fonte: Cepea

Dubai: paraíso para os orgânicos brasileiros

Por: 22/10/2007 07:10:00 - Anba

Em entrevista exclusiva à ANBA, o gestor do Projeto OrganicsBrasil, Ming Liu, fala sobre o potencial do emirado árabe para as exportações de produtos orgânicos brasileiros e dos primeiros resultados do programa, criado em 2005 com o objetivo de promover os produtos livres de agrotóxicos e químicos no mercado internacional. STRONG>Geovana Pagel
geovana.pagel@anba.com.br


São Paulo – Dubai está se transformando numa Cancun dez vezes mais sofisticada, mais organizada e virando a porta de entrada para vários continentes. A afirmação é do gestor do Projeto OrganicsBrasil, Ming Liu. Em parceria com a Agência de Promoção das Exportações e Investimentos do Brasil (Apex) e o Instituto Promoção do Desenvolvimento (IPD), o projeto participa das principais feiras internacionais do setor de orgânicos e prevê faturamento de US$ 36 milhões em negócios em 2007. Destinado a agricultores, produtores e processadores de produtos orgânicos brasileiros possuidores de Certificação Internacional, o projeto conta com 42 empresas.


Em entrevista exclusiva à ANBA, Ming Liu falou sobre o potencial do emirado árabe para as exportações de produtos orgânicos brasileiros e dos primeiros resultados do projeto, que tem como objetivo promover os produtos livres de agrotóxicos e produtos químicos no mercado internacional. Liu comentou ainda as dificuldades de dimensionar um setor que não tem uma regulamentação, nem uma entidade representativa nacional.


Oficialmente o Brasil tem uma área certificada de 870 mil hectares. “Esse é um dado do Ministério da Agricultura de 2003. Informalmente sabemos pelas certificadoras que essa área já ultrapassa dois milhões de hectares”, afirma Ming Liu.


Na produção orgânica, estima-se que trabalhem 15 mil famílias. Já o número de indústrias processadoras de orgânicos fica entre 200 e 300 empresas, a grande maioria de pequeno porte. De acordo com dados da Apex, os negócios de produtos orgânicos no país devem movimentar US$ 250 milhões em 2007. Já as exportações devem ficar na casa dos US$ 120 milhões. Uma fatia ainda pequena de um mercado mundial que movimenta, anualmente, cerca de US$ 40 bilhões. Segue a entrevista:


ANBA – Como surgiu o OrganicsBrasil?


Ming Liu – O projeto foi idealizado pelo presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), Rodrigo Rocha Loures, que tinha a idéia de fazer do estado uma referência no setor de orgânicos. Orgânicos são um movimento que está crescendo muito em todos os mercados e ele pensou em gerar riquezas através da capacitação das agroindústrias do estado e fazer um programa de exportação. Assim, as indústrias ficariam interessadas e, como o Paraná tem toda base produtiva já formada, estimularia toda uma cadeia.


Nós desenhamos um projeto que era para ser chamado OrganicsParaná, porque a idéia era a seguinte: quando se falasse de produtos orgânicos no Brasil, a referência deveria ser o estado do Paraná, da mesma forma que quando se fala de café as pessoas lembram de São Paulo e Minas.


Fizemos projetos com as ações destinadas ao mercado interno, desde o nível do produtor, processador, comércio, e a ponta desse projeto era exportação. Quando nós apresentamos o projeto para a Apex, a agência gostou tanto que sugeriu que o mesmo fosse nacional, pois o setor ainda não tem uma regulamentação, não tem uma associação representativa. Eles disseram: “Façam isso em nível nacional que nós apoiaremos.” Isso no final de 2004. Em 2005 nós modificamos o projeto para que pudesse ter abrangência nacional e, em maio de 2005, foi lançado o OrganicsBrasil.


Quais foram as principais ações do programa até o momento?


No primeiro ano só fizemos ações de sensibilização dentro do estado. Como a Fiep não podia bancar ações em outros estados, fomos em busca de parceiros. Em São Paulo, por exemplo, a Fiesp e o Sebrae nos apoiaram na divulgação do projeto. Em seguida procuramos entidades nos outros estados para fazermos as mesmas ações. No Rio, falamos com a Firjan, na Amazônia com a Suframa. Também fomos para a região Norte. São cinco estados lá: Roraima, Acre, Amapá, Amazonas e Rondônia.


O objetivo do projeto agora é, em cada estado, achar uma entidade que “banque” as ações nacionais de sensibilização e capacitação. Aí as empresas daquele estado podem participar do projeto. Para participar o produtor precisa ter um produto com certificação internacional. A Apex prevê a participação em feiras internacionais.


Quais mercados internacionais já foram prospectados?


