Publicação: 23/07/07
Produtores saem em busca do café ideal
Os produtores de café estão ressuscitando o bourbon amarelo. Trata-se de uma variedade arábica top de linha, considerada uma das melhores do mundo para a produção de cafés especiais. O cultivo deste grão era muito comum na década de 50, mas foi deixado em segundo plano por se tratar de uma variedade pouco produtiva e suscetível a doenças e pragas. Mas, então, por que insistir na produção desse grão, se há outras variedades tão boas quanto o bourbon amarelo? Porque seu sabor adocicado e o aroma conferido à bebida fazem toda a diferença em uma xícara, afirmam produtores e indústrias ouvidas pelo Valor.
Em suas fazendas na região de Alfenas (MG), a Ipanema Coffees, fornecedora brasileira exclusiva da rede Starbucks, o bourbon amarelo tem lugar de destaque. A empresa tem contrato até 2011 com a gigante americana para a entrega de todos os seus bourbons. E não são muitos. “Produzimos cerca de 15 mil sacas do tipo bourbon de uma média de 120 mil sacas anuais”, afirma Edgard Bressani, diretor de marketing da Ipanema Coffees. A empresa retomou o cultivo deste grãos há dez anos.
Apesar de ser reconhecidamente uma estrela entre os grãos de café, resultado do cruzamento entre a variedade bourbon vermelha e amarelo de Botucatu, o bourbon amarelo não reina sozinho nas fazendas que cultivam os grãos de alta qualidade, sempre a uma altitude que varia de 1.000 a 1.200 metros. As variedades mundo novo, icatu, rubi e catuaí também têm espaço nobre nos blends dos cafés.
Os cafés especiais conquistam cada vez mais espaço no varejo e nas cafeterias do país. Mas o caminho traçado por esses grãos nobres das fazendas até as xícaras é longo, cercado de cuidados antes, durante e depois do plantio. E o percurso até chegar às gôndolas é milimetricamente calculado, uma vez que um passo em falso, põe tudo a perder. Todo esse rigor é usado como justificativa para seu preço. A saca de 60 quilos do grão especial custa, no mínimo, 50% mais que a do grão de boa qualidade, cotado a R$ 230.
“O processo de colheita é um dos mais importantes para a qualidade do grão”, afirma Gabriel Dias, da fazenda Cachoeira da Grama, de São Sebastião da Grama (SP). “A colheita e o processamento têm de ser rápidos para evitar a ação dos fungos e a fermentação dos grãos”, diz.
Em sua fazenda, Gabriel garante que a colheita é toda cercada de cuidados. Os colhedores entregam os grãos recém-colhidos de hora em hora para evitar que eles fiquem expostos durante o processo da colheita. Em alguns talhões dos cafezais, há colheita seletiva.
Após a colheita, esses grãos vão para o processador, onde os melhores passam por uma triagem antes de ser levados para a secagem. Há fazendas que contam ainda com terreiros suspensos, que permitem uma maior ventilação e menor risco de que os grãos não fermentem, explica Gabriel Dias.
A seleção dos grãos para compor o blend do café passa por um rigoroso controle. E além da qualidade do grão, é preciso conferir ao produto um misto de sabores, observa Eduardo Aranha, da Fazenda Águas Claras, de Itapira (SP), que também comercializa cafés especiais no varejo.
A seleção de um bom café depende também de como o blend é feito. Hoje, boa parte dos especiais consumidos é 100% do tipo arábica. O que diferencia um café do outro é a composição do blend. Aranha explica que cada região do país tem sua especificidade. No sul de Minas, por exemplo, os cafés são mais cítricos e com acidez mais ressaltada. Na região da Mogiana paulista, eles têm um viés achocolatado, o que confere maior corpo nos cafés expressos, e também ajuda a dar equilíbrio ao blend. Nas regiões produtoras da Bahia, são mais caramelizados. Todos esses fatores juntos compõem uma boa xícara. Mas, todos esses componentes ainda dependem de um bom processo de torra para que o grão conserve todos esses requisitos ao chegar até a xícara.
E atentas a este mercado que cresce até 30% ao ano e representa já 5% do total consumido, as indústrias não querem ficar de fora. “As torrefadoras trabalham na busca pela excelência da qualidade do café”, diz Nathan Herszkowicz, diretor da Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic). Mais maduras, as indústrias buscam uma origem mais segura. “Há uma preocupação do torrefador em mostrar nas embalagens de onde vem os grãos, como é o blend e se as fazendas adotam políticas socioambientais. Os consumidores de café são exigentes e buscam no café as mesmas referências quando compram um vinho”, afirma.
Uma pesquisa de consumo divulgada pela Abic mostra que a exposição dos cafés especiais nas gôndolas de supermercado era de 17% em agosto de 2006 e 83% para os cafés tradicionais. Em junho último, a exposição para os especiais saltou para 23%, enquanto os tradicionais reduziram para 77%. O quilo do café especiais no varejo custa quatro vezes mais que o do tradicional. “O consumidor está mais atento e quer saber o que está tomando”, diz Gelma Franco, dona da Il Barista, rede de cafeterias com grãos especiais, e especialista em café. Segundo Gelma, o consumidor apurou seu paladar com informação. “Queremos a mesma exigência feita para o vinho.”