Virar a Mesa da Política Cafeeira Por Celso Vegro

2 de janeiro de 2014 | Sem comentários Especiais Mais Café

O ciclo econômico, característico do processo coetâneo de acumulação capitalista, revela no mercado das commodities sua expressão mais patente. Em meados de 2011, as cotações do café arábica estiveram no máximo histórico dos últimos 30 anos, abaixo apenas do colapso do suprimento global causado pela grande geada de 1975 no Centro Sul do Brasil. Desde então, as cotações do produto na Bolsa de Nova York assumiram trajetória de baixa, alcançando em setembro de 2013 posições abaixo dos US$¢100/lbp. No último trimestre de 2013 observou-se ligeira recuperação nas cotações que, se ainda são insuficientes para fazer frente aos custos de produção, confirmam a tese do ciclo econômico.

Reconhecida a existência do ciclo e diante da moderna economia política, compete ao Estado, por meio de ações públicas de intervenção nesse mercado, oferecer meios para que o agronegócio mantenha-se viável, quer pela dinâmica econômica e/ou pela sócio-ambiental. Nesse particular não se pode afirmar que o governo abandonou a cafeicultura brasileira, pois como bem relacionou KAWASAKI (2013)1, foram injetados em políticas para o produto R$5,8bilhões em:

a) R$3,16 bilhões em financiamentos;
b) R$1,05 bilhão em opções públicas a preços de exercício de R$343,00/sc;
c) R$1,0 bilhão em financiamento em estocagem aos exportadores e torrefadoras/solubilizadoras; e
d) R$614 milhões em capital de giro as torrefadoras/solubilizadoras e cooperativas.

Também, ocorreram: a) majoração do preço mínimo de garantia para o produto que foi reajustado para R$317,00/sc, algo bastante justo na medida que os recursos públicos devem apenas suportar os custos operacionais efetivos e não os totais (nesse último juntam-se aos efetivos os custos com depreciação, juros ao capital, seguros e impostos) e b) prorrogação por até cinco anos das dívidas vincendas exigindo-se quitação de 20% do saldo devedor. Em que pesem as dificuldades operacionais/burocráticas em liberar os recursos aos distintos segmentos que compõem essa cadeia, não se pode questionar que houve ações públicas objetivando atuar contraciclicamente em defesa da economia cafeeira.

Dentre as políticas implementadas, as opções públicas foram as que mais suscitaram debates2. A CONAB, enquanto lançador exclusivo das opções obteve prêmios muito abaixo daqueles que seriam exigidos pelo mercado, ocasionando a produção de subvenção não explícita. Com a recente ascensão das cotações, caso tal evolução positiva persista no mercado, poderá surpreendentemente não ocorrer o exercício dos contratos adquiridos3.

Organizado pela OCB e CNC, com participação do diretor executivo da OIC, ocorreu entre 18 e 19/12/2013 encontro de lideranças do agronegócio café para traçar diretrizes de política de longo prazo para o segmento4. Três grupos de trabalho (oficinas) delinearam estratégias para os seguintes temas: a) garantia de renda e escoamento da oferta; b) estratégias para ampliação do market share do Brasil; c) cafeicultura e cooperativismo.

Diante de tantas iniciativas oficiais e paraoficiais e a mesmice em torno das quais transitam (defesa do subsegmento arábica), competiria questionar, audaciosamente, se já não passou o momento de buscar inovações nesse escopo de ações, visando criar dinâmica nova nesse mercado já saturado por medidas esgotadas em sua capacidade de sustentar a atividade.

O Governo Federal, através do MAPA, pretende continuar o emprego do mercado de opções públicas para ordenar a oferta do produto. Comentou-se que há a intenção de lançar contratos para a aquisição de até 5,0 milhões de sacas em 2014. Talvez, os gestores das políticas públicas necessitem deslocar seu olhar para repensar as iniciativas com intuito de buscar o novo e desse modo virar a mesa.

