Introdução
A irrigação do cafeeiro é uma prática que tem possibilitado a obtenção de
produto final de melhor qualidade, significativos aumentos de produção e
produtividades mais estáveis, principalmente na fase de formação das lavouras.
Esta prática favoreceu a expansão da cafeicultura brasileira e permitiu o
cultivo do café em áreas limitadas pelas condições pluviométricas.
Diversos resultados de pesquisa demonstraram o efeito positivo da
irrigação sobre a produtividade do cafeeiro em várias regiões do país (Reis et
al. 1990; Carvalho, 1998; Bonomo, 1999; Neto 2002; Peixoto, 2002; Mantovani
2003). Entretanto este aumento de produtividade das lavouras irrigadas pode
predispor as plantas ao ataque de várias doenças do cafeeiro, se medidas de
manejo integrado não forem adotadas adequadamente.
São escassos os trabalhos envolvendo o comportamento das doenças do
cafeeiro em função de diferentes lâminas ou sistemas de irrigação. Alguns
trabalhos têm demonstrado correlação positiva entre a incidência da ferrugem
(Hemileia vastatrix Berk.& Br.) e lâminas de irrigação (Juliatti et al.,
2000). O sistema de irrigação utilizado também pode interferir no progresso da
doença. A intensidade da ferrugem é maior em lavouras irrigadas por pivô
central, do que em lavouras irrigadas por gotejamento ou tripa, devido ao
molhamento foliar que possibilita a disseminação e a re-inoculação do patógeno
nas plantas (Juliatti et al. 2000).
Com a expansão da cafeicultura para áreas irrigadas do cerrado e o
plantio de cultivares de alta capacidade produtiva, tem sido comum observar um
ataque mais severo da mancha de olho pardo. Esta doença é causada pelo fungo
Cercospora coffeicola Berk. & Cooke e ataca tanto folhas quanto frutos do
cafeeiro, causando desfolha, amadurecimento precoce e queda prematura dos
frutos. Indiretamente causa seca de ramos laterais e redução no rendimento do
cafeeiro. A nutrição deficiente, alta insolação e baixos níveis de água no solo
são os principais fatores que predispõem o cafeeiro ao ataque desta doença
(Echandi 1959; Siddiqi 1970; Carvalho & Chalfoun, 1998).
Segundo (Juliatti et al., 2001), a irrigação é uma ferramenta que deve
ser trabalhada com muito cuidado, a fim de evitar que outros fatores possam
levar a perdas em produtividade, como elevação da incidência e severidade da
ferrugem pela alteração do microclima e do estado nutricional da planta. Neste
contexto o presente trabalho teve como objetivo estudar o efeito de diferentes
lâminas de irrigação associadas ao controle químico de doenças foliares na
produtividade do cafeeiro irrigado por gotejamento.
Material e métodos
O experimento foi conduzido na Fazenda Vista Alegre, município de
Jaboticatubas – MG, situada a 19º30′ S, 43º44′ W e 700 metros de altitude, no
período de agosto de 2004 a dezembro de 2006. A lavoura foi plantada no ano 2000
e a variedade utilizada foi o Catuaí IAC 144, cultivada no espaçamento 0,5 x 3,5
m. O delineamento experimental foi de blocos casualizados com quatro repetições
no esquema de parcelas subdivididas, sendo as parcelas constituídas por quatro
lâminas de irrigação e as subparcelas com e sem aplicação de fungicida
(Epoxiconazole + Piraclostrobina). Cada unidade experimental foi constituída de
15 plantas sendo as 10 plantas centrais consideradas como plantas úteis no
experimento.
A disposição dos tratamentos e as lâminas aplicadas foram estabelecidas
em função da disponibilidade de modelos de gotejadores encontrados no mercado,
conforme descrito na tabela 1. Os dados meteorológicos necessários para o manejo
da irrigação foram obtidos de uma estação meteorológica automática, modelo
Micrometos, instalada na área experimental, com sensores de temperatura, umidade
relativa, velocidade de vento, radiação solar, horas de sol e precipitação. Os
dados foram medidos a cada 12 minutos e registrados a cada hora, e,
posteriormente, convertidos em médias diárias.
O manejo da irrigação foi realizado através do balanço hídrico diário do
solo calculado pelo software IRRIPLUS®.
Porcentagem das lâminas de irrigação estabelecidas de acordo com a vazão
x número de gotejadores por metro.
*Porcentagem da lâmina recomendada pelo software IRRIPLUS®
Na subparcela que recebeu a aplicação de fungicida, foram realizadas duas
aplicações do fungicida sistêmico Epoxiconazole + Pyraclostrobina sendo a
primeira em janeiro (1,5 L/ha) e a segunda em março (1,0 L/ha). O volume de
calda utilizado foi de 400 L/ha.
