À distância, parecem manequins femininos retratando, fielmente, hábitos e vestes dos séculos XVIII e XIX, período áureo da produção cafeeira brasileira. Uma chegadinha mais perto é sinônimo de susto: o corpo das moçoilas e as vestimentas que as cobrem são de papel-jornal. Adornos e jóias, por sua vez, são gestados com grãos e pó de café.
Eis a essência de uma exposição, no mínimo, instigante. «As Damas do Ouro Castanho» revela o talento do artista plástico belo-horizontino Geraldo Cézanne. Os 20 belos trabalhos podem ser vistos de hoje até domingo, no foyer do Grande Teatro do Palácio das Artes. A partir de segunda-feira, até o final do ano, a mostra ganha caráter itinerante, devendo ser apreciada em nada menos que 300 endereços, entre supermercados, escolas e farmácias _ nos moldes da «Cow Parade», exposição pública de intervenções estéticas em vaquinhas, que causou frisson no primeiro semestre do ano passado. É claro, as esculturas de Cézanne não vão ficar no meio da rua, mas em lugares cobertos, de modo a preservar o perecível material.
Formado pela Escola Guignard em 2000, Geraldo Cézanne é apaixonado pelo objeto de natureza escultórica. «Sempre gostei de esculturas, principalmente as femininas», conta o artista, que explica as razões que o levaram a criar suas obras utilizando o jornal. «É um material efêmero, e minha intenção era poder perenizar este efêmero de alguma forma; nada melhor que o jornal, que a gente lê e joga fora no dia seguinte».
A mostra integra iniciativa mais ampla, o projeto «Fino Estilo da Arte», que conta, de modo didático, a história do café no Brasil, do apogeu, no século XVIII, à decadência nos anos 20 do século XX, principalmente após a traumática quebra da Bolsa de Nova Iorque, em outubro de 1929, causando perdas e danos em muitos países.
Geraldo Cézanne, cujo nome artístico homenageia o pintor impressionista europeu, salienta o caráter historiográfico de suas esculturas em tamanho natural. «Estudei bastante a história do café no Brasil, principalmente o seu reflexo no comportamento da época. E nada melhor que o vestuário para poder mostrar esta influência».
Na visão do escultor, as obras apresentadas promovem fértil diálogo entre arte e moda, a partir da reflexão de natureza comportamental. «É um trabalho que está conectado também ao estilismo, embora eu não seja estilista. Sou um escultor que adora trabalhar com materiais não muito usuais», afirma Cézanne.
Curador da exposição e idealizador do projeto, Camilo Belchior lembra que apaixonou-se à primeira vista pelo trabalho de Cézanne, antes mesmo de conhecer fisicamente a obra. «Vi uma reprodução fotográfica e amei». Em seguida, ao organizar vitrina para uma loja, resolveu encomendar três esculturas de mulheres vestindo roupas de época. O público adorou, e vi que o artista tinha possibilidades de mostrar aquele trabalho de maneira mais ampla», considera Belchior.
A hora e a vez de Cézanne, o escultor belo-horizontino apaixonado pela arte do efêmero, parecem ter chegado. «Estou feliz porque o trabalho poderá ser visto e apreciado por muita gente, muito mais do que se estivesse exposto numa galeria».
E é bom ver logo, porque a durabilidade das obras, mesmo que bem cuidadas, é de até seis meses. Mas, assim como uma notícia boa, «elas vão durar na mente e no olhar das pessoas». É o que espera o nosso Cézanne.
«As Damas do Ouro Castanho» _ Mostra de esculturas do artista plástico Geraldo Cézanne. No Foyer do Grande Teatro do Palácio das Artes (Avenida Afonso Pena, 1537. Centro), de hoje a domingoi, de 10 às 20 horas. ENTRADA FRANCA.