Hoje nós estamos nos três principais mercados mundiais de orgânicos: na Ásia, o Japão; na Europa, Alemanha e França, além dos Estados Unidos. O contato foi feito sempre através da participação em feiras.


De quais feiras o OrganicsBrasil já participou?


Já participamos das três principais feiras de orgânicos dos Estados Unidos: a Biofach América, em Baltimore, da Expo East, que é uma feira da Costa Oeste dos Estados Unidos, e a da feira oficial da Associação dos Orgânicos dos Estados Unidos.


Também marcamos presença na Biofach Japão e na Biofach de Nürenberg, na Alemanha, que é a mais tradicional. Isso tudo como projeto setorial. Aí temos também as feiras multissetoriais que a Apex promove. Nessas não vai somente o orgânico, mas vão carnes, laticínios, café e todos os outros projetos setoriais da agência. E aí tem a Sial, que é na França, e a Anuga, em Colônia. Essas são as duas maiores feiras de alimentos da Europa. Quem quiser participar do projeto pode ir, mas fica no estande da Apex.


Nesses dois anos, quantas novas empresas aderiram ao projeto?


O projeto começou com 12 empresas, todas do estado do Paraná. Ao final de 2006 estávamos com 27 empresas e agora nós estamos com 42. Nossa previsão é de que até 2009 a gente tenha 100 empresas no projeto.


As exportações de orgânicos brasileiros têm aumentado?


Não existe nenhuma fonte confiável de número de exportação de orgânicos. Primeiro porque não está regulamentado. Então toda exportação que sai não existe uma rastreabilidade dizendo que aquele produto é orgânico. Porque o NCM de exportação de café orgânico, por exemplo, é só café. Ele pode ser arábica, pode ser robusta.


E o sistema criado pela Secex (Secretaria de Comércio Exterior) em junho de 2006 para controle dos orgânicos exportados?


Além de ser recente, é opcional. Ou seja, a empresa pode declarar que o produto é orgânico, mas a opção não é obrigatória. Por isso não faz muita diferença. Então o que nós temos é uma estimativa em cima do que as empresas que participam do projeto informam. Ao final de cada ano elas passam uma apuração dos resultados. Mas também é uma coisa informal, porque eu não tenho como pegar o balanço da empresa e confirmar essa informação.


Qual é a estimativa atual do mercado brasileiro?


Em cima dos projetos que têm certificação nacional (são seis certificadoras) e do valor histórico dessas mercadorias certificadas, temos uma estimativa de que em exportação daria em torno de US$ 120 milhões. Agora o que o mercado todo movimenta é em torno de US$ 250 milhões. Isso tudo baseado em conversas com as certificadoras, com redes de varejo e atacado. É o único número que a gente tem sem a regulamentação. A partir do momento que a regulamentação sair, for aprovada, o próprio Ministério da Agricultura poderá normatizar todo esse processo de certificação com dados oficiais.


Como é negociar com o mercado externo apenas com base em estimativas?


O mercado externo pergunta para a gente quanto movimenta o mercado brasileiro de orgânicos. A gente fica com vergonha de falar, não sabemos, é apenas uma estimativa porque não temos regulamentação. A falta de dados oficiais é muito ruim para o país e para as empresas, porque as pessoas não ficam sabendo o dimensionamento do mercado. E pode ser até que existam empresas que estejam fazendo negócios e, com medo da concorrência, não divulgam.


Qual a situação atual do processo de regulamentação dos orgânicos?


Há dois anos estão dizendo que está para ser assinada. A posição que eu recebi recentemente do Ministério da Agricultura é que tem cinco ministérios envolvidos na aprovação dessa lei. Então eu imagino que seja: Ministério da Integração Nacional, Ministério do Desenvolvimento Agrário, Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Agricultura, e o outro não sei qual é.


O Ministério da Agricultura já deu o OK, mas são necessários os outros quatro ministérios para que a lei possa ser sancionada. Não há nenhum ponto de divergência na proposição que foi feita, tanto no 1° setor, como no 2° e no 3° setor, em qualquer player desse mercado. Só falta a boa vontade dos ministérios para analisar se está tudo de acordo com os objetivos do programa e assinar. Esse é o único entrave que há.


Hoje qual é a área usada para plantio de orgânicos no Brasil?


Oficialmente há uma área certificada de 870 mil hectares. Esse é um dado de 2003. Informalmente sabemos pelas certificadoras que essa área já ultrapassa 2 milhões de hectares. Só que como esse número não é obrigatório de ser repassado para o Ministério da Agricultura, enquanto não houver regulamentação, nenhuma certificadora é obrigada a atualizar as informações. Aí já entra toda a área de extrativismo, que antes não era considerada. Então, por exemplo, você tem hoje açaí da Amazônia certificado, ele entra na área de extrativismo que não foi considerada pelo Ministério da Agricultura.