A quantificação da ferrugem e da mancha de olho pardo do cafeeiro foi
feita mensalmente no período de novembro de 2004 a dezembro de 2006,
coletando-se 10 folhas ao acaso no terço médio de cada planta, no 3º ou 4º par
de folhas do ramo, totalizando 100 folhas por unidade experimental.
Com os dados de incidência da ferrugem do cafeeiro foram traçadas as
curvas de progresso no período de novembro a julho de cada ano e calculada a
área abaixo da curva de progresso da ferrugem media para os dois anos de
avaliação (AACPF). Com os dados de incidência da mancha de olho pardo foram
traçadas as curvas de progresso no período de janeiro a dezembro de cada ano e
calculada a área abaixo da curva de progresso da mancha de olho pardo média para
os dois anos de avaliação (AACPMOP).
As dez plantas centrais de cada unidade experimental com mais de 80% de
frutos no estádio cereja, foram colhidas e pesadas separadamente. Em cada
unidade experimental foi retirada uma amostra de dois litros de café cereja para
fazer o rendimento. Estas foram colocadas em redes tubulares de polietileno e
levada para secar ao sol. Após a secagem as amostras foram beneficiadas e
pesadas, com o objetivo de obter o peso seco do café beneficiado. O rendimento
em cada unidade experimental foi feito dividindo o peso do café cereja pelo peso
do café beneficiado. Posteriormente efetuou-se a conversão da produção do café
cereja para produtividade em sacas de 60 Kg de café beneficiado por hectare.
Resultados e discussão
Os resultados abaixo se referem aos dados médios da Área Abaixo da Curva
de Progresso da Ferrugem (AACPF), da Área Abaixo da Curva de Progresso da Mancha
de Olho Pardo (AACPMOP) e da produtividade do cafeeiro nas safras 2004/2005 e
2005/2006.
Em relação à ferrugem do cafeeiro observou-se que, não houve interação
entre lâminas de irrigação e aplicação do fungicida no controle da doença. As
subparcelas que receberam o fungicida apresentaram menor incidência da doença e
conseqüentemente menores valores de AACPF. As subparcelas que não receberam a
aplicação de fungicida apresentaram alta incidência de doença e desfolha
acentuada das plantas. Dentro de cada subparcela foi observado que não houve
diferença na AACPF em função das diferentes lâminas de irrigação aplicada
(Tabela 2).
Resultados médios da AACPF, AACPMOP e produtividade do cafeeiro (Sc. café
ben./ha) em função de diferentes lâminas de irrigação nos tratamentos com e sem
aplicação de fungicida Epoxiconazole+Piraclostrobina.
1Porcentagem da lâmina recomendada pelo software IRRIPLUS®
2AACPF e AACPMOP= Área Abaixo da curva de progresso da ferrugem e mancha de
olho pardo, respectivamente
3Médias seguidas por uma mesma letra na vertical não diferem entre si ao
nível de 5% pelo teste Tukey.
A figura 1 mostra que o comportamento da ferrugem foi idêntico tanto nas
parcelas que receberam ou não o tratamento com fungicida. Entretanto a aplicação
do fungicida promoveu controle eficiente da ferrugem mantendo baixo o valor da
AACPF nas diferentes lâminas de irrigação.
Ao contrário da ferrugem, a medida que se aumentou a quantidade de água no
solo, houve redução na incidência da mancha de olho pardo do cafeeiro. Os
maiores valores da AACPMOP foram observados no tratamento sem irrigação nas duas
subparcelas. Estes resultados estão de acordo com Echandi (1959), que observou
menor incidência e severidade da mancha de olho pardo em plantas de café que
recebiam regularmente a irrigação. Mansk (1990) também observou uma maior
incidência da mancha de olho pardo em lavouras novas, com deficiência hídrica,
expostas ao sol e com nutrição inadequada. A falta de umidade do solo pode
condicionar a planta à menor absorção de nutrientes, tornando-a debilitada e
mais suscetível à infecção por C. coffeicola.
Na subparcela que recebeu aplicação do fungicida, houve diferença nos
valores da AACPMOP entre diferentes lâminas de irrigação aplicadas. Juliatti et
al. (1998) e Talamini et al. (2001), também observaram diferença na intensidade
da mancha de olho pardo entre as parcelas irrigadas e não irrigadas. Entretanto,
nas parcelas que receberam a irrigação não houve diferença estatística entre as
lâminas aplicadas na quantidade de doença apresentada pelas plantas.
