Dólar baixo está virando uma questão de segurança pública

Por: 18/05/2007 06:05:06 - O Globo

Fato dado


DÉBORA THOMÉ (interina)


Salvo uma grande mudança — não se sabe ainda de onde vinda —, um fato está sendo considerado dado pelos economistas: o dólar, por ora, continuará baixo. Ontem, ele até ensaiou subir, mas acabou caindo um pouquinho. Diante disso, os exportadores brasileiros terão mais essa dificuldade para enfrentar. Um estudo do Banco Mundial mostra que empresas não apenas exportam porque são produtivas, o fato de exportarem também ajuda a fazê-las mais produtivas.


O Investment Climate Assessment é um estudo do Banco Mundial que avalia as condições para o investimento privado e desenvolvimento de empresas num determinado país. Depois de pesquisar, sugerem-se mudanças nas áreas mais deficientes para, com isso, tentar aumentar a competitividade, a produtividade e, claro, o crescimento do próprio país. O trabalho não é novo, mas foi lembrado na quarta-feira, pela economista Eliana Cardoso, num seminário na FGV, como conta matéria do jornal “Valor”.


Com o real mais forte, vários economistas começam a ficar alertas para o que vai acontecer com as exportações brasileiras de produtos com maior valor agregado.


Uma grande preocupação é que a queda do dólar, que está fazendo com que muitas empresas estejam deixando de exportar, acabe tendo impacto negativo na produtividade industrial.


O estudo do Bird mostra que existe uma correlação muito forte entre empresas exportadoras e produtividade, ainda que não se saiba quem causa o quê. Empresas que começam a exportar já são, de início, mais produtivas que as suas similares e, por isso, conseguem competir no mercado internacional; porém, depois que passam a vender para o exterior, acabam tendo outros vários ganhos de produtividade. Dentre eles, passam a ter mais acesso a tecnologias mais modernas, que aumentam sua produtividade.


Grandes empresas exportadoras pagam salários maiores e investem mais em seus funcionários.


O estudo pontua que a importação de tecnologia é importante para o aumento da produtividade, sobretudo em países em desenvolvimento. Porém, também é necessário existir investimento em pesquisa e pesquisadores nesses países para que, no fim das contas, uma coisa leve a outra.


Fato é que, com o dólar baixo, os desafios para os exportadores brasileiros aumentou. E o esforço para se manter competitivo terá que ser redobrado.


— O dólar é apenas a ponta mais visível do problema — comenta Roberto Padovani, do WestLB.


Os outros problemas já conhecemos vários: alta carga tributária, legislação trabalhista ultrapassada, logística deficiente. Tudo isso terá que ser visto.


A Anfavea, por exemplo, tem trabalhado com o câmbio como um fato dado. E estão tentando resolver os outros problemas, como os de tributação. As exportações de automóveis brasileiras caíram 11% em volume e 0,5% em valor no primeiro quadrimestre. Mesmo assim, a produção está crescendo, com o mercado interno subindo 23%. O dólar mais baixo, que empurrou os juros, que aumentou o crédito, que fez com que ficasse mais fácil comprar automóvel.


Já Paulo Godoy, da Abdib, associação da indústria de base, está bastante preocupado.


Ele acha que a facilidade que existe, com o dólar baixo, de importar máquinas mais baratas, não está compensando todo o ônus.


— Temos que tomar cuidado para não destruir a capacidade de produzir equipamentos no Brasil — alerta ele.


O dólar fraco, realmente, prejudica alguns setores, mas ajuda muitos outros. Quanto ele está baixo de forma sustentável, como acontece agora segundo alguns economistas, faz com que a inflação fique controlada, a renda aumente, os juros podem ser cortados mais rapidamente e, com tudo isso, a confiança do consumidor cresce. No fim, ajuda a empurrar diversos setores da economia.


— O Brasil tem hoje taxas chinesas de crescimento de comércio. O último dado de volume de vendas mostra que elas cresceram 11,5% em relação ao mesmo mês do ano passado. No primeiro trimestre, foram 9,7%. Mesmo a produção industrial continua crescendo muito — comenta Roberto Padovani.


Um leitor mandou um email para a coluna perguntando, afinal, por que, agora, estava todo mundo preocupado com o dólar baixo, depois de tantos anos reclamando do dólar alto. Talvez o que ainda falte é encontrar um ponto ótimo.


Ou, então, tomar coragem e cuidar de deficiências bem mais complexas que o país tem no setor produtivo.


Para terminar: o dólar e a segurança País em desenvolvimento pena. O dólar desvalorizado, que deveria trazer um problema ou outro, está causando bem mais discussão na Colômbia. Mais até que aqui no Brasil. Mas isso não apenas porque o peso colombiano teve desvalorização recorde, mesmo com medidas de restrição de entrada de moeda estrangeira. O grande problema na Colômbia é que, com o dólar mais baixo, a exportação de café, que é fundamental para eles, passa a ser menos lucrativa. Com isso, parte das terras deixa de servir ao café para se destinar ao plantio de folha de coca. Fim da história: o dólar baixo no país está virando uma questão de segurança pública.
 

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