidores em se endividarem. “A concessão de crédito cresce 13,5% no ano, enquanto a massa salarial cresce 5,5%. O crédito mais abundante permite que se continue consumindo”, avalia o economista.
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as vendas do varejo no país acumulam expansão de 10% nos 12 meses encerrados em janeiro. No primeiro mês do ano, o crescimento foi de 11,8%. Para Carlos Thadeu de Freitas Gomes, chefe do departamento econômico da Confederação Nacional do Comércio (CNC), outro fator que deve ser levado em conta, diz, é a ampliação dos prazos de pagamento, que aumentou em mais de dois meses no último ano, passando de 374 dias para 447 dias, na média. “A oferta maior de crédito garantiu vendas mais aquecidas, sobretudo de bens de consumo duráveis. É certo que o aumento do IOF reduz a renda disponível. Mas o crédito mais farto e os prazos mais longos de pagamento tiram esse efeito da vista dos consumidores”, avalia.
Pesquisa da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) revela que os consumidores inadimplentes aumentaram o número de dívidas nos últimos 12 meses. Em março do ano passado, 47% dos inadimplentes tinham apenas uma dívida em atraso, de carnê ou contrato bancário. Em março deste ano, esse índice caiu para 36%. O índice de três ou mais dívidas em atraso dobrou no mesmo período, passando de 21% para 42%.
Pelo estudo da Fecomercio, os gastos totais com juros e IOF no primeiro trimestre correspondem a 3,95% do PIB e a 6,48% do consumo das famílias. No primeiro trimestre do ano passado, esses índices eram mais baixos, de 3,61% e 5,83%, respectivamente. Carvalho calcula que apenas o aumento da taxa de juros a pessoas físicas entre janeiro e março correspondeu a 0,54% do PIB. “Se a taxa de juros tivesse se mantido estável, o total de gastos das famílias com juros teria sido R$ 2,236 bilhões menor”, compara.
No trimestre, comparado ao mesmo período de 2007, a concessão de crédito a pessoas físicas cresceu 26,5%, para R$ 258,6 bilhões, e o total de juros pagos aumentou 21,5%, para R$ 25,5 bilhões. O IOF arrecadado em operações de pessoas físicas aumentou 156,4% no período, para R$ 1,5 bilhão, superando a participação das pessoas jurídicas no total recolhido, segundo o estudo.
Carvalho, da Fecomercio-SP, vê com preocupação o aumento da oferta de crédito em ritmo mais veloz que o da renda das famílias. “A diferença entre expansão de crédito e aumento da massa de salários não pode permanecer por muito tempo, pois pode elevar o risco de inadimplência no longo prazo.”