Quantos produtores e quantas empresas processadoras?


Devemos ter cerca de 15 mil famílias produzindo orgânicos. Sobre o número de processadoras eu diria, com base nas certificações, entre 200 a 300 empresas que estão fazendo algum processo de industrialização orgânica. Dessas 200, não tem mais do que 10 indústrias de médio a grande porte. A maioria é pequena.


O OrganicsBrasil já definiu estratégias para os próximos anos? Novas feiras serão incluídas no calendário do projeto?


Sim, nos já tivemos várias consultas para participar da feira de orgânicos do Reino Unido, da feira de Dubai e de férias na Itália. Tudo depende da demanda das empresas. Dubai é um mercado que está crescendo muito, principalmente com o desenvolvimento daquela região. Dubai está sendo transformada numa Cancun, dez vezes mais sofisticada, mais organizada, e virando a porta de entrada para vários continentes.


A Apex tem ações muito bem definidas lá. Já tem centro de distribuição, que é mais ou menos um armazém alfandegado. Vários projetos setoriais da Apex já foram realizados em Dubai. Existe uma comunidade muito grande de estrangeiros por lá. Europeus comprando propriedades, um mercado muito forte, mas nós ainda não conhecemos.


No ano passado, infelizmente, não conseguimos participar dessa feira de orgânicos em função da agenda, porque ela ocorre em dezembro, bem perto do Natal, e o calendário de feiras dos orgânicos normalmente vai de março a outubro. É um pouco complicado por ser dezembro, mas nós já tivemos duas empresas que perguntaram sobre a feira de Dubai. Acho que o ideal é, primeiramente, ir lá fazer um reconhecimento como eu fiz na Biofach China, que teve sua primeira edição em maio desse ano, em Xangai.


Agora em 2007 eu devo participar da Feira do Reino Unido. A Europa movimenta hoje US$ 17 bilhões no mercado de orgânicos. O Reino Unido gira em torno de US$ 4 bilhões. Depois da Alemanha é o segundo maior mercado, e 30 % do que eles compram são produtos importados. Então é uma fatia importante que a gente poderia explorar.


Do mercado de Dubai eu não tenho números sobre o consumo de orgânicos. A minha percepção é que o consumidor que compraria os produtos em Dubai seria formado mais por estrangeiros e uma fatia da sociedade local. É um mercado que a gente tem muito interesse em conhecer. A Apex já falou para ir visitar essa feira. Eu só preciso achar uma agenda e a porta de entrada seria essa feira de produtos naturais e orgânicos que ocorre em dezembro.


Desde que o projeto foi criado há como saber qual foi o aumento das exportações das empresas participantes?


Eu tenho acompanhado que algumas empresas que começaram o projeto em 2005 não exportavam nada e foram naquela onda de vontade de exportar e conseguiram. Um exemplo bem prático é de uma empresa do Paraná chamada Chá Matte Triunfo, que fornecia folha de chá mate para empresas tipo Mate Leão e hoje já exporta em torno US$ 300 mil de folha de mate. Pode ser um número pequeno, mas representativo para ela.


Tem inclusive clientes nos Estados Unidos que começaram a criar um produto à base de mate. Bebidas gasosas à base de chá mate, e até produtos cosméticos com essência da folha do mate. E o chá mate é um produto tipicamente regional, que não imaginávamos que pudesse fazer tanto sucesso no exterior. Só Uruguai, Argentina, Rio Grande do Sul e Paraná produzem chá mate.


Qual a importância da Biofach América Latina para o projeto?


Uma das ações que a Apex promove dentro do patrocínio é o Projeto Comprador, com rodadas de negócios entre os produtores brasileiros e compradores do mercado externo. Nós podíamos fazer somente para as empresas que fazem parte do projeto, mas nós decidimos abrir também para as demais empresas, sem nenhum custo, porque quem ganha por ter os importadores estrangeiros aqui é o setor.


Essa ação já ocorreu na Biofach América Latina 2006 e se repetiu neste ano, porque a feira é o único evento que agrega o maior número de empresas produtoras de orgânicos no Brasil. Na edição desse ano (realizada de 16 a 18 de outubro) participam das negociações seis empresas internacionais, dos Estados Unidos e países da Europa. (Whole Foods, Clarkson Grain, Sun Opta, Pacif Organics, BrandStorn Inc e Cascadian Farm).


Se tivéssemos que fazer um evento separado, teríamos que fazer no Paraná ou em São Paulo, e mesmo assim não teríamos essa diversidade de estados como Amazonas, Pará, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pernambuco, participando. A Biofach reúne a nata da produção nacional de orgânicos e é nela que a gente começa a propagar essa possibilidade de gerar negócios. O potencial estimado para a feira desse ano é de US$ 5 milhões.
 
 

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