A produtividade máxima foi obtida com a lâmina recomendada pelo software
IRRIPLUS®, tanto nas parcelas que receberam a aplicação de fungicida quanto nas
parcelas que não receberam nenhum tratamento (Figura 3). Os tratamentos que
receberam 100% da irrigação estimadas a partir do software IRRIPLUS®
apresentaram aumento de 73% na produtividade em relação ao tratamento sem
irrigação.
Trabalhos realizados nas condições do cerrado mineiro, no município de
Araguari, em lavouras de café com oito anos de idade, cultivar Mundo Novo 388-17
também demonstraram o efeito positivo de sistemas de irrigação, bem como de
diferentes lâminas no aumento da produtividade da lavoura (Carvalho, 1998;
Peixoto, 2002). Em Viçosa-MG, no período de 2000 a 2002, trabalho realizado numa
lavoura de oito anos, da variedade Catuaí, mostrou aumento médio de 80% na
produtividade em lavouras irrigadas, quando comparadas ao tratamento não
irrigado (Mantovani 2003).
Nas subparcelas tratadas com fungicidas, houve aumento médio de 76% de
produtividade em comparação com as subparcelas que não receberam aplicação de
fungicida, demonstrando a importância do manejo adequado das doenças do cafeeiro
em áreas irrigadas (Tabela 2). Vale ressaltar que a aplicação de fungicidas por
si, não aumenta a produtividade da cultura, mas atua diretamente no controle das
doenças e na retenção foliar da planta evitando a desfolha e a conseqüente seca
de ramos do cafeeiro. Entretanto, como o fungicida empregado possui
estrobilurina (Piraclostrobina) na formulação, admite-se que o aumento de
produtividade possa também estar associado ao efeito fisiológico do produto na
planta.
Neste trabalho, a produtividade foi classificada como baixa nas parcelas que
não receberam controle de doenças e classificada como alta nas parcelas que
receberam o manejo adequado das doenças. A produtividade do cafeeiro irrigado é
considerada muito baixa, quando produz menos de 20 sacas beneficiadas por
hectare, baixa de 20 a 30, média de 30 a 40, alta de 40 a 60 e uma ótima
produtividade acima de 60 sacas beneficiadas por hectare (Mantovani, 2002).
Segundo Neto (2002), estes valores são considerados médios e adotados como
referência, podendo ocorrer mudanças nos mesmos, dependendo da região em que se
está analisando, condições de clima, solo, nutrição, espaçamento de cultivo,
equipamento de irrigação utilizado, condições de manejo da água no solo e do
preço de comercialização do produto, sendo, portanto, necessária à realização de
estudos que venham a precisar melhor estes valores.
Este trabalho também demonstrou que a aplicação de lâmina de irrigação
acima da recomendada reduziu a produtividade do cafeeiro. Este resultado está de
acordo com Soares (2005), que observou comportamento variável da produtividade
do cafeeiro quando se aplica lâminas superiores àquela requerida pela cultura. A
aplicação excessiva de água nas lavouras pode aumentar perdas de nutrientes no
solo, causar morte de radicelas e, além disso, aumentar o gasto com água e
energia e consequentemente aumento do custo de produção da propriedade.
Conclusões
A aplicação do fungicida Epoxiconazole + Piraclostrobina foi eficiente no
controle da ferrugem do cafeeiro, mas não houve diferença estatística na área
abaixo da curva de progresso da ferrugem nas diferentes lâminas empregadas.
Houve redução nos valores da área abaixo da curva de progresso da mancha
de olho pardo à medida que se aumentou a quantidade de água aplicada no solo,
mas não houve diferença estatística entre as lâminas empregadas.
Tratamentos que receberam 100% da lâmina de irrigação estimada pelo
software IRRIPLUS® apresentou um aumento médio de 73% de produtividade em
relação ao tratamento sem irrigação.
A irrigação associada ao controle das principais doenças do cafeeiro
proveu um ganho médio de 75% na produtividade da cultura.
Referências bibliográficas deste trabalho encontram-se disponíveis em:
Souza, A.F., Zambolim L. Bomfim, H.N., Costa D. R., Zambolim E.M.; Mantovani E.
C. Associação entre lâminas de irrigação e controle químico de doenças foliares
do cafeeiro irrigado por gotejamento. In: V Simpósio de Pesquisa dos Cafés do
Brasil. Águas de Lindóia, SP. Anais… 2007.
1Trabalho apresentado no 5º Simpósio de Pesquisa dos Cafés do Brasil –
Águas de Lindóia, 2007.
Fonte: http://www.abic.com.br/asp/noticias_noticia.asp?cod=7828