O que impede dos futuros contratos de opções fossem destinados à aquisição de conilon? Nada, excetuando-se a pressão lobista conduzida pelo subsegmento de cafeicultores e suas cooperativas centradas no arábica. Podem-se listar algumas as razões que recomendariam essa iniciativa:

a) por se tratar de produto mais barato comparativamente ao arábica padrão nos contratos de opções, a iniciativa tanto pode incrementar o volume adquirido quanto manter a mesma quantidade estabelecida com expressiva redução do ônus financeiro suportado pelo tesouro;

b) ao adquirir conilon o governo estaria atuando fortemente sobre a formação de preços no mercado interno, interferindo relativamente pouco nas exportações. Portanto, a política interna não abriria guarda-chuva para os países concorrentes;

c) a comercialização do conilon ainda não avançou para o estágio financeiro de efetivação das trocas mercantis (em que operam os contratos). Prevalece, atualmente, a dependência do capital comercial que pela sua natureza precisa comprar barato para vender caro, estabelecendo assim rol de critérios arbitrários direcionados ao incremento de defeitos inexistentes no produto;

d) retirar conilon do mercado provaria efeito cascata, valorizando todos os demais tipos de arábica a começar pelos mais baixos;

e) a derrocada das cotações não foram inteiramente transmitidas ao varejo, ou seja, os consumidores continuam pagando pelo café torrado e moído valores similares aos praticados quando da escalada dos preços e reajustes forçados pela indústria. Em abril a torrefação precisava de 97 pacotes de 500g de T&M para adquirir uma saca de verde, desde então tem havido queda nessa paridade encerrando Nov.13 com apenas 35pct para aquisição do mesmo produto. A indústria tem portanto gordura para queimar (Figura 1);

f) o lançamento de opções para conilon seria acompanhado de calendário de vendas concedendo preferência para aquisições dos estoques por parte dos solubilizadores, pois em se adotando essa estratégia esses agentes da cadeia poderiam ser ligeiramente prejudicados; e

g) estabelecimento de protocolo de regulamentos para viabilizar as operações em draw-back, objetivando atração de novas plantas e fazer deslanchar a agregação de valor nas exportações.

Trocar o arábica pelo conilon no lançamento das opções somente oferece vantagens ao gestor público. Ao não interferir no fluxo de comercialização permitirá os exportadores e as cooperativas recuperarem market share, reforçando a balança comercial do país pelo efeito de incremento da quantidade e dos preços. Ademais, a avidez que existe pelo produto no mercado interno haveria grande disputa pelos lotes oferecidos a venda, provavelmente, elevando seus preços e permitindo recuperação vantajosa dos recursos do tesouro imobilizados.

FIGURA 1 – Paridade de Preços Entre T&M e Verde, São Paulo, jan.2011-nov.2013
Fonte: Elaborada a partir de dados básicos de www.iea.sp.gov.br

 

1 Detalhes em: http://www.redepeabirus.com.br/redes/form/post?topico_id=49824
2 Artigos na íntegra disponíveis em:
http://www.iea.sp.gov.br/out/LerTexto.php?codTexto=12769
http://www.cafepoint.com.br/mercado/relatorios-mensais/desenho-miope-1-85566n.aspx
3 O exercício requer o preparo do café a ser entregue, custo com o qual arca o cafeicultor, estimado entre R$40,00/sc e R$50,00/sc, o que reduziria o preço recebido para o intervalo entre R$293,00/sc e R$303,00/sc, cotações muito aderentes as praticadas pelo mercado para bebida dura em dezembro de 2013. A esses preços líquidos, arrefece o interesse dos cafeicultores em praticar o exercício dos contratos. Tais valores não consideram o ônus financeiro com frete até o armazém credenciado mais próximo, portanto se trata de cálculo bastante otimista.
4 Detalhes em: http://www.cafepoint.com.br/parceiros/cnc-noticias/cnc-balanco-semanal-16-a-20122013-86924n.aspx

Celso Luis Rodrigues Vegro
Eng.Agr., M.S. Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade
Pesquisador Científico VI
Instituto de Economia Agrícola
celvegro@iea.sp.gov.br

 

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