05/06/2013
O Necaf, como é conhecido o Núcleo, mobiliza pesquisadores, estudantes, extensionistas e infraestrutura para solucionar problemas da cafeicultura
A Universidade Federal de Lavras – Ufla, instituição participante doConsórcio Pesquisa Café, coordenado pela Embrapa Café, criou o Núcleo de Estudos em Cafeicultura – Necaf em 1995, por meio de convênio com o Conselho Nacional do Café – CNC. O Núcleo gera e adapta tecnologia cafeeira, promove atividades de ensino e extensão, bem como prestação de consultoria e atividades afins. Para isso, conta com a participação de professores, pesquisadores, alunos de pós-graduação e de graduação. O Necaf realiza pesquisas de genética, melhoramento e biotecnologia, solos e nutrição mineral, manejo da lavoura, manejo integrado de doenças e pragas e controle de nematoides, cafeicultura irrigada e difusão de tecnologia. Além desses trabalhos, o Necaf promove e participa de congressos e simpósios, como a Expocafé em Três Pontas, e realiza o Ciclo de Palestras em Cafeicultura e o Encontro Sul Mineiro de Cafeicultores na Ufla.
Para sabermos mais da missão e das principais atividades desenvolvidas pelo Necaf, a Embrapa Café entrevistou Antônio Nazareno Guimarães Mendes, ex-reitor da Ufla e fundador do Núcleo. Nazareno é graduado em Agronomia pela Ufla, possui mestrado em Genética e Melhoramento de Plantas pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo – USP, e doutorado em Agronomia por Lavras, onde atualmente é professor do Departamento de Agricultura.
Embrapa Café: Como é a atuação do Necaf e como foi seu processo de criação?
Antônio Nazareno: O Necaf foi criado com o objetivo de reunir professores, pesquisadores e estudantes de graduação e de pós-graduação da Ufla que desenvolvem atividades de pesquisa e de extensão em cafeicultura. Com a criação do Necaf, houve maior integração entre as pessoas que trabalhavam com café. Setores e departamentos se uniram e passaram a compartilhar experiências, laboratórios e equipamentos, enfim toda a infraestrutura disponível. Passamos a exercitar trabalho multidisciplinar, com ênfase na busca de soluções para os gargalos tecnológicos diagnosticados com os cafeicultores. Os estudantes, grandes beneficiados a partir da criação do Núcleo, passaram a atuar de forma integrada, conduzindo sinergicamente experimentos em laboratórios e campos experimentais. Hoje cerca de uma centena de estudantes atuam no Necaf, orientados por professores e pesquisadores de treze departamentos didático-científicos da Ufla. Pesquisadores da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais – Epamig e extensionistas da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais – Emater-MG também são parceiros dos trabalhos.
EC: De que forma a criação do Necaf fortalece o elo entre a Universidade e o produtor? Como é realizado o trabalho do Núcleo?
NA: Desde a sua criação, o Necaf procurou trabalhar com o produtor, ora na identificação dos principais problemas enfrentados por ele, ora na transferência de conhecimentos, tecnologias e inovações geradas pela Ufla e por outras instituições de ensino e pesquisa do País. Nos primeiros anos, contou-se com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, por meio do programa BIOEx-Café, que identificou os principais gargalos tecnológicos da cafeicultura brasileira e apoiou a realização de experimentos para solução dos problemas. Um bom exemplo é a mecanização da colheita de café, particularmente em áreas com maior declividade. Desde 1996, a partir dos trabalhos financiados pelo BIOEx, foram registrados muitos avanços na mecanização das operações de pré-colheita, colheita e pós-colheita de café. A Expocafé, hoje maior evento de transferência de tecnologia em cafeicultura do País, foi iniciada em 1997 a partir de um projeto financiado pelo BIOEx-CNPq. Outro exemplo de evento do qual o Núcleo participa é o Encontro Sul Mineiro de Cafeicultura, organizado pela Ufla, Emater-MG e Epamig, que reúne anualmente mais de 500 cafeicultores e técnicos em Lavras. O Necaf se envolve em todas as etapas de sua organização e realização. Em 2013, foi realizada a 15ª edição do Encontro, no Dia Nacional do Café, 24 de maio, no campus da Ufla.
EC: Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento – Conab, o Estado de Minas Gerais produz mais de 50% do café brasileiro, dos quais mais de 90% são café arábica. As tecnologias voltadas para o arábica contribuem também para o desenvolvimento do café robusta no País? Há projetos de pesquisa em Minas Gerais voltados especificamente para o robusta?
NA: Na maioria dos casos, não. À exceção de algumas tecnologias desenvolvidas para o controle de pragas e de doenças do cafeeiro (comuns às duas espécies de café), ou mesmo noções básicas de nutrição mineral ou de fisiologia do cafeeiro e ainda outras práticas de manejo da lavoura, as duas espécies são muito contrastantes e exigem, de forma particularizada, que os trabalhos de pesquisa sejam conduzidos distintamente. A quase totalidade dos projetos executados em Minas Gerais se relaciona à espécieCoffea arabica. Somente alguns trabalhos utilizam a espécie Coffea canephora como porta-enxerto de cultivares de café arábica (em áreas infestadas com nematoides) e outros são conduzidos com o objetivo de avaliar o desenvolvimento do café robusta em regiões de menor altitude, presumidamente aptas ao seu cultivo, como é o caso das regiões leste e alto do Rio Doce de Minas Gerais.
