O crash da Bolsa de Nova Iorque e a queima do café

Por: Portogente























  • O crash da Bolsa de Nova Iorque e a queima do café
    Texto publicado em 04 de Novembro de 2008 –

  • por Laire José Giraud *
     
     

    Foi tudo muito rápido. Há poucos meses o mundo estava eufórico e fervillhante, consumia de tudo, quando repentinamente vieram os sinais da recessão, através de inadimplências de mutuários do sistema habitacional estadunidense, provocando, quebra de importantes instituições bancárias. 


     



    A imagem mostra corretores e investidores durante o crack


    da bolsa de Nova York, na fatídica quarta-feira que derrubou


    o mundo financeiro. As perdas chegaram a 4 bilhões de


    dólares. Reprodução.


     


    A situação afetou o mundo globalizado de muitas formas e maneiras, como a queda das bolsas das principais cidades, como exemplo o índice Nikkei, da Bolsa de Tóquio, que teve queda de 6,32%, e ficou no pior nível em pontos dos últimos 26 anos. Houve também quebras expressivas em Xangai e Jacarta. O Deutsch, o maior banco da Alemanha teve prejuízo de US$ 400 milhões, no terceiro trimestre.


     


    Aqui no Brasil, os juros de financiamento de automóveis subiram de 1,2% ao mês para 1,8%, o dólar disparou. Vários itens das exportações brasileiros foram suspensos pelos importadores no exterior. Importadores estão tendo dificuldades em nacionalizar suas mercadorias, em conseqüência da alta do dólar. Tudo isso me trouxe a lembrança o crash de 1929, que estava esquecida há um bom tempo, e causou uma recessão que perdurou por alguns anos, e teve como uma das consequências a queima de milhões de sacas de café destinadas à exportação.


     



    As safras cafeeiras eram escoadas  do interior do Estado de São


    Paulo para Santos, através de composições férreas da São Paulo


    Railway (SPR). Esse tráfego sofreu muito durante a recessão.


    Cartão-postal do inicio da década de 1920. Acervo: L. J. Giraud.


    Vamos dar um mergulho no tempo para vermos como isso aconteceu:        


    O desastre financeiro da Bolsa de Nova York, ocorrido em 29 de outubro de 1929, fez com que as perdas atingissem 4 bilhões de dólares, foram vendidos 14 milhões de títulos.


     


    A sede da Bolsa foi cenário de grande confusão e atropelos. Foi necessária a intervenção da polícia para desafogo das ruas, onde milhares de corretores tentavam se desfazer das ações. Num único dia fortunas foram perdidas, Incontáveis indústrias e estabelecimentos comerciais foram à bancarrota.


     



    No passado, existiam vários armazéns


    para estoque de sacas de café. Um


    deles é onde hoje é PoupaTempo, na


    Rua João Pessoa. Cartão-postal do


    acervo do autor.


     


    Com o “crash” da Bolsa de Nova York, as grandes potências mundiais caíram de joelhos. A Grande Depressão paralisou a economia do Ocidente.


     


    Consequentemente, essa grande onda atingiu o Brasil, onde também as perdas foram enormes, quase levando o País à falência.


     


    Por extensão, o café que antes desse acontecimento já vinha sofrendo perdas financeiras, era a grande fonte geradora monetária da Cidade de Santos, sofreu muito com depressão.


     



    As perdas do Porto de Santos e, por extensão, da Cidade, foram


    grandes durante a crise causada pela quebra da Bolsa de Nova York.


     


    A Bolsa do Café de Santos, um belíssimo prédio, onde eram feitos pregões, registrava a tragédia em cifras: em agosto de 1929, dois meses antes da implosão da bolsa nova-iorquina, a saca do café estava cotada no mercado internacional em 200 mil-réis, em janeiro de 1930 desabara para 21 mil-réis. – A praça de Santos, o maior centro brasileiro de atividades comerciais ficou virtualmente em moratória.


     


    Sem preços, o Brasil, que possuía 60% do mercado internacional do café, não podia exportar o produto, e acumulava grandes estoques (o que comprometeu os preços), nos diversos armazéns gerais da Cidade. Um deles era onde hoje fica o Poupa Tempo, na Rua João Pessoa.


     



    No período recessivo, o preço da saca de café caiu violentamente, a


    solução encontrada pelo Governo Getúlio Vargas, foi a queima de


    milhões de sacas, o que forçou a elevação dos preços. O Local onde


    estão sendo queimadas sacas do ouro verde é no bairro da Alemoa, em Santos. Cartão-postal do acervo do autor.


     


    Os reflexos apareceram em pouco tempo. Os salários perderam o poder de compra, chegou o desemprego. Com um quadro desses como a Nação iria pagar 250 milhões de libras esterlinas?


     


    A solução encontrada pelo Governo de Getulio Vargas foi a compra de 18 milhões de sacas de café estocadas em Santos e no interior. O intuito foi o de queimar grande parte delas.


     


    Essa drástica atitude revigorou os preços e normalizou a situação dos fazendeiros, comissários de café e por extensão todos os setores da economia, os empregos voltaram, e as pessoas passaram a ter algum dinheiro para comprar o que precisassem. Só que nessa nova sensação, surgiu um imprevisto: não havia o que comprar. Vale antes dizer que sem exportações e financiamento externo, o Governo emitiu muito dinheiro, o que provocou uma grande inflação.


     



    Vista da Cidade de Santos, no início da Av. Ana Costa, por volta


    de 1932. Cartão-postal do acervo do autor.


     


    Como não tínhamos o que comprar, era preciso produzir aqui o que antes se importava. O Governo desvalorizou o mil-réis tornando os artigos estrangeiros proibitivos e por necessidade a indústria brasileira foi se encorpando. Assim a maioria dos produtos que vinham de fora passou a ser fabricados no País. Isso abriu caminho até o término da recessão, em 1932


     


    Grandes nomes contribuíram para essa saída da crise financeira, como: Francisco Matarazzo, Roberto Simonsen, Horácio Laffer, Jorge Sreet, José Ermírio de Moraes (pai do atual), Carlos Von Bulow. 


     


    Vamos ser otimistas: crises não são para todo o sempre. Logo esse tsunami financeiro vai virar uma marolinha.


     



    A Cidade de São Paulo crescia muito antes da crise financeira


    mundial de 1929. Após a crise, o desenvolvimento voltou à Paulicéia.


    Na foto, a construção do Edifício Martinelli. Reprodução.

     

    * Laire José Giraud é despachante aduaneiro, colecionador de cartões-postais da Cidade e de transatlânticos antigos. Colaborador da Revista de Marinha de Portugal. Publicou cinco livros, como autor e co-autor, sobre temas da Santos antiga.

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