EC: De que forma o Consórcio Pesquisa Café, em parceria com a Ufla, Emater e Epamig, contribui para o desenvolvimento de tecnologia cafeeira no Brasil, particularmente em Minas Gerais? Que parcerias existem entre o Necaf e o Consórcio e suas instituições consorciadas?
NA: O Consórcio tem apoiado grande número de ações de pesquisa e de transferência de tecnologia em cafeicultura em todas as regiões produtoras de café arábica e robusta do País. Instituições como a Epamig, Ufla, Universidade Federal de Viçosa – UFV e Emater-MG têm atuado em parceria por meio do Consórcio em dezenas de projetos. O Necaf, especificamente, participa diretamente de grande número de projetos, em especial os executados nas regiões Sul e Oeste de Minas Gerais, em áreas experimentais da Ufla e da Epamig. Áreas como manejo da lavoura, nutrição, doenças, pragas, melhoramento genético, cafeicultura irrigada, qualidade e comercialização são contempladas com projetos de pesquisa e atuação de estudantes no Necaf. O Núcleo também trabalha em atividades de extensão realizadas anualmente, como o Encontro Sul Mineiro de Cafeicultores, já citado, e o Ciclo de Palestras de Cafeicultura. Nossas instituições consorciadas estão muito otimistas com as perspectivas do Consórcio, em especial após o realinhamento recentemente realizado no “Workshop Fortalecendo a Rede com Novos Projetos do Consórcio Pesquisa Café”, realizado no mês de dezembro de 2012, em Campinas (SP), na sede do Instituto Agronômico (IAC). Como decorrência, foram apresentados vários projetos na Chamada (edital 02/2013).
EC: Quais foram as principais dificuldades enfrentadas por professores, pesquisadores e estudantes ao longo da existência do Necaf? Como essas dificuldades têm sido enfrentadas? De que forma o Consórcio Pesquisa Café poderia colaborar nesse processo?
NA: Foram muitos problemas, mas o que mais tem prejudicado o andamento dos trabalhos é a irregularidade na liberação de recursos para os projetos. Quando os recursos eram gerenciados pelas fundações de apoio, como é o caso dos projetos aprovados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do estado de Minas Gerais – Fapemig, tornava-se possível trabalhar com melhor planejamento das atividades. Nos últimos anos, instituições como Ufla, UFV e IAC, por exemplo, foram muito prejudicadas pelos repasses no final de cada ano, sem condições de realizar uma boa aplicação do recurso. A melhor contribuição que o Consórcio pode dar nesse sentido é tentar encontrar forma viável de gestão dos recursos, se possível retornando as liberações via fundações de apoio, para que os pesquisadores envolvidos tenham tempo hábil para a realização das atividades previstas em pelo menos um ou dois anos.
EC: Das tecnologias desenvolvidas pelas instituições participantes do Consórcio Pesquisa Café que foram incorporadas pelo setor produtivo, poderia apontar quais delas considera especialmente positivas para o setor produtivo? Que demandas de pesquisa há hoje que precisariam ser mais rapidamente atendidas? Qual o papel do Consórcio Pesquisa Café nesse processo?
NA: Foram muitas, em praticamente todas as áreas do conhecimento. As instituições que compõem o Consórcio contribuíram significativamente para os avanços da cafeicultura brasileira nas últimas décadas, particularmente com tecnologias que possibilitaram o aumento da produtividade e a melhoria de qualidade dos cafés do Brasil. Muitas áreas poderiam ser citadas, como o melhoramento genético, que disponibilizou várias cultivares resistentes à ferrugem; manejo da adubação e da irrigação das lavouras e a mecanização de várias etapas, desde a pré-colheita até a pós-colheita. As demandas atuais são muitas e estão contempladas na Chamada de Projetos (02/2013) e contratação de novas propostas. Destacam-se entre as maiores demandas a busca de soluções para os problemas decorrentes dos baixos preços do café arábica, que praticamente inviabilizam a cafeicultura em áreas montanhosas com mão-de-obra escassa e de alto custo.
Avanços da cafeicultura no Brasil – Segundo o Informe Estatístico do Café – Dcaf/Mapa – a produção e a produtividade do café, em 1997, quando da criação do Consórcio Pesquisa Café, era de 2,4 milhões de hectares de área cultivada, com produção de 18,9 milhões de sacas de 60kg e produtividade de 8,0 sacas/hectare. Passados 16 anos, em 2013, de acordo com o segundo levantamento de safra da Companhia Nacional de Abastecimento – Conab (maio/2013), com praticamente a mesma área cultivada – 2,3 milhões de hectares – o País deverá produzir 48, 5 milhões de sacas, com uma produtividade de 23,8 sacas/ha.
Consórcio Pesquisa Café – Congrega instituições de pesquisa, ensino e extensão localizadas nas principais regiões produtoras do País. Seu modelo de gestão incentiva a interação das instituições e a otimização de recursos humanos, físicos, financeiros e materiais. Foi criado por dez instituições: Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola – EBDA, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa, Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais – Epamig, Instituto Agronômico – IAC, Instituto Agronômico do Paraná – Iapar, Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural – Incaper, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – Mapa, Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio de Janeiro – Pesagro-Rio, Universidade Federal de Lavras – Ufla e Universidade Federal de Viçosa – UFV.